Ele caminhou pelo corredor silencioso observando as luzes serem apagadas, pressentindo os quadros dos antigos diretores fiscalizando-o com o olhar de dureza. Fechou a expressão, mas não olhou para trás. Desde que o monastério fora fundado séculos antes, tivera em sua história apenas quinze líderes, sendo ele o décimo quinto da ordem, sob indicação de Palência. Estar ali era um troféu merecido, batalhara pela posição, fizera coisas muito difíceis a fim de permanecer no cargo, e não seria agora que um fedelho que mal conhecia a história do lugar iria colocá-lo sob dúvidas. Tudo o que fizera fora pelo bem da ordem, tudo o que fizera fora pelo bem da fé, ele não se arrependia, pois sabia que Deus tinha seus propósitos até mesmo nas fatalidades.
Deixando o corredor o padre-diretor parou um minuto a observar o caminho que conduzia ao hall. Estava quieto, mal iluminado, e todos os internos e freis haviam se recolhido. Pelas janelas observava a neve caindo lentamente lá fora, e meneando a cabeça, prosseguiu seu trajeto parando frente ao local onde estivera o antigo vitral do Arcanjo. Não podia fazer ruídos, já que lá embaixo, na sala frente ao refeitório também conhecida por capela dos anjos, alunos dormiam em grupos.
Fixou os degraus, e com um nó na garganta respirou fundo ao observar o vulto parando logo ao lado.
— Diretor?
Ele umedeceu os lábios, e então se virou para a silhueta imersa no escuro.
— Como estão as coisas Cotton? Algum imprevisto?
— Não. Desta vez sairá como planejado. Eu pessoalmente conferi os aposentos, e...
— O frei Isaac, onde está?
Alex Cotton respirou fundo, então olhou para o corredor e novamente para ele.
— Vigiando a porta. Não há como o garoto escapar.
— Perfeito, perfeito. — conferindo os arredores, o velhote remexeu os bolsos, e dele retirou um mediano envelope selado que o entregou — Aqui, dê isso a ele. Diga para entregar a Samuel sem questionamentos. Deve ser o suficiente para fazê-lo cumprir sua tarefa com discrição.
— Ele certamente vai compreender o recado padre — Alex Cotton respirou fundo, olhando novamente para o corredor sombreado — Apenas não se preocupe, sabemos muito bem que isto é o melhor a ser feito, e logo pela manhã verá o alívio que a decisão trouxera. Verá os últimos dias como um pesadelo que o sol levou, garanto que as coisas voltarão ao normal.
O velhote engoliu em seco sentindo a língua amarga, então fitou seus olhos:
— Assim espero Alex Cotton. Para o bem de todos, assim espero.
Houve um momento de silêncio em que ficou parado a observá-lo sumir rumo a seu destino. O coração do homem estava apertado, mas precisava se controlar.
Dando de costas, pôs-se a retornar para o corredor da diretoria, mas antes de deixar o hall, parou um instante frente a um dos crucifixos que ornavam a parede, estranhando o fato de este também estar tombado de ponta cabeça. Mesmo certo de que tudo não passava de ridículas coincidências, o padre sempre sentia um desagradável arrepio quando acontecia algo assim, arrepio este que retornou quando se virando, teve a estranha impressão de ver alguém parado na escadaria a observá-lo silenciosamente.
Cerrou os olhos para enxergar melhor, porém nada havia a não ser a fraca claridade que emergia pelas frestas quebradas do antigo vitral.
Só podia ser o cansaço, por isso, umedecendo os lábios, ajeitou o hábito e prosseguiu seu caminho. Precisava rezar, precisava pedir a Deus para que nenhuma outra anormalidade acontecesse de agora em diante. Crer que pela manhã seus temores teriam passado, que Dan Mason, o rapaz tido como garoto problema, estaria a quilômetros dali, em qualquer cidade longe da colina.
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O Exorcismo de Marlon Gayler [Romance Gay]
Romance"Internado contra a vontade em um colégio religioso liderado por freis, Marlon Gayler precisará unir-se a Dan Mason se quiser fugir. Dan é um rapaz igualmente problemático, arrogante e envolto por mistérios. É no curso do plano de fuga que um sentim...