CASSIE
Não havia nada do outro lado da Porta senão a escuridão, que parecia ondular como água. A Esfinge aguardava silenciosamente ao lado dela.
Dei um passo à frente, na direção da Porta, insegura e com medo, mas firme. Comprimindo os lábios, continuei, mas senti, com um alívio culpado, uma mão apertar meu ombro. Parei, me sentindo aliviada por alguém se opor ou ao menos me dar alguns segundos a mais.
Olhei para trás, e notei que era quem eu já suspeitava: Alyon. Mas não havia aquele sorriso costumeiro, mas sim uma expressão séria e talvez relutante, mas determinada.
– Eu vou primeiro – falou. Vendo minha expressão, forçou um sorriso. – Pra ver se a barra tá limpa.
Fiquei ali, parada, sem reação. Eu devia ir primeiro, era responsabilidade minha, eu não devia expor ninguém a um suposto risco... Mas não podia fazer nada ali: Alyon discutiria comigo até eu ceder. E era mais ou menos o mundo dele, finalmente algo que conhecia, e provavelmente sabia mais sobre o Mundo Inferior do que eu.
Alyon olhou uma última vez para trás, correndo os olhos pelo grupo, e deu um sorriso reconfortante quando chegou em mim, porque minhas mãos suavam e minha expressão era temerosa e preocupada: nunca imaginei que chegaríamos tão longe – na verdade, tinha medo de chegar. E virando-se para a Porta de Hades, Alyon pulou na escuridão, e mesmo quando apenas seus pés haviam tocado seja lá o que era aquela coisa negra e ondulante, ele sumiu. Não foi tão dramático assim: simplesmente desapareceu. Puf. Esperei um grito, uma exclamação, ou qualquer coisa, mas o que obtive em resposta foi o silêncio incômodo.
Enfim, a Esfinge falou:
– O próximo, rápido, a conexão com o submundo é muito instável.
– O que acontece se algo der errado? – Clarisse perguntou, assombrada.
– Da última vez que isso aconteceu, o sujeito parou dentro do rio Lete, o rio do Esquecimento. O coitado não lembrava como respirar, morreu um tempinho depois.
Estremeci. Cair dentro do rio do Esquecimento não me parecia muito convidativo não, mas fui até a borda da Porta de Hades.
– Desejem-me sorte – sussurrei.
E antes que toda a coragem se esvaísse de mim, pulei.
Não vou mentir: foi a pior sensação do mundo. Era algo entre mergulhar em lava, no começo, e minha pele ardeu intensamente, e soltei uma exclamação involuntária, mas nada saiu de minha boca, e senti como se estivesse tomando água fervente. Depois, muito abruptamente, foi como se eu tivesse me jogado no mar da Antártida apenas de biquíni. Estava tão gelado que doeu. Comecei a não sentir mais minhas mãos e pernas, e sentia meus olhos se fecharem lentamente.
Não, pensei irritada. Não vou morrer aqui, mas não vou mesmo! Estou a literalmente um passo do Hades.
Tentei focalizar qualquer coisa boa, me lembrar de qualquer momento bom que tive, e enfim me senti mergulhando em um oceano de águas calmas e mornas, inabitado e esperando para ser explorado. Abri mais os olhos, e vi, surpresa, que havia realmente água ao meu redor. Eu não sabia onde era cima e baixo, mas olhando em uma direção vi luzes bruxuleantes, e segui nadando naquela direção, meus pulmões irritados pela falta de oxigênio, e meu coração martelando nas minhas costelas. Enfim cheguei a "superfície", e submergi uma mão. Senti um vento gélido bater contra ela, e tateei o nada, procurando algo para me segurar. Bolhas saíram da minha boca quando senti algo segurar minha mão e me puxar. O que seria? Seria Caronte? Plutão? Algum monstro? Mas não tive tempo para decidir, porque em pouco tempo eu me via estatelada num chão frio de pedra. Quer dizer que a superfície ficava em cima, como um rio invertido, e que ignorava todas as leis da gravidade. Outra coisa que percebi foi que estava seca, e exatamente como estava antes de pular. Depois disso, senti algo – ou alguém – segurar meus braços e me levantar, com estranha gentileza. Suspirei aliviada ao ver que era apenas Alyon.
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Em Busca da Origem - As Portas de Hades
Teen FictionNão quero fazer parte desse mundo... Mas acho que não tenho escolha. A história gira em torno de Cassie, uma garota com sérios problemas com a mãe - e com o mundo -, mas, após uma de suas muitas fugas, em uma tarde de estranha tempestade (afinal, é...