Capítulo 28

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Ygor estava parado me encarando, era uma figura medonha: aquela máscara, quase dava para escutar o som abafado de sua respiração, o animal morto em uma mão e o sangue fresco naquele cutelo medonho. Toda a cena horripilante não me impressionou tanto quanto um detalhe sutil, o suor.

O suor que escorria pela testa dele em direção aos olhos, qualquer pessoa normal no mínimo piscaria, ele não. Aquilo corria diretamente por sua pupila em direção ao queixo, contudo ele mantinha os olhos focados em mim.

— Eu encontrei as garotas no porão! Acabou pra você, cara! — Nunca segurei tão forte aquela arma.

Ygor não se movia.

Calado ele continuava me encarando, minha mão coçava para atirar naquela testa, na época pensei que era o medo causado por aquela casa sinistra, misturado com a raiva de ver garotas naquele porão grotesco.

Não era o medo, era um aviso. Nosso corpo, nossos sentidos mais primitivos, tudo alerta quando você tem a possibilidade de eliminar o perigo, é claro que, toda nossa criação e civilidade funcionam como freio nessas horas: atirar em um homem desarmado e parado é errado, a cartilha diz que devo rendê-lo, levá-lo as autoridades competentes.

— Ygor! A polícia vai chegar a qualquer momento.

Não estava mentindo, mandei uma mensagem para Eleonor afirmando que estava com Ygor, "peguei ele!", escrevi. Era um código para minha esposa chamar a polícia. Isso evidentemente não seria rápido, chegar naquele maldito local era complicado.

— Fala alguma coisa, cretino! — Gritei.

O imenso sujeito soltou a lontra morta no chão. Com a mão sutilmente apontou para máscara, sem fazer nenhum movimento brusco, era o jeito dele de pedir autorização para fazer um deslocamento sem que eu atirasse.

Balancei a cabeça concordando com o pedido, ele fez o movimento que removeu a máscara e limpou um pouco do suor. Jogou o acessório facial no chão, acredito que nem ele podia muito tempo com o cheiro do mangue.

A face dele estava mais humana sem aquela estranha máscara, entretanto a feição séria, me encarando sem piscar, permaneceu a mesma. Ele destacou os dedos indicador e médio e os levou em direção aos lábios.

— Merda! Não se mova ou atiro, Ygor!

Com os dedos parados nos lábios ele abriu um sorriso, em seguida fez o assobio mais alto que já escutei em toda minha vida. Isso me fez levantar a arma na altura dos olhos dele, tinha a testa do maldito bem na minha mira.

— Que droga foi essa, Ygor? Você chamou alguém? Não estou brincando, qualquer movimento e eu atiro.

Sem esboçar reação alguma ele permaneceu me encarando, durante alguns segundos apenas o silêncio e o som dos pássaros dominavam o lugar, até que escutei um som de latido. O som vindo da mata ficava mais alto a cada segundo.

— O que você fez?

O som crescia.

— Cara, eu não tô mentindo, vou atirar.

O latido se aproximava, até que percebo correndo em minha direção um cão imenso, Rottweiler, babando e com um ar furioso, o cão alemão corria na minha direção para me atacar, para me estraçalhar e devorar.

— Manda ele parar, Ygor! Juro que vou atirar.

Ygor simplesmente sorriu com desdém e manteve os olhos focados em minha arma.

— Droga, cara! Vou atirar nos dois então.

Isso seria difícil, o cachorro vinha de outra direção: eu tinha duas alternativas: atirar em Ygor ou acertar no animal sedento que estava prestes a me atacar.

A Sociedade de Porto Izmael (Mistério/Policial/Aventura)Onde histórias criam vida. Descubra agora