Capítulo sem título 49

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                                     Daniel

Foi tudo tão rápido, que eu quase não conseguia registrar tudo que estava acontecendo. Enquanto tentava passar por todas aquelas pessoas, a única que conseguia enxergar era a Melinda. E quando vi aquela arma apontada para ela um frio me percorreu a espinha. A sensação foi de dèjá vu. Eu só pensei "Não posso perdê-la novamente". E então aquele estrondo. Aquele barulho me atormentaria pelo resto da vida. E não somente eu, mas a todos ali presentes. Esse barulho seria o motivo também dos meus pesadelos futuramente. Às vezes na vida precisamos passar por momentos como este, para dar valor aos momentos de calmaria. Mas nunca será fácil. Nunca. E então, o caos que já tinha se instalado, ficou muito pior. As pessoas desesperadas empurram e esmurram quem estiver na frente. E eu também desesperado faço o caminho inverso tentando chegar a Melinda. Quando enfim consigo enxergar algo, meu desespero aumenta. Melinda está deitada no chão e uma possa de sangue se forma perto dela. Eu empurro as poucas pessoas ainda em meu caminho, não me importando com as pessoas me xingando e nem com os roxos que provavelmente vou ter mais tarde, devido aos socos dos desesperados. Corro até Melinda. Meu coração está saindo pela boca. Minhas mãos tremem. Eu só enxergo ela. Me ajoelho na sua frente e com todo cuidado coloco sua cabeça no meu colo. Fecho os olhos enquanto rezo aos céus que não a tirem de mim. Minha garganta dói com o choro preso no fundo. Meus olhos ardem. Ouço barulho de sirenes se aproximando. E então, ouço um grito aterrorizante. Abro os olhos e só então me dou conta do cenário em volta. Andre está caído no chão não muito longe de Melinda. Noto que a poça de sangue é muito maior perto dele e que o sangue perto de Melinda está na verdade vindo dele. Laura chora em cima de Daniel. Seu desespero é angustiante. Só então me lembro de verificar os batimentos de Melinda. Ela esta viva. Graças aos céus. Examino seu corpo em busca de um ferimento de bala. Não tem nada além de arranhões superficiais, provavelmente causados pela queda. Sinto-me envergonhado por estar aliviado, pois se não foi Melinda a ferida, então só pode ser o Andre. Melinda deve ter desmaiado apenas. Aproximo-me do corpo de André. Laura nem ao menos olha em minha direção. Ela continua agarrada a ele chorando. Procuro por sua pulsação em vão. Está morto. Nunca gostei dele. Mas também nunca desejei sua morte. Tento passar a mão no braço de Laura para consolá-la. Mas ela me olha com um olhar mortal.

-Tire suas mãos, idiota!

Diz com raiva. E então volta a abraçar o corpo sem vida e chorar. Percebo que, da maneira doentia dela, realmente amava ele. Ouço um gemido. Melinda está acordando. Volto para ajudá-la a levantar. Está um pouco atordoada, mas quando consegue se levantar me abraça apertado. Eu suspiro aliviado. Os socorristas chegam. Eles percebem que a gravidade do caso de Andre é maior e correm para ele. Melinda se da conta do estado de Andre. Ela me olha perplexa e coloca a mão sobre a boca. Parece estar juntando as peças. Me larga e tenta se aproximar dele, mas eles não deixam. Quando eles dizem a palavra óbito. Melinda me olha desesperada e eu a abraço. Ela enterra sua cabeça em meu peito e começa a chorar. Laura se nega a deixar Andre e acaba indo junto na ambulância. Nós seguimos em outra, pois Melinda precisa ficar um tempo em observação. No hospital meus pais e os de Melinda não demoram a chegar. Estão todos preocupados. Noto o alivio tanto dos meus pais quanto os dela em saberem que estamos bem. Mas ao ficarem sabendo da morte de Andre ficam pesarosos.

-Era um garoto tão novo!

Diz minha mãe chorosa e meu pai passa os braços em volta de seus ombros.

-Ficamos sabendo que ele pediu a Mel em casamento!

Diz a mãe dela, também chorando agarrada ao marido.

Minha mãe põe a mão sobre a boca para segurar um soluço. Minha mãe sempre foi muito emotiva. Sempre se preocupa muito com as pessoas. O que combina perfeitamente com sua profissão. Eu já sabia que Andre pediria Melinda em casamento. Mas não sabia quando aconteceria, e fico surpreso por ter sido na festa. Pergunto-me se ela já sabia e se fazia parte do plano.

Os médicos pediram para que Melinda passasse a noite no hospital por precaução. Como ela passou muito tempo desacordada, o evento traumático poderia desencadear alguma reação nela. Alguns policiais apareceram nos fazendo algumas perguntas e nos intimando a comparecer no dia seguinte a delegacia para um depoimento mais formal do caso. Pelo que fiquei sabendo Larissa fugiu e ainda procuravam por ela. O pai de Laura apareceu para buscá-la. Ele parecia extremamente irritado. Saiu a arrastando pelo braço. Eu cheguei até a ter pena dela naquele momento. Mas o pior momento foi quando os pais do Andre chegaram. Ao receber a noticia da sua morte seu pai ficou totalmente descontrolado, e começou a ameaçar todas as pessoas do hospital. Sua mulher chorava silenciosamente em um canto. Enquanto ele gritava, a plenos pulmões, todos os tipos de palavrões possíveis. Chegou até mesmo a retirar um maço de dinheiro e jogar na cara de um médico exigindo que ele "ressuscitasse" seu filho. Foi uma cena nada agradável de se presenciar. Logo depois ele passou mal e foi atendido pelos médicos, e então alguns parentes apareceram para levá-los para casa. Me despedi da Melinda da maneira mais formal possível, já que ninguém sabia da nossa relação ainda. Os pais dela passaram a noite a fazendo companhia. Por mais que eu quisesse estar lá com ela, acatei o pedido de Melinda e fui para casa. Porém, passei à noite preocupado com ela. Mandei algumas mensagens, que ela respondeu me tranquilizando e pedindo para que não me preocupasse.

No dia seguinte depois que eu e Melinda prestamos nossos depoimentos, nos encontramos na praça perto da minha casa. Ela me contou que seu plano era desmascarar Laura e Andre na frente de todos. Disse que ficou surpresa por ter ganhado o concurso de rainha do baile e por Andre a ter pedido em casamento. Mas ficou ainda mais surpresa por Andre ter se atirado na sua frente e a empurrado quando Larissa atirou. Larissa a pessoa que tentou a matar por duas vezes, graças a uma paixão doentia pela Laura. Larissa que amava Laura, que amava Andre, que amava Melinda, que amava Daniel, que não amava ninguém... Mentira. Eu amo Melinda. E se tem algo que não posso negar é isso. Toda essa situação seria cômica, se não fosse trágica. Melinda ficou muito mexida com tudo que aconteceu, mas me garantiu que já não sentia nada por Andre. Apenas ficou triste de saber que ele faleceu tão novo e tentando a proteger. No enterro meus pais decidiram comparecer em respeito ao pai dele, que era um cliente do meu pai, mesmo que não fosse o melhor dos clientes em questão de educação. Melinda também foi com seus pais. Eles ficaram ao lado da família dele já que tinham muito mais proximidade. Mesmo não podendo estar do seu lado, eu e ela sempre procurávamos o olhar um do outro e eu sentia que isso a fazia se sentir melhor. Nos encontramos logo depois do enterro em um lago próximo ao cemitério. Sentamos em um banco de madeira e ficamos abraçados, admirando a paisagem. Depois de algum tempo eu olhei em seus olhos procurando algum resquício de arrependimento, mas tudo que encontrei foi amor e reciprocidade.

-Você tem medo do futuro?

Indaguei e nem sei ao certo por que.

-Não com você do meu lado!

Ela responde e sorri.

-O futuro é incerto, mas se ti tenho ao meu lado, sigo bem.

Digo e sorrio de volta pra ela.

-Eu te amo, Daniel!

-Eu te amo, Melinda!

Uma Patricinha em minha vidaOnde histórias criam vida. Descubra agora