Chuviscava e a grama úmida fazia subir um cheiro de terra molhada.
Eu estava ali. Vivi esse momento sem acreditar. Apesar de todo aprendizado, minha mente era perplexa com tantas emoções.
Estavam todos de preto, choravam e pareciam não acreditar. Era de manhã. Um padre fazia a oração e em seguida algumas pessoas discursariam.
Eu não entendia muito bem o que estava acontecendo. Eu assistia a tudo, mas a imagem era turva, enegrecida, picotada. Parecia uma tela de televisão antiga.
Eu sentia uma tristeza profunda. Uma angústia corroía-me por dentro. Olhei para baixo, minhas mãos ensanguentadas, meu peito tinha um buraco e era vermelho.
Um desespero tomou conta de mim, a respiração era mais forte. Pensei estar num pesadelo, mas não acordava.
Olhei à frente e um turbilhão de emoções encheu meu espírito atormentado. Era Luiza. Subia no púlpito de madeira logo à frente de uma grande quantidade de pessoas que aglomeravam-se na parte mais baixa do gramado. Umas sentadas, outras em pé, todas expunham sua tristeza.
Ela falava como um pássaro gracioso ponhe-se a cantar. Sua voz, baixa e serena, expressava sua saudade e cansaço. Sua barriga estava grande, nosso filho estava bem.
Meus sentidos confusos observavam-na sem entender ao certo o que acontecia. Mas, naquele momento, eu só pensava em admirá-la.
Aos poucos fui me acalmando, fui me aproximando e sentindo que estava bem. Olhei para meu corpo e já não havia mais marca. Eu ouvia ela atentamente:
— Não há palavras para descrever sua luta, sua vida, seu amor. Fazia o bem a todos que tinha oportunidade. Era um verdadeiro anjo…
“De quem ela estava falando?” — pensei. De repente meu coração disparou. Senti uma forte tontura, parecia que ia desmaiar. Um grande susto me deixou fraco: vi Raphael abraçando-a enquanto ela descia do púlpito à frente.
Flashes apareceram na minha mente, meus olhos ficaram vermelhos, uma terrível angústia abafava minha garganta impedindo-me de gritar. Olhei para baixo, as marcas voltaram, meu peito estava coberto de sangue. Olhei para frente, Raphael subira para discursar. Vi seus olhos lacrimejantes. Eu sabia que eram olhares falsos. Olhei para um lado e o que vi me fez cair: meu corpo dentro de um caixão de madeira envernizado.
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A HISTÓRIA DE UM OUTRO ALGUÉM
SpiritualQuantos de nós não chegamos ao ponto de sentirmo-nos cheios? Isso mesmo, cheios, saturados, cansados, sem tempo, dinheiro ou ideias? Existe um momento em nossas vidas que estamos buscando nossa base, nossa estrutura e é exatamente neste momento que...