Tom não brincou quando disse que se ausentaria. Acho que seu trabalho deve se intensificar mais agora que a pandemia se foi e ele tem gravações atrasadas. Ele demorou para retornar mais do que havia prometido.
“Estou na cidade"
Foi a mensagem que ele enviou na quinta à noite.
"Bem-vindo de volta. Como vocês estão?" — Eu respondi, pensando em Koul também.
"Com saudades"
Não tive resposta para essa mensagem. Eu também estava com saudade, mas não me entregaria assim, de bandeja. Ele é um ator lindíssimo, bem sucedido, cobiçado e com a carreira em ascensão. Eu não sou ninguém.
Sem falar que corro o risco de perder meu intercâmbio. Desliguei o celular e fui dormir.
Mrs. Thomas parecia mais que feliz com a aproximação de Tom. Ela passou a lhe preparar biscoitos low-carb todas as manhãs.
Aquilo não tinha gosto de nada!— Bom dia, Alana. Dormiu bem? — Tom parecia quase ofendido quando perguntou.
— Dormi, sim. Obrigada.
— Fiquei aguardando uma resposta ontem.
— Bom, eu não recebi nenhuma pergunta— Respondi. Ele não me dobraria fácil assim.
— Estará livre esta tarde?
Pensei em responder que não, mas Mrs. Thomas interveio.
— Ora, Tom. Com exceção de você, ela não tem ninguém mais com quem sair ou conversar. Claro que estará livre.
— Então me espere. Virei buscá-la após o almoço. Até mais, Mrs. Thomas.
E saiu sem esperar minha resposta.
Eram quase quatro da tarde quando bateram na minha porta e eu já sabia quem era.
— Boa tarde. Está pronta? — Ele parecia animado.
— Tenho alguma escolha?
— Vamos, ou chegaremos atrasados.
Eu estava com medo. Tudo ia muito bem e eu poderia entender tudo errado. Só eu sairia ferida.
Tom entrou pela porta de trás de um SUV e ele não estava vazio.
— Este é Frank. Ele nos ajuda nos dias mais corridos — Apontou para o motorista.
E continuou.
— Este é Rob, nosso fotógrafo e esta, nossa assessora, Karen.
Fiquei muito sem jeito e me senti intimidada pela equipe de Tom.
— Prazer em conhecê-los. Eu sou Alana.
— Finalmente temos uma mascote, Tom! Bem-vinda, Alana! — Frank disse já ligando o motor e saindo.
— Ela não é nenhuma mascote, Frank. Esqueceu do Koul?
Woof!
Todos riram.
— Mas você não é Inglesa, senhorita Alana. Posso perguntar de onde é? — A assessora indagou.
— Oh, por favor, só Alana — Eu disse sem jeito.
Eles eram da realeza ou o quê?Mas Tom foi mais rápido.
— Alana é brasileira, Karen. Ela está fazendo intercâmbio. Na verdade, vocês poderiam trocar figurinhas. Alana já trabalhou com assessoria e é formada na área.
— Maravilha! — Disse Karen apertando minha mão.
— Para onde estamos indo? — Eu desconhecia o caminho que tomamos.
— Ah, preciso cumprir um compromisso de trabalho em uma academia e pensei que você gostaria de me estrangular em um piscar de olhos.
O encarei assustada. Eu não lembrava de nada dos meus dez meses de judô.
— Ah, eu não ousaria entrar num dojô* sem kimono — Talvez minha desculpa me salvasse da humilhação futura.
Mas Tom colocou um pacote em meu colo.
— Não encontrei nenhum tamanho infantil, mas este deve servir.
O maldito me comprou um kimono.
— Obrigada...? — Respondi, ciente de que todos apenas assistiam nossa interação.
Quando chegamos, Karen gravou uma conversa entre o dono da academia e Tom. Eles acertaram detalhes do texto que iria ser publicado. Rob já fotografava os dois e Tom pediu que eles voltassem ao final do treino.
Tom nos conseguiu um tatame privado.
— Troque de roupa, vou esperá-la aqui.
Precisei dobrar a manga e amarrar a calça bem na cintura. Não fiquei nada atraente nisto.
— Tem certeza que você é adulta? — Tom segurou o riso ao me ver.
— Você quer mesmo morrer — Lhe disse e pisei no tatame, saudando-o.
— Vejam só, ela lembra a saudação**.
Esse inglês não tinha mesmo amor a vida.
— Vamos, mostre-me o que sabe — Ele preparou a guarda de joelhos, acho que prevendo minha queda. Afinal, se ele me derrubasse em pé, me desintegraria ali mesmo.
— Hoje eu te ensino uma lição — Falei, puxando-o para a frente. Ele caiu por cima de mim.
— Muito bom! — Me parabenizou — E agora?
— Eu não lembro — Admiti corando.
Não interessava se essas imobilizações eram com um parceiro feminino ou masculino, eu sempre ficava sem jeito. Daí, não memorizei nada por conta disso.
— Mas eu sim.
E rolou, me colocando em cima dele.
*Dojô: espaço acolchoado onde se pratica lutas marciais.
**Saudação: gesto de respeito que se faz antes de entrar e sair do tatame e diante do oponente, como um cumprimento.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Mr. White, Mr. Right
RomanceOs clichês de filmes românticos acontecem quando menos se espera. Quem imaginaria que um intercâmbio em um mundo pós-pandemia renderia a Alana os melhores e piores momentos de sua vida? O destino - que as vezes usa pessoas e, nesse caso em especial...