Trinta e Seis

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Deu apenas uma olhada rápida para o marido. Ele estava limpando os dedos numa camiseta e não foi difícil entender o motivo, afinal ele não havia lhe avisado sobre o que pretendia fazer, era um pouco óbvio que o sujaria, já que não tinha se preparado. No entanto, isso não lhe incomodava de qualquer forma, sempre encarou esses pequenos "acidentes" com naturalidade.

Sentou na cama lentamente, o coração tão apertado no peito, mais parecia que estava sendo prensado num torno de tão dolorido que o sentia.

A pergunta gentil do mais velho continuou sem resposta por um longo momento, enquanto tentava dissolver o bolo emocional que pressionava sua garganta para trazer sua voz de volta.

— Nunca mais faz isso.

Sua voz saiu mais baixa do que esperava, rouca e triste. Não conseguiu encarar o homem, não porque estivesse tentando esconder suas emoções novamente, na verdade não queria ver  as que deviam estar brilhando nos olhos claros, embora não fosse difícil de imaginar.

— Foi tão ruim assim? — questionou, a voz suave transparecendo a insegurança e o nervosismo.

Toni fechou os olhos, lembrando de todas as coisas que pensou naquela cama. As lembranças bobas de fantasias românticas da sua adolescência que nem lembrava mais que um dia teve. A maioria era sobre como Samuel tomaria aquele garoto franzino, sorridente e precoce nos braços e como um beijo os levaria por caminhos impulsivos e luxuriosos, totalmente hormonais, fariam sexo a tarde toda em vez de jogar videogame.

— Não, é que foi muito bom... mas mesmo assim, não toca em mim desse jeito de novo — falou, super consciente da presença do mais velho, mas ainda sem vontade de encará-lo.

— Amor, isso não faz nenhum sentido, você sabe não é? — argumentou, cautelosamente.

Toni levantou enfim, mesmo sem olhar para ele, podia sentir o quanto a apreensão estava crescendo e talvez estivesse começando a se sentir mal por isso. Quer dizer, foi a primeira vez que ele tentou algo assim não foi? Devia ser compreensivo certo? Sabia que sim, mas ao mesmo tempo se sentia ferido em algum lugar misterioso, talvez fosse seu ego, ou talvez sua autoestima, ou então tudo era coisa da sua imaginação.

— Eu vou ser honesto, porque eu não sei ser de outro jeito, beleza? — começou, pegando uma toalha e enrolando na cintura, obrigando seu cérebro a funcionar — Quando a pessoa que a gente gosta não sente desejo pela gente, é uma droga. A gente se sente mal pra caralho de verdade, mas quando essa pessoa "toca" a gente mesmo assim, é pior ainda.

Fez aspas com os dedos quando falou "toca", afinal era assim que Samuel falava sobre ser ativo e tinha um pouco de dolorido sarcasmo nisso e pareceu funcionar pois ele absorveu a mensagem.

— Mas eu pensei que era o que você queria...

O tom de justificava na voz dele era tão cruel. Toni o olhou enfim, Samuel estava tão nervoso que por um segundo, só por um segundo, Toni se sentiu um monstro, mas no menos instante afastou esses pensamentos, não se permitindo perder o norte. Talvez estivesse sendo injusto, talvez estivesse sendo desnecessariamente dramático com algo tão pequeno, mas as palavras apenas saiam da sua boca.

— Eu não quero a tua pena, nem que faça esse tipo de coisa porque acha que tem que fazer. É o meu corpo Samuel e tu fez eu me sentir mal com ele, só que eu já tive muito dessa merda, por muito tempo na minha vida e eu não vou deixar tu mexer com a minha auto estima desse jeito. Beleza?!

Foi categórico e determinante, não alterou a voz mais do que o necessário e isso foi uma vitória.

— O quê?

Samuel estava absolutamente atordoado e essa confusão dele o estressou, elevando a pressão na sua garganta, beirando a raiva, sua caneca estava latejando com a ideia de estar mais uma vez imerso numa dos enormes enigmas emocionais do marido.

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