Capítulo 8 - Sussurros

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Ratos. Uma infestação de malditos ratos em todo o refeitório — Foi a primeira coisa que Gayler ouviu assim que cruzou as portas naquela manhã. Era segunda-feira, e os garotos escolhidos para integrarem as equipes da faxina resmungavam baixinho aguardando a chegada de Alex Cotton à sala de aula. — A tarde inteira, inteirinha matando aquelas coisinhas peludas e mal cheirosas — o garoto prosseguia a resmungar, insatisfeito com o remanejamento — e se formos mordidos? Já pensou? Será que os freis ao menos saberão o que fazer? — bufava consternado com o colega que apenas sorria debochado.

— Oras Gomes. Não seja frouxo — o rapaz sentado às costas retrucara — É óbvio que ratos não atacam seres humanos — fez uma pausa — É claro, existem algumas exceções, tipo, se eles se sentirem ameaçados, ou se forem ratazanas muito famintas. — apreciava a feição amedrontada do colega, e para quebrar o clima, deu-lhe um cutucão — mas não se preocupe. Se você for mordido podemos enterrá-lo lá na horta. Ao menos sua cara de bosta servirá para alguma coisa.

Neste momento, o som do sino ecoou interrompendo todos os ruídos. Os internos se ajeitaram nas carteiras, preparando os materiais, e atentos, ouviram o retinir dos passos de Alex Cotton entrando porta adentro, com sua costumeira expressão fechada e olhar penetrante.

O frei conferiu cautelosamente fileira por fileira, fitando especialmente Dan Mason, que silencioso, o encarava. Alex Cotton parecia ter uma fixação extra no interno problemático e atrevido, e isso já não era novidade, uma vez que Dan Mason não se fazia de coitadinho. O garoto era notavelmente arrogante, e dificilmente dava a Cotton o gostinho de dobrá-lo.

Depositando os livros sobre a mesa, o frei-professor postou-se frente à lousa e pigarreando observou os alunos se levantarem em posição reverente, em seguida, puxou a prece matinal.

Lá fora o sol se erguia sob o céu, e entrando pela janela, banhava as mesas enfileiradas pela sala. Por um longo período todos permaneceram em silêncio, sem abrir a boca sequer para pedir permissão a fim de ir ao banheiro. Os únicos ruídos vinham do giz deslizando sobre a superfície lisa do quadro-negro, dos lápis preenchendo linhas em branco e corvos em sua costumeira algazarra sobre a torre do sino.

Alex Cotton parecia não se cansar. Horas e horas a fio sem interromper a transcrição da cansativa lição para a lousa. Alguns alunos vez por outra faziam uma rápida pausa para descansar os dedos, e Marlon Gayler, permanecia distante em seus pensamentos.

Dan Mason. Era nele que outra vez estavam.

Recordando-se do encontro no quarto, questionava-se do porque o garoto não querer emprestar-lhe o celular, do porque ser tão ignorante, arrogante e fechado. Vez por outra erguia os olhos sorrateiramente e fitava-o pelas costas, sentado na carteira à frente.

Seus ombros largos subiam e desciam no ritmo da respiração. Parecia estar distante, pensativo, calculando uma decisão importante. Os cabelos cortados baixinhos deixavam-no com ar ainda mais rebelde, sua proximidade era inebriante, e a pontinha das orelhas, por mais que quisesse taxá-las como horríveis, tinha lá seu charme.

De boca fechada, imóvel, até parecia sociável. Porém, não podia enganar-se, Dan não era aquela lagoa tranquila que estava à sua frente, e sim um mar revolto, pronto a passar por cima de quem quer que entrasse em seu caminho.

Ofegante, voltou a encarar a folha cheia de linhas em branco no caderno pautado. Só agora percebera que já há algum tempo o som de giz havia cessado, assim como o tilintar dos sapatos frente à lousa.

Ele ergueu os olhos para conferir o que acontecera, e sentiu-se desconfortável ao perceber Alex Cotton fitando-o fixamente, acomodado à sua mesa.

O Exorcismo de Marlon Gayler [Romance Gay]Onde histórias criam vida. Descubra agora