Capítulo 36 - Ratos e Homens

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Naquela manhã o sino não fora retumbante. Na realidade, uma sineta fora chacoalhada pelos corredores a fim de despertar os que ainda dormiam, uma vez que o sino da torre permanecia danificado e congelado. Jeremy Mason já estava acordado quando o frei passou do outro lado da porta, na realidade, sequer conseguira fechar os olhos desde que o irmão fora levado para longe.

Mantendo-se parado frente à janela coberta por tapumes, ele observava os portões, na esperança de ver a charrete retornando com o mais velho, fosse em companhia do frei que o levara embora, ou sozinho, como um super-herói. Sem ele tudo ficava muito estranho e aterrorizador, sem Dan, era como se aquela presença maligna o quisesse tragar.

Ele tentava controlar o medo, mas era difícil. Estava ansioso, preocupado, e Saint-Michel o atemorizava o suficiente para fazer o coração palpitar acelerado o tempo todo. Por isso não desviava os olhos do jardim, receoso de que pudesse ver algo que não queria, como fora antes das crises, como fora naquela noite em que os garotos fizeram a maldita brincadeira.

Sentindo-se claustrofóbico olhou ao redor. As paredes acinzentadas pareciam querer imprensá-lo conforme se lembrava do que ouvira sobre o lugar, mas fechando os olhos, sentou-se na cama e procurou respirar fundo, fixando os sapatos. Precisava manter a calma, evitar as crises. Não podia ceder agora que estava longe de Dan, pois sem seu apoio não sabia o que poderia acontecer.

Estava trêmulo, sentindo-se opresso, e quando percebeu as vistas começando a tontear, olhou para a cômoda onde estavam seus remédios, porém um barulho propagou-se do outro lado da porta, e virando a cabeça, imediatamente deu de cara com o padre-diretor que se projetou em companhia de um frei, trazendo consigo um prato de refeição.

— Garoto Jeremy?

— Padre? — ele ergueu-se ajeitando o uniforme e olhou para o corredor, alguns colegas moviam-se em direção à escadaria. Sabia que as coisas haviam mudado bruscamente, mas ainda assim, guardava a esperança de que Dan surgisse de repente.

— Como se sente esta manhã garoto Jeremy? Teve uma boa noite de sono? — o velho retrucou olhando ao redor, e indicando ao frei que deixasse a refeição sobre a escrivaninha, pediu que aguardasse ao lado de fora.

— Boa noite? — o garoto gaguejou — Eu... bem. O senhor tem notícias do meu irmão? — sentiu a voz presa na garganta, e precisou se segurar para não demonstrar fraqueza. Respirando fundo, o padre tocou em seu ombro e o fez se sentar. Acomodando-se ao seu lado, procurou acalmá-lo enquanto massageava as mãos.

— Ele está bem meu rapaz. Não veja a partida do seu irmão como um castigo, pois não foi. — disse, procurando manter um tom ameno na voz — Esta foi a melhor decisão para ele, para todos. Dan já é maior de idade, esteve sob a proteção do monastério por muito tempo, e como todo bom adulto, não via a hora de sair para conhecer o mundo. Você não acha que seu irmão merece um pouco de liberdade?

Jeremy refletiu por um instante.

— Sim padre. Mas eu...

— Ora criança, então não fique preocupado — o velho retrucou, percebendo o quanto estava nervoso — Dan ficará bem, eu certifiquei-me disto antes de mandá-lo à vila. Quanto a você, Saint-Michel é seguro o suficiente para que fique até chegar a sua vez de partir — dizia com tanta convicção, que se Jeremy não soubesse o que estava ocorrendo ali, até acreditaria — Por tanto, busque se acalmar. Tudo bem?

Ele respirou fundo, olhando rapidamente para o corredor. O padre seguiu a direção de seu olhar, então se levantou, colocando sobre a cômoda um pequeno terço que trouxera consigo.

— Então, posso me arrumar para o café? — retrucou.

— Café? — o padre virou-se para ele, então sorriu — Oh, não garoto, não será preciso — fez uma pausa, então caminhou de volta à cama — Antes de tomar a decisão sobre seu irmão, estive a conversar com o monitor Alex Cotton, e chegamos a uma conclusão. Bem, em atenção à sua saúde, decidimos que, por enquanto, o melhor para você será continuar no quarto, a fim de que se recupere por completo.

O Exorcismo de Marlon Gayler [Romance Gay]Onde histórias criam vida. Descubra agora