Queria-lhe contar um segredo sussurrado no seu ouvido nesse minuto que acabou agora de passar. Eu queria seguir com você o seu caminho naquela hora que passou e eu não fui.
Queria marcar na pele o seu toque naquele momento que eu não lhe toquei, e recolhi a minha mão no minuto em que virava para me dizer sobre o clima.
Estivesse a chover granitos, eu não saberia dizer-lhe.
Para mim, estávamos naquele grau inexistente, trancados em nós.
Queria ter-lhe contado mais sobre umas coisas todas que eu nunca digo, mas falou e eu não interrompi. Queria ter grudado nos seus calçados e seguido o seu caminho porque eu não sabia para aonde ir.
Queria perguntar-lhe para aonde ir, se eu devo ir, igual àquela música que nunca ouviu.
Queria ter cantado-lhe aquele álbum todo que iria odiar. Queria mostrar-lhe a coletânea que jamais ouviria, mas já é completamente sua na minha cabeça. Quando senti você aproximando-se queria ter-me virado e dito algo que não responderia?
Eu queria um texto menos repetitivo, mas não saberia ajudar-me. Queria ter lido qualquer coisa dessas que eu escrevo-lhe, mas não leva nada disso a sério.
Eu também não.
Queria contar-lhe do seu cheiro que não ficou grudado na minha mão depois daquela despedida.
E recontar todos os fios de cabelos presos na minha blusa que eu não lavei por motivos óbvios e doentios. Chorar as minhas dores todas nos seus ombros de algodão.
Abraçar o seu peito de plástico.
Cheirar o seu cabelo de mentira. Deitar no seu colo de pedra. Queria suplicar-lhe para existir em todas as dimensões possíveis e impossíveis, ver-lhe desenhado em 2D, 3D ou qualquer outra em que fosse possível alcançar a sua mão.
Queria dizer-lhe que esse texto é um presente que eu nunca embrulhei, mas rasgou o pacote todo antes da entrega.
Roubou as minhas palavras antes que eu abrisse a boca.
Interpretou o texto ainda não escrito. Derrubou as muralhas invisíveis que construí e roubou a torre.
Achou pedaços de mim e refez o meu bordado de retalhos à sua mão e vontade.
E eu queria muito lhe dizer que eu gosto da forma como os tons de verde se misturam com o castanho nas colinas de mim.
