— É... é dele mesmo essa carta. É a assinatura dele, o jeito de falar, as coisas que falou...
— Sim, foi ele quem esteve aqui e eu, por psicografia, reproduzi seus pensamentos.
Alberto ficou viajando em pensamentos, tentando imaginar o porquê de ser um lugar tão longe e como o destino o pôs ali para receber essa carta. Recuperou todas as energias ao lembrar de mim e ver que ainda estávamos conectados. Seus olhos brilharam e ele via-se renovado para o trabalho. Acreditou pela 1º vez de todo o coração na vida após a morte e não podia desconfiar de alguém tão distante e num lugar tão remoto.
Ao ver sua reação eu entendi o porquê de ser tão longe: isso dava ainda mais credibilidade à informação.
— Ele sempre me disse isso, eu lia, eu estudei, mas nunca tive tanta certeza.
— O universo é repleto de incertezas. — dizia o sábio.
Foram para o quintal que ostentava um lindo pomar e horta. O senhor puxou um banco de madeira para Alberto e sentou num toco de árvore próximo.
— Tome um chá — pegou um copo da mão de um jovem que ali estava e entregou ao magro rapaz à sua frente — recupere suas energias — seu Francisco aparentava seus 70 anos, mas exibia uma vitalidade jovem. Tinha um sorriso amável, porém na maior parte era sério, como se estivesse sempre pensativo.
Alberto tomou um gole do chá.
— Quem é você? Como me reconheceu? — perguntou Alberto com outra fisionomia.
— Vejo que já está melhor — dizia o senhor sorrindo — sou apenas mais um humano, apesar de algumas pessoas desta cidade me acharem especial.
— Mas como me reconheceu? Como cheguei até aqui? Eu não...
— Olhe para frente, rapaz. Olhe para cá — falou o senhor apontando para uma trilha de formigas, uma atrás da outra, carregando pesadas folhas e pedras para seus minúsculos corpos — vê as formigas? Como será que conseguem levar um fardo tão grande em seu corpo? Eu não sei, mas eu admiro sua força.
Alberto ficou pensativo. O velho era do tipo contemplativo.
— Entendo. — disse com um sorriso amarelo.
— Acho que a pergunta certa é: por que você está aqui?
Alberto ficou olhando e disse:
— Verdade.
Os dois se olharam e não disseram nada. Alberto inquietou—se e disse:
— Então por que estou aqui?
— Agora você perguntou — disse o velho com uma bela gargalhada — você está aqui para receber a mensagem que já recebeu.
— E o que devo fazer agora?
— Isso eu acho que você já sabe. Deixe eu lhe explicar — o senhor pegou a mão do jovem e a colocou em seu coração — muitos falam que sou genérico quando digo que as melhores respostas estão em seu coração, mas deixe eu te dizer uma coisa: elas realmente estão. Não tenha dúvidas disso.
— Acredito nisso.
— Realmente acredita?
Ele pensou e disse:
— Sim. Eu acho... quer dizer... eu sou ruim de sentir as coisas.
— Sente a brisa que passa por nós?
— Sim, claro. Ela toca minha pele.
— Sente o sol tocar sua pele?
— Sinto os raios solares me tocarem.
— Tudo isso é maravilha de Deus. Ainda não exploramos os nossos outros sentidos, mas aos poucos somos capazes de também sentir a presença de espíritos, anjos, Deus ou até espíritos maléficos. Quando está sozinho em casa, o que costuma pensar?
— Penso em como posso ser útil. Penso nas coisas que poderia fazer e não fiz. Penso em ser grande.
— E acha que esses pensamentos foram originados apenas da sua imaginação?
— Acha que alguém me influencia?
— Seu coração precisa sentir. Se deixar aberta a porta dele, ouvirá muito mais que as ondas do mar e sentirá um calor muito mais forte que os raios solares.
— Acho que preciso voltar.
— Para o Rio ou Brasília?
Alberto se impressionou. Mas esquecendo como ele poderia saber, ficou chocado por sentir em seu coração uma vontade que crescia de ir para o Rio. Por um breve momento sentiu uma grande preguiça por imaginar sair de sua zona de conforto e em tudo que passaria. Não sabia se conseguiria nem se manter. As coisas estavam ficando mais difíceis a nível de emprego e não podia ficar à custa de outras pessoas..
— Deus proverá. Se não tiver coragem de arriscar jamais sairá do lugar — leu seu pensamento o sábio — Siga seus sonhos, tenho certeza que tem uma voz no seu coração que diz para seguir em frente. Lembre-se: o corajoso é aquele que vence medos. Perceba que ele tem medos.
O senhor levantou dizendo que iria fazer o almoço. Foi até o fundo do quintal onde pegou uma galinha e, matando-a, começou a depená-la com muita calma. A manhã toda o senhor ficou com o encargo de preparar a comida e Alberto estava ansioso para falar mais. Nenhuma palavra.
Almoçaram uma deliciosa galinha caipira, ele, o senhor e o ajudante da casa.
Depois de comer, Alberto viu que o senhor recebia pessoas em sua casa para tratamento espiritual. Admirou ver que muitas pessoas vinham de longe para a pacata cidade.
Alberto ajudou a organizar as filas que surgiram e a limpar a casa, inclusive o banheiro.
No dia seguinte de noite eles teriam mais uma conversa:
— Amanhã vou embora. Acho que preciso voltar.
— Tenho certeza que precisam de você mesmo, meu amigo.
— Acho que eu é que preciso deles. — falou Alberto sorrindo.
— Fico muito feliz de ajudar você. Saiba que as portas aqui estarão sempre abertas. Sempre que quiser voltar, será bem vindo.
— Ficarei muito feliz em voltar. — Alberto refletiu — Preciso te perguntar: qual seu sonho? Ainda tem algum?
— Uma vida sem sonhos não teria tanta graça. — o senhor olhou para o horizonte — Tenho o sonho de conhecer o Havaí. Mas sei que é um sonho bobo — disse com uma gargalhada — cresci ouvindo falar desse lugar. Meu tio já foi lá e me contou maravilhas quando eu era criança.
— Pois então quero um dia concretizar esse seu sonho.
Ele riu, os dois se abraçaram e Alberto voltaria para Brasília com dinheiro emprestado da casa Espírita.
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A HISTÓRIA DE UM OUTRO ALGUÉM
SpiritualQuantos de nós não chegamos ao ponto de sentirmo-nos cheios? Isso mesmo, cheios, saturados, cansados, sem tempo, dinheiro ou ideias? Existe um momento em nossas vidas que estamos buscando nossa base, nossa estrutura e é exatamente neste momento que...