I - Olhos azuis

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Ela estava na primeira cadeira da fileira da janela. Parecia que seus pensamentos vagavam em outro lugar. Confesso que os devaneios da professora Jones, sobre o último livro de romance em sua lista de leitura, não eram atrativos. Eu mordia incessantemente a tampa da caneta, uma tentativa falha de conter a ansiedade. Apoiei meu rosto na palma de minha mão, deixando que minha cabeça ficasse despreocupadamente inclinada, observando-a. Seus lábios tinham uma suave coloração avermelhada. Seus olhos eram pertencentes de um tom de azul tão profundo e claro quanto o céu azul de um verão ensolarado. Ela colocou uma mecha de seu cabelo, que tinha um tom de azul desbotado, atrás da orelha. Vestia roupas largas, para seu corpo magro e pequeno, com cores neutras. Eu nunca havia a visto antes, nessa aula ou na escola. Meu coração acelerou assim que sua cabeça se virou para trás, olhando por cima do ombro. Seus olhos encontraram os meus, foi aí que eu notei que todos estavam me encarando. Pigarreei e olhei completamente desnorteada para Jones, que sorriu amigavelmente.

-Querida, está tudo bem? - Ela tinha um tom suave e doce de voz. Engoli em seco, era nítido a minha feição de desespero e confusão. - Acampamento... Poderia... - Indagou, como se me desse uma dica do que estava ao meu redor. 

-A claro... - Um estalo em meu cérebro me fez voltar a realidade, jogando-me para fora dos devaneios com a garota nova. Me levantei e caminhei até à frente, algo que normalmente não me causava angustia, mas uma sensação incomum estava a me perturbar. Eu estava sentindo meu coração acelerado, minhas mãos começarem a suar. Um incomodo terrível havia se instalado no interior do meu estomago. Eu não tinha o menor problema em falar em público, mas uma vergonha absurda havia me tomado. Com toda certeza meu rosto estava tão vermelho quanto um tomate.

-Você está corada, está tudo bem? - Jones falou próxima a mim, para que eu fosse a única a escutar. Pisquei algumas vezes e sorri de lado, tentando arranjar uma resposta plausível para tal acontecimento.

-Posso estar com febre. - Menti, olhando para baixo logo em seguida. - Eu consegui a autorização para o acampamento da nossa turma, com a do senhor Collins... - Engoli em seco, sentindo todo meu corpo se aquecer. - Quem ainda não pegou a autorização comigo, por favor, pegue no final da aula... Tem que trazer assinada até semana que vem... - Toda a classe começou a aplaudir, vibrando. Olhei de canto para ela, que ainda encarava o exterior do prédio com uma nítida expressão de desinteresse.

-Vai ser incrível. - Jones exclamou, completamente empolgada. Seria um acampamento direcionado para artes. Todos estavam ansiosos e esperando por esse acampamento. - A presidente estudantil de vocês é simplesmente incrível. - Jones sorriu, encarando-me cheia de alegria. Seu sorriso formava rugas de felicidade no canto de seus olhos esverdeados. Voltei para meu lugar, sorrindo fracamente para todos que falavam algo para mim, mas eu estava distante. Mal consegui prestar atenção no restante da aula. Comecei a escrever alguns versos desconexos em meu caderno, que com toda certeza iriam para o lixo mais tarde.





Parecia que eu havia entrado em órbita. Ouvi alguns estalos e uma mão passando rapidamente frente ao meu rosto. Pisquei algumas vezes e finalmente voltei para meu corpo. Era Becca Martinez. Ela estava com um sorriso provocativo nos lábios, em meu mundo imaginário Becca era a vilã indesejável. Ela era bem alta e magra. Seu cabelo batia quase na cintura, em um tom escuro de vermelho. Seus lábios eram bem finos, mas realçados com um gloss de maça verde. Seus olhos castanhos pareciam sempre afiados e prontos para me detonar. Ela usava uma calça extremamente justa, com uma blusa rosa bebê que aparecia seu umbigo e o piercing pendurado nele.

-As autorizações? - Ela disse como se fosse óbvio. - Nossa presidente parece distante hoje. - Ela cruzou os braços abaixo dos seios e olhou para as amigas atrás dela, que riram perversamente. Elas pareciam cópias melhoradas de Becca. Uma fila havia se formado atrás delas.

O azul dos teus olhos  (Billie Eilish)Onde histórias criam vida. Descubra agora