Eu me afastei

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Peguei-me encarando o nada com a expressão vazia novamente. WonWoo havia contado tudo, sem exceção de nada que havia dito a seu irmão sobre DongYul e até dizendo mais coisas a nós do que havia dito a ele. Alguns detalhes ficaram gravados em minha mente com mais intensidade que outros. Rodando em minha mente como um disco, repetindo infinitamente. Permanecia com a mão no queixo, tampando parcialmente minha boca enquanto pensava a beira da janela de meu quarto, contemplando o horizonte em meio a pensamentos desolados.

Meu coração doía, cada um dos pedaços dele doíam em pensar em tudo aquilo. Em tudo o que WonWoo havia passado, sozinho, sem apoio de ninguém. Por ter escolhido não contar a ninguém. Doía esplendorosamente.

E havia culpa, culpa era um dos motivos da dor. Culpa por ter ouvido tudo antes dele mesmo contar. Sentia que não havia feito o certo, e a vontade de dizer a Won era imensa. Contar a ele antes que antes mesmo dele me dizer tudo o que havia passado, eu já havia ouvido por trás da porta. Era o melhor a se fazer. Eu não ficaria escondendo aquilo dele, não podia.

Eu estava o tratando de forma diferente, sabia disso. Era outro motivo pelo qual eu me sentia horrivel. Mesmo inconscientemente andava mais afastado dele. Afinal, eu nunca deixava o silencio pairar por nós nem mesmo por um segundo. Sempre arranjando um assunto, por mais aleatório que fosse. Mas agora eu tinha tanta coisa em mente que simplesmente ficava quieto. Os pensamentos nublados por sensação de culpa e lembranças desagradáveis eram bem corriqueiros. E eu fervilhava com as informações sobre DongYul.

Os pertences de WonWoo, os quais eu ainda iria buscar em sua casa, haviam sido devolvidos. Examinara minuciosamente cada milímetro de sua mochila a procura de algo errado, de algo suspeito. Folheara as pastas e cadernos, não deixara um centímetro fora de minha vista. Estranhamente não havia nada além de suas coisas. Nem uma mensagem sequer. Aquilo não fazia absolutamente sentido nenhum, e apenas me dava medo e calafrios. Além de uma raiva descomunal. Se aquilo era alguma gracinha daquele desgraçado ele ia se ver comigo, se encostasse em WonWoo ou em minha mãe seus dias estariam contados. Seus dias já estavam contados por ter feito tudo aquilo com Won.

Ao menos agora Won podia voltar a ir as aulas. Usaria minhas roupas por enquanto já que, com sua mochila mandada por DongYul um aviso de que sua casa estava ocupada era um fato. Sem falar que DongHyo ainda estava lá. Eu esperava ter ajudado ao menos um pouco com minhas tentativas de lhe passar o conteúdo das aulas.

Imaginava se o desgraçado do DongHyo havia visto DongYul. Pelo que WonWoo havia dito, seu pai não era violento antes da mudança de cidade. E mesmo sendo contra, aceitava seu namoro com DongYul por julga-lo um "bom menino". Não conseguia imaginar o que aconteceria se se vissem agora. Se DongHyo enfrentasse DongYul por ser homossexual ou se os dois resolvessem que juntos machucariam mais WonWoo.

_Gyu...? – Levei um susto com a voz mansa que foi soprada de repente perto de minha nuca. Virei-me rapidamente da sua direção dando as costas a janela de meu quarto. Outro susto quando seu rosto estava próximo de mais ao meu. Tão próximo que quase colidi-me com o mesmo. Mal havia percebido sua aproximação, não havia ouvido nenhum passo, demasiado distraído com meus pensamentos. Sua expressão era feita de preocupação e medo hesitantes, mas de certa forma ele parecia fofo. Senti uma das laterais dos lábios erguer quase imperceptivelmente – No que está pensando? – Levou uma das mãos a nuca, parecendo sem graça e extremamente hesitante.

_Quer mesmo ir a aula amanha? – questionei antes de tudo, apenas para conferir. Ele assentiu, parecendo convicto de que era a decisão correta. Talvez fosse em circunstancias normais, mas haviam dois loucos querendo o machucar – Seus amigos estão lá, mudaram-se para esta cidade. Não avisei por não saber se iria gostar de saber ou não – Ele ergueu as sobrancelhas. Comprimi os lábios num sorriso mais que obviamente forçado, estava enrolando, desviando do assunto e querendo ao máximo adiar aquilo. Não queria que ele ficasse zangado comigo. O sorriso falso lhe fez exibir uma expressão apreensiva – Preciso lhe contar algo importante – disse com voz antecipadamente arrependida.

_O que foi? – Ele indagou já parecendo começar a ficar tenso. Mordi o lábio inferior, nervoso. E inconscientemente percebi sua atenção disparar para aquele lugar, onde permaneceu, por tempo de mais para ser casual. Antes que ele engolisse em seco e voltasse a olhar em meus olhos.

O que foi isso?

_Aquele dia em que SeokMin estava aqui...- comecei, referindo-me há quatro dias. Não haviam visitado-o desde então, se por escolha própria ou por não saber se ele estava preparado eu não sabia. Pacientemente me indagavam sobre ele na escola, questionando sobre seu bem estar e afins. Ficariam felizes quando WonWoo finalmente retornasse a falar com eles por si só, na escola. O vi tencionar levemente o corpo quando fiz menção àquele dia - Que você disse ter descoberto serem irmãos... – Seu rosto empalidecera quase imperceptivelmente, a expressão fora gradativamente drenada do rosto bonito – Eu ouvi, atrás da porta. Não consegui evitar, quando percebi já havia ouvido tudo. Desculpe...

Ele continuou a me mirar inexpressivo, e a falta de expressão me fez temer o que ele faria ou diria. Aguardei raiva, ou até magoa por ter ocultado aquilo de si, mas nada veio. Em meu rosto, o pânico e o medo deveriam ter ficado aparentes, pois um quase invisível sorriso de compreensão foi exibido ali em sua face.

Ele deu um passo para frente após seu sorriso sumir, engoli em seco. Para a aproximação ou para a falta daquele sorriso, eu não sabia.

_Ouviu... tudo? – perguntou, a voz seria semelhante a expressão que ostentava. Mas ainda havia compreensão ali. Assenti – O que quer dizer com tudo? – indagou com certa lentidão, causada pesa hesitação em demasia.

_Desde que ele lhe disse que eram irmãos... que você é hyung dele. Desculpa mesmo, era algo pessoal seu e...

_Gyu – interrompeu-me olhando para baixo, mas com o rosto ainda erguido na minha direção. Ele parecia tão extremamente hesitante que meu estomago se revirava, achava que era minha culpa – Tudo bem – disse, com uma calma que me deixou confuso, ele ergueu o olhar até mim e foi sua vez de morder os lábios. E acabei por entender porque ele encarou os meus. Won pareceu perceber onde minha atenção fora deixada e sacudiu a cabeça, voltando a falar – Tudo bem – Deu mais um passo para perto, ficando próximo de mim, talvez próximo de mais. Ele sorriu levemente, um sorriso verdadeiro, que fez um brilho de felicidade tênue reluzir em seus olhos por um momento. Acabei sorrindo também, feliz por aquela tristeza, mesmo que momentaneamente, deixar aqueles olhos. Uma tristeza que eu sonhava em retirar dali permanentemente.

_Mesmo? – repliquei esperançoso, levemente afetado por sua proximidade. Ele assentiu fracamente me acalmando.

_Não tem problema, por que está assim? – Comprimi os lábios e apenas continuei o olhando por um bom tempo. Até suspirar e admitir:

_É algo pessoal seu, entende? Não queria ouvir assim, e você me contou depois – disse de forma nervosa, gaguejando. Comecei a mover os braços, inquieto, gesticulando aleatoriamente. WonWoo percebeu e segurou meu rosto com a mão gelada num ato rápido, para me fazer parar. E funcionou. Parei e o olhei, ele pareceu perceber o que fazia e recuou, levando suas mãos até as minhas desta vez. Olhou para as mesmas entremeando nossos dedos uns nos outros. O ato fez meu coração se aquecer incomumente.

_Tudo bem Gyunnie – Sorriu ao falar meu nome de foram manhosa e fofa – Mesmo.

Engoli em seco sentindo um estremecimento passar pelo corpo. Gyunnie. A forma que ele havia dito. Ah, eu estava tão perdidamente apaixonado pelo garoto a minha frente. E ou ele não fazia ideia do como aquilo me afetava, ou sabia e queria brincar com meu psicológico.

Passei a perceber o quão próximos estávamos novamente, e meu coração ressoou alucinadamente em meu peito. Olhei para o sorriso hipnotizante e engoli em seco. Olhei para nossas mãos juntas e senti-me intimidado pelo quanto meu coração batia forte.

Então me afastei, de novo. Covardemente.

O garoto estranho que usava pretoOnde histórias criam vida. Descubra agora