Capítulo 23

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Estela

Dias antes de viajar, saí em busca de um presente para a minha mãe e, como de costume, o meu dilema anual se repetiu. Nunca sabia ao certo como presenteá-la; não por ela ser exigente, mas por viver me dizendo que gasto dinheiro à toa. Naquele ano, adquiri uma cafeteira elétrica, que, segundo o funcionário da loja, era a última do estoque. Talvez fosse mentira dele, pois a forma calorosa como fui recebida me fez suspeitar que estivesse desesperado para bater alguma meta.

De qualquer modo, em comparação aos anos anteriores, aquele poderia ser o presente perfeito, já que a Dona Esmeralda sempre foi viciada em café.

No sábado, trabalhei o dia inteiro. E mesmo exausta, não conseguia parar de pensar que na manhã seguinte estaria ao lado da pessoa que mais admiro no mundo, aquela para quem conto tudo o que acontece à minha volta. Bem... quase tudo, pois, na época, ocultei a informação de que o Leonardo estava morando comigo; mas só fiz isso porque não queria preocupá-la.

Por se tratar de uma viagem rápida, arrumei a bagagem horas antes de sairmos. Afinal, não iria levar muita coisa. Só que em relação ao Leonardo, a história foi diferente. Um dia antes, eu o apressei para deixar tudo nos conformes.

Como havíamos combinado, antes de seguirmos para a capital, pegamos a gaiola com os porquinhos na intenção de deixá-los sob os cuidados do Gael. Porém, assim que o meu irmão subiu na garupa da moto, dois cachorros apareceram e resolveram correr atrás de nós. Daquela vez, o chihuahua não estava envolvido.

— Acelera, Estela, acelera, acelera! — gritava o meu irmão. — Não muito por causa da gaiola, mas pode ir mais rápido.

Nervosa com a situação, acelerei a tal ponto que quase perdi o controle do veículo ao tentar desviar de um buraco. Mas, felizmente, nada de grave aconteceu.

Quando percebi que os cães tinham ficado para trás, olhei pelo retrovisor e perguntei ao Leonardo:

— Tá tudo bem por aí?

— Tirando a parte em que eu quase voei; tá, sim...

Assim que estacionei a moto em frente à casa do Gael, notei que a porta estava aberta. Ao me aproximar dela, eu o chamei por algumas vezes, bati palma, e ele não apareceu.

— Ôh, professor! A gente já tá aqui! — gritou Leonardo, invadindo a residência.

— O que pensa que tá fazendo, Léo? — retruquei. — Que modos são esses? Volta já pra cá. Isso é falta de educação... Anda logo, menino. Ninguém te convidou pra entrar!

Na medida em que falava, caminhei para a frente e, quando dei por mim, também já havia adentrado.

O meu irmão colocou a gaiola numa mesa de plástico e continuou chamando pelo Gael. Quanto a mim, dei alguns passos na sala, olhei ao redor e, em questão de segundos, vi-me encantada com a organização daquele local. As paredes amarelas combinavam com a simplicidade daquele espaço. Eu estava ao lado de um tapete verde. No canto, havia outra mesa onde ficava a tv e, acima dela, pude observar algumas prateleiras com diversos bonecos de super-heróis; posicionados de uma forma como se interagissem.

Parada, sugeri ao Leonardo que voltássemos depois, já que o dono da casa parecia ausente. No entanto, ao virar o rosto para a porta da rua, deparei-me com o Gael. Suado, ele segurava uma cabra pela coleira. Em decorrência disso, fiquei sem reação para dizer ao menos "boa noite".

— Vocês chegaram bem no horário, mesmo. Desculpa não tá aqui, é que eu saí meio desesperado porque alguém resolveu ganhar o mundo sem minha permissão.

Ele falava da cabra como se ela fosse uma criança.

— Então essa cabra é tua? — questionei, confusa.

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