Capítulo 14

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Oito meses depois. Alberto estava em sua casa lendo um dos contos de "Lu" enquanto ela ensinava, mostrava para ele como ela escrevia. Todos os enlaces de uma narrativa completa ela passava para ele. A criação de um personagem, a trama de uma boa história e a forma de passar o que quer através de mensagens discretas da narração.

Sentado em sua mesa com Luciana ao seu lado, ele recebe uma ligação. Era do Rio de Janeiro...

— Alô?

— Alberto? — Ele reconheceu a voz e ficou trêmulo.

— Quem é? — Falou mesmo sabendo a resposta.

— Seu amor. Você sabe né, "Albertozinho". — falou, debochadamente, Estéphane.

Ele na mesma hora olhou para seu braço, viu a marca e sentiu—se vigiado.

— O que você quer!? — disse rispidamente.

— Só liguei para dizer que estou com saudades. Como está se virando sem seu amigo Hugo? — emendou com uma risada debochada.

Luciana percebia a tensão de seu namorado.

— Como conseguiu meu telefone?

— Isso importa? Só queria ouvir sua voz, já que você sumiu, né. Seus amigos estão sentindo sua falta, Renato que o diga.

— Renato!? O que houve com ele?

— Tchau, querido! — e deu risadas maquiavélicas.

Luciana quis saber o que houve. A cabeça de Alberto ficou incomum. Passavam tantas coisas, uma certa melancolia, uma certa nostalgia, um pouco de medo e assombro.

Luciana perguntou, mas ele já não estava mais ali. Ficou paralisado em pensamentos distantes. Viajou em ideias e lembranças de tudo. Quis que Luciana se calasse, que ela não estivesse ali. Quis silêncio. Quis deserto. Um novo deserto.

Deu uma passada rápida em sua vida desde que voltara à Brasília. A normalidade em que ela se encontrava não era parte de seu mundo. O ócio em que estacionara não lhe era comum. Ele não era assim. Era inquieto, falante, lutador. Nada do que passou nesse tempo era ele. Não! Não era ele.

Desde que voltou para sua casa ficou extático. Curtiu seu luto em solidão, entregou—se à preguiça, pornografia e coisas fúteis. Tentou continuar com sua página, mas o estresse era grande. Viu-se limitado, estourando a paciência e controle. Seus pais cobravam, e com razão, que ele buscasse emprego e voltasse à faculdade. A faculdade ele tentou, mas o processo burocrático travara, a seu gosto, impedindo-o de voltar a estudar tão cedo.

Entre ataques de raiva e melancolia os dias passavam e nada de proveitoso ele concretizava. Seus amigos o chamavam para sair e ele ia muito de vez em quando e quando ia era diferente. Algo estava faltando nele.

Foi então que lembrou de seus livros e, num ímpeto sugestivo, sentiu a vontade de ler suas anotações, reencontrá-los, tentar retomar quem era. Sua consciência o cobrava. Ele queria voltar, só se via preso nas dificuldades burocráticas e na desilusão de sonhos dados errados. É o que acontece muitas vezes com pessoas que querem fazer algo bem grande e, com o otimismo lá em cima, achando que tudo vai dar certo, tomba ao descobrir que precisa de muito mais esforço para conseguir algo. As coisas nunca são tão fáceis e aconteceu com ele como se diz no ditado: quanto mais alto está, maior a queda. Seria mais fácil se tivesse mais o pé no chão e fizesse pouco a pouco a sua obra. Fogo de palha se acaba rápido. Mas com ele não seria assim, nem com muitas dessas pessoas mencionadas. Uma brasa sempre queimava em seu coração e ele queria fazer esse fogo se alastrar. Ele queria.

Procurou seus livros, deu-se com a situação já contada e descobriu seu novo amor: Luciana e mais outro: o escritor Paulo Coelho. Leu praticamente todos os livros dele e releu todas as partes importantes de seus livros antigos, reacendendo o fogo do conhecimento já adquirido. Comprou os livros que não tinha achado e os releu, remarcando-os. Ficou empolgado novamente e tentou postar algo em sua página. Os ânimos estavam inflamados e ele praticava seus ótimos argumentos. Procurou começar uns projetos em Taguatinga, chegou a ir nas ruas falar com o pessoal de rua depois de estudar sobre como poderia ajudá-los em Brasília, mas novamente foi vencido e não continuou. Largou aos poucos até não se interessar mais por nada disso, não por enquanto. Aceitou ou pelo menos se convenceu que precisaria de mais recursos para realmente ajudar. Queria poder ajudar efetivamente, não apenas com paliativos.

A HISTÓRIA DE UM OUTRO ALGUÉMOnde histórias criam vida. Descubra agora