Uma Patricinha em minha vida

Capítulo sem título 39

                                Melinda

Eu nunca pensei muito sobre minha morte. Na verdade eu sempre achei que algum cientista inventaria alguma fórmula maluca da juventude e assim eu poderia viver eternamente em um mundo cor de rosa perfeito, pelo menos era isso que eu imaginava quando era criança. Eu até mesmo achava que meu pai já tinha achado esta tal fórmula, até descobrir que a fonte da juventude envolvia sangue e bisturi. Eu já tinha visto muitas mortes em filmes, geralmente as pessoas que morriam viam um curta metragem da sua vida inteira, desde que nasciam até o momento fatídico. E agora estou pensando se isso é realmente possível e se isso faria alguma diferença pra mim. É engraçado como as coisas podem mudar em um curto espaço de tempo. Minha "vida perfeita" foi totalmente desconstruída e deu lugar ao meu "karma" ou poderia ser "inferno astral". Mas o que poderia ter sido o fim para alguns na verdade foi só começo no meu caso. O começo da minha alto-descoberta. E eu gostaria de ver um curta metragem agora, mas não da minha vida e sim do que ela poderia ter sido se eu tivesse descoberto esse outro "eu" antes. E apesar de tudo, eu achava que estava preparada para o que vinha a seguir, porém eu não estava.

De repente tudo fica escuro. E apesar de achar que não poderia mais sentir nada, eu sinto muito frio. Eu sempre achei que no inferno fosse quente, mas pelo visto eu estava enganada. Estou com tanto frio que meu queixo treme sem parar. E está tão escuro que não tenho certeza se meus olhos estão abertos ou fechados. Está tudo tão silencioso e isso é terrível. Será que é isso, então? Vou passar a eternidade no escuro, sozinha e morrendo de frio. Para pagar por meus pecados em vida. Isso é cruel. Tento me lembrar das coisas que fiz em vida que poderiam ter me levado a este momento. Só que estou confusa. Minhas lembranças são confusas e algumas não passam de um borrão, apenas uma visão me vem na mente com clareza. Um olhar. Olhos claros. Um garoto? Mas quem é ele mesmo? Tento me lembrar e não consigo. E então ouço sussurros. Tento prestar atenção, mas continuo sem enxergar nada. E os sussurros continuam e estão cada vez mais perto. Eles me soam familiar. Vejo enfim uma claridade a minha frente e caminho para ela. Meus olhos estão se adaptando a claridade e é difícil mantê-los abertos. Mas mesmo assim os forço a ficarem abertos e de repente tudo que eu vejo é uma luz muito clara, o que me obriga a ficar com os olhos semicerrados.

-Até que enfim!

Diz um homem

-Graças a Deus!

Ouço então a voz de uma mulher.

E dois rostos aparecem na minha frente. Tento me lembrar deles.

-Mãe? Pai?

Digo confusa e estranhando minha própria voz. Minha boca está seca e minha garganta arde. O homem e a mulher sorriem.

-Sim filha, somos seus pais. E vai ficar tudo bem, você só precisa descansar.

Minha mãe fala passando a mão na minha testa.

-Você está apenas com um pouco de febre.

Diz meu pai e olho para ele.

-Água!

Peço com dificuldade.

Ele me alcança um copo cheio e eu tomo alguns goles devagar, pois minha garganta ainda dói. Me mexo e sinto dores por todo meu corpo. Gemo de dor e meu pai arruma os travesseiros para que eu possa ficar um pouco mais confortável.

-O que aconteceu?

Pergunto por fim, porque minha mente ainda está muito confusa. Meus pais se entreolham e parecem estar decidindo algo.

-Um acidente, Mel!

Minha mãe diz e segura minha mão.

-Mas não se preocupe, o importante é que você está bem agora e viva!

Diz meu pai sorrindo. E minha mãe sorri também concordando.

-Por favor, preciso que saiam agora! A paciente necessita descansar.

Uma mulher vestida de branco, e que eu suponho, seja uma enfermeira pelas roupas que usa fala de cara fechada para meus pais. Eles sorriem de novo e me tranquilizam mais uma vez, e logo após deixam o quarto. A enfermeira manipula alguma medicação no meu soro e eu a observo. Sinto meus olhos pesados de sono. Meu último pensamento antes de adormecer é, de onde conheço essa enfermeira se só acordei agora?