Capítulo 41 - Quarto 24

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Havia um clima pesado no ar e talvez por isso as luzes falhassem. O padre seguia acompanhado pelo frei, observando com estranheza a porta dos aposentos cujos pequenos crucifixos tombaram de ponta cabeça. Aquilo só podia ser brincadeira de algum interno, ordenaria que alguém descobrisse o responsável e o puniria, mas antes aguardaria a partida de Europeus.

Inicialmente eram apenas os crucifixos maiores que comumente achava tombados de ponta-cabeça pelos corredores, pensara até que se tratava de algum problema nos pregos que os fixavam, mas agora, diante da cena perfeitamente orquestrada, tinha certeza que alguém estava por trás daquilo. Umedeceu os lábios.

— Você disse que ele o empurrou? Como pode ter certeza?

— Ele confessou padre — o frei que o acompanhava retrucou, observando com espanto a cena — Quando saímos do refeitório, e vimos o frei caído ao chão, deparamos com o garoto parado ao topo da escadaria. Ele observava a cena silencioso, até que subindo até onde estava, Cotton o interrogou. O garoto disse que o frei Mantenedor merecia ser castigado.

— Ele disse isto?

O homem engoliu em seco.

— Isto, e... um pouco mais.

O padre-diretor franziu o cenho e virando-se, olhou para a porta que se projetava à frente. Parando, observou nela o crucifixo de ponta-cabeça e sentiu-se incomodado.

Ruídos se propagaram do outro lado, não eram compreensíveis, e quando fez menção de tocar a maçaneta, observou-a ceder e Alex Cotton projetou-se massageando o pulso. O padre engoliu em seco.

— Cotton? ­— fixou o gesto do frei um momento, porém Alex ocultou o punho sob o hábito ­— O que está havendo aqui? Este é o quarto de...

­— Precisamos de panos limpos e um pouco de água quente.

Alex Cotton nada disse a princípio. Mantendo a feição séria, olhou para o homenzinho parado ao lado do padre, dando-o ordens.

­— Panos e água? ­O que aconteceu?

Aquilo estava muito suspeito, e as luzes falhavam deixando tudo mais desconfortável. Tantos problemas, tanta dor de cabeça.

— Traga também alguns esparadrapos, e algo para ferimento.

­— Cotton? — O padre exclamou irritado, e quando enfim o auxiliar deu de costas para cumprir as ordens, teve a atenção voltada a si. Cotton procurava manter-se sereno.

­— Temos um problema padre, mas... está sob controle.

­— Um problema? — disse cerrando os lábios — Conte-me uma novidade frei Monitor. O que em Saint-Michel não tem sido um problema nestas últimas semanas?

— Marlon Gayler — Cotton o interpelou e o padre sentiu um nó na garganta — Ele apareceu.

— Céus. Ao menos uma boa notícia — olhou para o fim do corredor, então tornou a ele — Deixe-me vê-lo...

— Acredito que não seja o melhor momento padre — Cotton colocou-se entre o velho e a porta, e franzindo o cenho, o padre o encarou.

— Como assim? Mas, o que diabos está acontecendo aqui? E... que ruídos são esses do outro lado?

— O frei Isaac está com ele. Marlon é o responsável pelo que ocorreu ao frei da manutenção.

— Então é verdade o que dizem? Um interno intentou contra a saúde de um frei?

Cotton fez silêncio olhando para a porta. Ruídos continuavam a ecoar do outro lado, e as luzes ainda falhavam. A neve devia ter alcançado os geradores.

O Exorcismo de Marlon Gayler [Romance Gay]Onde histórias criam vida. Descubra agora