Papo de Amigo

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-Vaza Roninho, eu preciso usar isso aí! - falo empurrando o meu amigo do computador dele.
- Carlinhos você é folgado pra caralho, Velho. Minha casa não é Lan House!
- Ah não enche, zóio de peixe! Se você quer que eu arrume mulher pra você, vai ter que deixar eu usar o meu MSN. - minto. Na verdade, eu queria usar o MSN para outra coisa. Coloquei meu status “Ausente” como sempre e fiquei lá esperando. Eu só gostava de deixar ausente para ostentar meu nariz empinado mesmo, fingir ser algo que eu não era. Eu podia não ter um real no bolso, mas a pose de "dono do pedaço" eu não perdia nunca.
- Você anda tão estranho Carlinhos…
- Eu?
-  Sim. Está avoado, sorri sozinho… Quem é ela hein?
- Ela quem, doido?
- A garota que você está apaixonado. - Roninho era tão inconveniente.
- Você acha mesmo que eu vou te contar pra você correr atrás dela e tentar furar meu olho? - Roninho era cheio dessas. Adorava pegar as minas que a gente estava saindo, só pra ficar se gabando depois. Quase nunca dava certo, mas ele sempre tentava.
- Está com medo da concorrência?
- Pode ter certeza que eu me garanto, zóião. - respondo olhando para a tela do computador outra vez. Lucas ficou online. Cronometrei um minuto no relógio, antes de mandar uma mensagem cumprimentando-o. Não queria parecer tão desesperado.
“Oi”
Eu coloco no enviar e a resposta vem ligeira.
“E aí cara, beleza?”
“Beleza e você?”
“De boa também…”
“Vai pra casa dos seus parentes no interior nesse fds?”
“Nao sei ainda…”
“Vai rolar uma festa lá na Lapera, vamos?” - ele demorou tanto tempo pra responder que eu achei que já tivesse desconectado.
“Ok. Te vejo lá.”
“Fechou.” - eu não podia conter o meu sorriso. Fazia três meses que eu e o Lucas estávamos conversando pelo MSN. Pessoalmente, a gente se falava bem pouco, mas era nítido que estava rolando um clima entre nós. Por diversas vezes, peguei Lucas me encarando quando estávamos entre amigos. Assim que eu flagrava seu olhar, ele abaixava a cabeça para disfarçar. Eu ainda o via como algo platônico. As coisas entre nós caminhavam a passos de tartaruga. Resolvi mandar uma indiretinha no meu status do MSN escrevendo um trecho da música dos Travessos, “Por que você não larga de bobeira e vem me dar um beijo… ;-)”
- Já chega Carlinhos, seu tempo acabou. - diz Roninho apertando o botão pra desligar o computador. Olho pra ele, furioso.
- Maricagem, Roninho, Porra! Eu estava conversando, filho da puta…
- O computador é meu e a casa é minha, sai fora!
- Um dia você vai me pagar por tudo isso, escreve o que estou te dizendo cara…
- Ah vá se embora, rapaz! - Roninho me expulsa de sua casa e eu nem consigo me despedir de Lucas. Pelo menos íamos nos ver no final de semana.
Entrei em casa e encontro Paulo na cozinha conversando com mamãe.
- E aí? - chego, cumprimentando-os.
- Esse menino vai acabar morando na rua… - esbraveja mamãe cheia de veneno.
- Eita que ela tá daquele jeito hoje… - peguei uma banana na fruteira e olhei pra Paulo. Estava mais do que na hora de eu ter aquela conversa com ele. - Chega aí mano, preciso falar com você. - Paulo se levanta e caminha comigo até meu quarto.
- Diga… - fecho a porta e respiro fundo.
- Eu quero falar sobre o Lucas.
- O que exatamente?
- Eu estou afim dele.
- Qual a novidade?
- Eu acho que sou gay. - indago sério e Paulo gargalha logo em seguida.
- Ow, estou falando sério. O que eu faço agora?
- Dá o brioco?
- Paulo! - repreendo-o.
_- Desculpa amigo, é que você foi um tanto óbvio agora nesse questionamento…
- Eu estou ferrado...
- Amigo, o quanto você está afim do Lucas?
- Como nunca estive afim de ninguém antes.
- E ele?
- Não corresponde, é platônico. - digo com pesar e Paulo abre um sorriso sacana pra mim. - O que foi?
- Amigo, não acho que seja tão platônico assim…
- Como assim?
- Desde aquele dia da festa do Vitor quando vi você secando o Lucas, que eu venho observando vocês dois e confesso que nunca vi algo parecido na vida.
- O quê?
- O Lucas têm ficado com todas as meninas de Penedo nos últimos meses e parece estar o tempo inteiro tentando provar algo para as pessoas que ele não é…
- Tá. E o que isso tem a ver comigo?
- Como o que isso tem a ver com você Carlinhos? Tem TUDO a ver com contigo. Você nunca reparou como ele fica nervoso quando você está por perto? - as palavras de Paulo estavam mexendo com a minha cabeça. Eu já tinha percebido isso, mas não queria criar expectativas…
- Ele me disse outro dia que se fosse gay, eu seria sua única opção.
- Eu acho que não deve estar sendo nada fácil pra ele aceitar isso…
- E o que eu devo fazer?
- Acho que deve ir com calma e respeitar o tempo dele…
- Você acha mesmo cara?
- Com certeza. E você, como se sente em relação a isso?
- Não sei se foi assim com você quando se deu conta que era gay. Mas, já chorei tanto irmão… Eu precisava falar com alguém senão ia sufocar.
- Eu sei bem. Eu ia virar padre, esqueceu?
- Cara, é muito doido isso. Eu queria ter a opção de desencanar do Lucas, me apaixonar de novo por alguma garota, mas não dá. Eu durmo e acordo pensando naquele cara. Eu não queria estar condenado a viver no pecado. Eu não quero ser uma aberração, nem motivo de piadas em Penedo.
- Sabe Carlinhos, eu pensei muito sobre isso antes de largar a batina… Eu não sei nem se um dia terei coragem de me assumir pra minha mãe, mas eu sei que Deus não colocou a gente no mundo para ser infeliz. Independente de qualquer coisa, todo mundo merece conquistar a felicidade. Não dá pra viver a base do que a sociedade impõe pra gente como padrão do que é certo e errado. Nós temos que estar sempre com nosso coração em Deus e ele irá nos abençoar seja qual for as nossas escolhas. - eu já estava chorando de novo. - Carlinhos, assim como Lucas, você também precisa se aceitar antes de correr atrás do que quer… - Paulo me puxou para um abraço e nos ombros dele, chorei feito uma criança. Por um lado me sentia aliviado em ter me aberto com meu melhor amigo. Mas por outro, meu coração continuava apertado por não saber quanto tempo mais eu teria que esperar para que a felicidade desse uma chance pra mim. A felicidade no caso, tinha nome e sobrenome, Lucas Guimarães.

Para Todo Sempre CarluOnde histórias criam vida. Descubra agora