Banheira

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Bruce ajudou o filho a caminhar até o banheiro. Segurou-o pelas mãos como se faz com as crianças pequenas que ainda não sabem andar sozinhas.

Quando chegaram suficientemente perto da banheira ele ajudou Damian a se sentar e, com o mais absoluto cuidado, começou a retirar a tala. Quando terminou, analisou a perna do filho passando a ponta dos dedos pelas cicatrizes...

Onde antes havia o tecido rasgado, com músculo e a ponta de um osso exposto, agora haviam apenas as marcas cicatrizadas. A recuperação foi rápida e de maneira surpreendente, o que não fazia com que aquela imagem horrível fosse simplesmente apagada da memória do mais velho.

— Não dói... — Damian falou em tom baixo, fazendo com que o pai acordasse dos devaneios.

— Não sente nem mesmo um incomodo?

— Nada! — O mais novo sorriu, só fazendo com que o pai ficasse ainda mais estupefato. Bruce não queria que o filho sentisse dor, mas a ausência dela também poderia ser preocupante em vários aspectos.

— Filho, sentiu alguma dor depois que acordou? — Ele perguntou escondendo toda a preocupação que sentia. Aproveitou a distração para começar a tirar o pijama do mesmo enquanto a banheira enchia – Alfred havia o alertado da "timidez extrema" que a criança vinha apresentando.

— Só aqui... — ele colocou a mão sobre o ouvido esquerdo — Incomoda bastante, porque parece ter alguma coisa lá dentro.

— Que tipo de coisa?

— Algum animal pequenininho que fica zumbindo — Damian desviou o olhar — ... As vezes dói muito, tanto que dá vontade de... — subitamente, ele se calou — Deixa pra lá, não é nada demais. Aposto que eu já senti coisas piores antes, só não lembro! — Sorriu, tentando desconversar.

— Filho... — Bruce se abaixou de frente a ele — Estamos todos muito preocupados com você. Não importa se já sentiu algo pior antes, eu quero que me diga o que sente. Preciso saber para poder cuidar de você, está bem? — Ele sorriu, tentando encorajar a criança. Porém, quebrando todas as expectativas, Damian o respondeu com uma pergunta peculiar:

— Promete não me achar estranho?

— Prometo.

— ... Dá vontade de bater minha cabeça em algum lugar com força o suficiente para ela quebrar, só para eu conseguir enfiar meus dedos lá dentro e arrancar esse inseto que fica zumbindo o tempo inteiro. Mas não posso fazer isso, não deu certo quando eu tentei.

Um silêncio visceral se instalou.

Damian encarava o nada.

Bruce o encarava com uma onda de temor percorrendo todo o corpo. Mesmo assim, ele tentou não demonstrar todo o espanto e terminou de tirar as roupas do filho, o ajudando a entrar na banheira depois – aquele silêncio durou o suficiente para que ela terminasse de encher.

— Como...? — Bruce precisou repensar as palavras e reformular a frase até ter certeza absoluta de como indagar: — Filho, como você tem tanta certeza que fez algo desse tipo e que não deu certo?

Damian piscou algumas vezes, custou até conseguir encarar o pai novamente. Ele mexeu no cabelo, onde todos tinham mania de mexer, e então respondeu:

— A cicatriz... — murmurou, passando a ponta dos dedos sobre ela — Acho que eu tentei fazer isso e não deu certo — disse em um tom quase desesperado, com os olhos cheios de lagrimas — Eu sei que já me senti pior, mas eu não quero continuar com esse zumbido e tentar fazer alguma coisa de novo, pai!

Bruce o abraçou.

Damian começou a chorar como quando havia acordado depois de um pesadelo. Estava com medo da própria imaginação — era uma criança, afinal de contas. Uma criança cujo pai não sabia o que era pior: deixar sofrer com a própria imaginação ou com a verdade de que alguém, que não se sabe quem, fez aquilo.

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