Eu estava num filme de terror

408 64 92
                                    

(Narrado por WonWoo)

Encarei a porta novamente, fazia alguns minutos desde que Hoshi havia passado por ela. Minha respiração ainda não havia se acalmado, pelo contrário, passara a ficar mais tensa por estar sozinho com DongYul novamente. Eu estava sozinho, sozinho com ele.

O som das maquinas começava a se alterar novamente, mas eu não conseguia me manter calmo. Estava sozinho.

Eu já sabia que estava morto por dentro havia muito tempo, já sabia que era podre por dentro, que havia deixado de viver verdadeiramente há muito. Não sabia mais como era a sensação de estar vivo e apenas estava ali porque antes aquela voz, aquela maldita voz, não deixava eu me matar. Mas agora ela já não dizia mais nada, ela havia se calado, havia morrido no primeiro momento em que coloquei os olhos em DongYul. Dando espaço para que as outras aparecessem, para que voltassem para acabar comigo de vez. Mas na verdade nem eram elas que me incomodavam, às vezes mal as escutava.

Volta e meia, por ser impossível conter, eu olhava em sua direção. Uma forma de me acalmar e de me torturar, de confirmar que não estava acordado, mas que estava ali e que não era uma alucinação também.

As memórias nunca haviam me afetado tanto, machucado tanto.

Aquele rosto de pele alva e pura, aqueles cabelos macios e coloridos de forma magnífica. Aqueles piercings nos lugares de sempre. Aquela maldade inimaginável por trás de aparência tão linda e perfeita. Aquele conjunto geralmente me trazia paz e sensação de borboletas no estomago, mas percebia que por varias vezes acabava tremendo o encarando com dor magnifica nas expressões.

Ver ele não me fazia bem, lembrar daquilo não me fazia bem. Chorava muito quando os médicos davam indícios que não voltariam para checar nenhum de nós dois por algum tempo. Não conseguia suportar aquilo, era horrível saber que ele poderia acordar, que poderia olhar para mim e decidir fazer alguma coisa.

Nada seria pior do que o que ele já fez

Ainda lembrava-me dos meus próprios gritos de dor naquele lugar que aparentemente era abandonado, lembrava-me da sensação de suas mãos em meu corpo e sentia calafrios com a impressão delas ali novamente quando acordava sobressaltado de algum pesadelo. Sentia-me enjoado ao lembrar-me das coisas que ele dissera naquele dia, naquele lugar.

Tinha vontade de vomitar, sentia o corpo sujo. Já não conseguia mais comer a comida do hospital, a que antes mal comia também. Se alguém me visitava eu mal percebia e continuava a observa-lo ali, adormecido lindamente. Sentia os olhos pesarem algumas vezes por não dormir, mas ainda continuava a encara-lo quase sem piscar. Já havia desmaiado de sono algumas vezes por não querer dormir, apenas por medo.

MinGyu viera uma vez além daquela em que acordei, mas eu mal desviei o olhar do garoto. Eu estava mal, e daquela vez eu mesmo percebia muito bem. Era difícil não perceber com a visão turva, as tonteiras, a fraqueza, tudo. Eu apenas esperava minha morte enquanto o olhava e me agoniava pensando em quando ele acordaria.

“Quando será que ele vai acordar?”

“O que será que planeja contigo?”

Estremeci encolhendo o corpo e abraçando as pernas as pressionando contra o corpo, aquilo doía, doía fisicamente, doía internamente. Senti as lágrimas surgirem e escorrerem por meu rosto como cascata à medida que mal piscava encarando o nada. Estava com medo de tudo que podia acontecer, e aquelas vozes não ajudavam em nada. Os sons dos equipamentos ligados a mim voltaram a ficar estridentes devido ao meu desespero.

Por que eu não podia simplesmente morrer?

Não consegui a fechar os olhos, mal conseguia piscar, aquele sorriso que ele dera ao acordar mais cedo impedia violentamente que eu o fizesse. O olhar macabro predominava meus pensamentos fazendo o choro se intensificar inconscientemente. Eu estava com medo, apenas queria outro abraço de Hoshi, ou de alguém que me passasse sensação de conforto de verdade.

Olhei em sua direção mais uma vez, o pescoço doendo em sinal do cansaço da repetição do ato. Por fração de segundo pude ver seus olhos abertos em fendas e me assustei encolhendo mais ainda contra o próprio corpo, se é que era possível. Pisquei, mas ele estava adormecido, era minha mente trabalhando de mais pelo sono, talvez. Eu temia que aquele momento se repetisse que ele acordasse de vez e me reconhecesse. Temia num ponto que desejar a morte era muito pouco em comparação.

Daquela vez, a minha ruina era certa, não havia como e nem para onde fugir, não tinha como pedir ajuda a ninguém. Sequer sabia porque ele estava ali naquele hospital, o que havia acontecido para que estivesse naquela cidade. Naquele hospital em especifico.

Achava que era impossível tremer mais do que já tremia, e o frio era um dos últimos motivos. Fazia dias que estava daquela forma, incapaz de fazer qualquer coisa que não temer o garoto da maca ao lado. Já havia dias desde que tinha olhado para seu rosto pela primeira vez em muito tempo, e o passado havia sorrido macabramente para mim.

As lembranças me incomodavam. Faziam-me sentir como se estivesse em um filme de terror, um interminável filme de terror. Lembranças daquele rosto sereno e lindo, daquela voz que me causava arrepios, daquele sorriso tão característico e maravilhoso. Mas o cabelo estava desbotado, lembrava-me dele num azul real magnifico e vibrante. No momento ele se encontrava num azul claro transcendente a um turquesa.

Minha visão embaçara e a cabeça rodopiou, senti-me mais fraco por um momento. Quase fechei os olhos devido à tonteira momentânea, mas não podia fazê-lo por não estar sozinho ali. Mas logo percebi ser o aparelho respiratório que fora descuidadamente retirado da tomada, cerrei os olhos olhando em volta. Até que percebi a maca de DongYul vazia. Meu corpo gelou e minha respiração já fraca pareceu falhar ainda mais. Ouvi quando a tomada foi colocada de volta e olhei naquela mesma direção paralisando completamente ao vê-lo sorrindo para mim.

_Oi Wonnie, tudo na paz? – perguntou numa simplicidade esplêndida e com um tom brincalhão e descontraído, como se estivesse ali apenas para rir.

O garoto estranho que usava pretoOnde histórias criam vida. Descubra agora