Capítulo 4

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Gael


Numa tarde nublada, duas semanas após o incidente da lotérica, passei na locadora e aluguei dois filmes, um de drama; o outro, terror. Antes de assistir ao primeiro, tomei banho, almocei e ingeri meus compridos. Eu havia trocado um dos medicamentos, que embora fosse eficaz em relação aos tiques, costumava me deixar com fortes dores de cabeça.

Por ter ouvido críticas boas em relação ao filme de terror, priorizei-o. Mas logo constatei o quão bagunçado ele era. Envolvia palhaços, fantasmas e zumbis. Não que eu seja expert no assunto, mas até hoje me pergunto onde está o terror daquela obra, a não ser que levem em consideração os desastrosos "efeitos especiais".

Após ter me arrumado para o trabalho, por volta de cinco e meia da tarde, fui ao quintal verificar se Godofredo estava no estábulo. Então, no momento em que abri a porta da cozinha, ele pôs a cabeça branca para fora da janela, e eu juro que o vi sorrir. É engraçado como essas situações só acontecem quando não há alguém de testemunha para confirmar a história. Não é raro que os tutores de animais contem situações inusitadas para algumas pessoas, e acabem taxados como "mentirosos".

Ao me aproximar de Godofredo, abaixei-me e toquei-o na cabeça:

— Perdão, rapazinho. Hoje não vai dar de passear contigo porque tenho que chegar mais cedo no trabalho.

Observando-me, ele virou de lado e esfregou o pescoço no meu braço.

Assim que me ergui, Godofredo começou a pular. Animado, ele rodopiou pelos arredores. Sem dúvidas, achava que iria passear e comer pipoca, mas parou de circular quando me viu trocando sua água.

No momento em que virei as costas, ele berrou. E minha resposta foi:

— É, sei que vou ficar te devendo essa!

Antes de fechar a porta da cozinha, ouvi outro berro.

— Não! — voltei a falar. — Hoje não é dia de pipoca. E... eu sei, também vou sentir saudade.

Depois disso, lavei as mãos na pia do banheiro, tranquei as portas, pus a mochila nas costas, peguei a bicicleta e segui meu caminho. Ao passar pela praça do bairro, que ficava a alguns metros de casa; o pipoqueiro Rubens, do outro lado da rua, gritou:

— Cadê o Godofredo, Gael do bode?

Sem parar de pedalar, acenei para ele com uma das mãos, respondendo na mesma altura:

— Hoje não deu de passear com ele!

Ainda que tenha me preparado cedo, cheguei no trabalho às seis e quinze, dez minutos a mais do que deveria. Por sorte, o chefe ainda não havia chegado, mas isso não impediria ninguém de comentar sobre o assunto.

Quando me aproximei das mesas da entrada, Pedro, um garçom novato, passou por perto de mim e disse:

— Gael, desse jeito não dá. Eu tento te ajudar, mas...

— Ah! Vai catar coquinho, vai — respondi sorrindo.

Apesar do tom sério, eu sabia que ele estava brincando. Pedro trabalhava ali há algumas semanas, mas já conhecia a realidade do local. Os clientes só chegavam a partir das seis e meia.

Como de costume, segui para a sala de recepção e perguntei para a Renata se já havia alguma entrega agendada. No momento em que adentrei na sala, ela se afastou do computador, girou na cadeira e balançou a cabeça de forma negativa.

Segundos depois, pela janela de vidro que separava os ambientes, vi o patrão chegando. Quase no mesmo instante, uma funcionária foi até ele e entregou-lhe um papel enquanto conversavam. Olhando para a mesma cena que eu, Renata girou novamente e disse:

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