Primeira Vista

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Eu já estava entediado naquele lugar. Eu tinha 17 anos e precisava fazer algo pela minha vida e pela vida dos meus pais. Eu sempre fiz meus “corres” para ajudar em casa, pois a renda dos meus pais adotivos mal dava pra abastecer a nossa dispensa. Sim, eu era adotado. Minha mãe adotiva nunca escondeu isso de mim. Eu não gostava de pensar na minha mãe biológica e nem no motivo pelo qual uma pessoa coloca um filho no mundo para entregá-lo a outro alguém. Que amor maternal é esse? Graças a Deus, eu nunca senti falta desse amor, porque os meus pais foram escolhidos a dedo por Deus e eu não poderia ter uma mãe melhor do que a Maria. Meus pais nunca me deixaram faltar nada, principalmente, amor e eu sinto que preciso retribuí-los de alguma forma.
Minha mãe é uma das pessoas mais engraçadas que eu conheço, ela é deficiente auditiva e tem uma língua afiadíssima. Na verdade, mamãe só escuta o que ela quer, essa é a realidade. Fato que a torna ainda mais hilária. Às vezes, eu fico só observando mamãe parecendo uma doida andando de um lado para outro dentro de casa, com uma touca amarrada na cabeça, reclamando de tudo o tempo Inteiro e a imagino em um daqueles episódios de programas comédia tipo “Sai de Baixo”. Já meu pai, Virgílio, é o ser humano mais tranquilo que existe no planeta. Sério, tem horas que a calmaria de papai me irrita, tudo para ele está sempre uma maravilha. Se depender de papai, nós vamos viver aqui a vida toda, nessa casa e nesse lugar. Eu não me julgo por querer algo melhor pra mim e para eles. Minha Vila nem rua asfaltada tem. Penedo fica localizada no cu de Alagoas, é um lugar muito bonito, mas pouco conhecido pelas pessoas. Um dia, eu gostaria de ter a chance de mostrar ao mundo a magia desse lugar. Não dá pra eu crescer e ser o que eu quero se eu permanecer aqui. Eu preciso ir embora para algum lugar onde as coisas realmente acontecem, talvez São Paulo ou Rio de Janeiro...
Eu fico imaginando como seria a minha vida se um dia eu fosse um cara rico e famoso. Eu tenho tantas idéias, tantos sonhos, mas sinto que falta alguma coisa em mim para conseguir realizá-los. Como é possível eu sentir falta de algo que eu nem sei o que é? Será que estou endoidando? Cada dia que passa esses pensamentos estão ficando cada vez mais fortes, principalmente, depois que rolou aquele beijo com o tal do Rodrigo/Ricardo naquela festa da semana passada. É como se uma onda magnética estivesse me atraindo para o desconhecido, para um lugar que eu não faço idéia de onde fica.
Eu sinto no meu coração que preciso encontrar essa peça que está faltando na minha vida, mas como é que vou encontrar algo que eu nem sei o que estou procurando? O pior é que eu sinto essa onda magnética cada vez mais perto de mim e não sei o que fazer. Definitivamente, eu só posso estar endoidando mesmo.
- Ele é muito, muito gato, Jesus! Alguém me explica de qual museu saiu aquela obra de arte? - Bruna, irmã do meu amigo, entrou se abanando na Lan House do meu tio junto com a Gracyelle, minha amiga. Eu estava no computador, verificando os recados do meu Orkut para passar o tempo e perdido em meus próprios pensamentos, por isso, nem dei muita importância para a chegada das meninas. E também, não estava nem um pouco afim de ser incluído em mais um daqueles papos chatos de garotas.
- Estou sabendo que ele estuda naquele colégio particular que fica na rua de cima da Vila, deve ser o maior Playboyzinho… - falou Gracy num tom casual.
- Eu acho que estou apaixonada... - Bruna suspirou e eu revirei os olhos. Ela sempre estava afim de alguém. .-- Desencana amiga, ele joga bola com os meninos e já estou sabendo que é o maior galinha do pedaço.
- Isso porque ele não me conhece ainda, deixa aquele peixe cair na minha rede que você vai ver… - respondeu ela, toda convencida.
- Ei, vocês vieram mesmo até aqui só pra falar de outro cara?
- Não precisa ficar com ciúmes Carlinhos, meu amor, você sabe que sempre terá um lugarzinho especial no meu coração pra você. - brincou Gracy, me mandando uma piscadinha. Ela era uma das meninas mais bonitas da cidade e uma das minhas melhores amigas. Todos os caras arrastavam um caminhão por ela. Nós já havíamos ficado umas duas ou três vezes em algumas das festas que rolaram na vila, mas não passava disso. A gente sabia que o lance entre a gente era só amizade mesmo. Eu adorava a Gracyelle.
- Sei… - levantei da cadeira e caminhei para a porta da Lan House para analisar o movimento. Não sei por quê, mas a animação da Bruna ao falar do cara da outra escola, começou a me dar certa irritação. Desde quando eu sentia ciúmes da Bruna? Eu hein? Eu nunca nem fui afim dela…
Com raiva, peguei uma goma de mascar do bolso, coloquei na boca e cruzei os braços, acompanhando o fluxo de pessoas que iam e vinham de um lado para outro na rua.
- E ai, viado! Mudou de profissão e tá fazendo ponto na loja do seu tio, agora? - não precisei olhar para o lado para saber que aquela risada debochada e aquela voz irritante era de Roninho. -- Não, estou esperando sua mãe mesmo. - respondi na lata, o fazendo o rir ainda mais. -- Cara, você é muito idiota!
- Ah e você é legal pra caralho, olho de peixe… - brinquei com ironia.
- Ow macho, vai rolar uma festança na casa de um brother na sexta, tá afim de colar lá? Tô sabendo que vai ser uma daquelas bombásticas… - eu abri a boca para responder Roninho, quando de repente, o mundo parou de girar na minha frente e eu me vi completamente sem voz.

Para Todo Sempre CarluOnde histórias criam vida. Descubra agora