Segredo de Família

Quarenta e cinco

Foram apenas três toques antes de ouvir a voz bonita, tinha um timbre ligeiramente rouco e natural.

— Olá, bom dia.

— Bom dia, tô falando com o Isaac? — perguntou, enquanto colocava sal na panela fervente.

— Sou eu, pode falar senhor Neves.

Toni estranhou o fato do homem saber quem era, afinal, era a primeira vez que falava com o advogado do marido.

— Tsc… como sabe que sou eu?

— Apenas três clientes tem esse contato, o senhor, o seu marido e outra pessoa… é meu número pessoal e eu tenho suas informações salvas, então… seu nome apareceu na tela.

— Ah tá, — exclamou, relaxando — saquei, só que tipo, tá errado, apaga e escreve Toni.

Isaac sorriu com suavidade na linha e isso também o fez sorrir involuntariamente, apenas um esticar de lábios silencioso.

— Considere feito e me desculpe, o Samuel me alertou sobre como você prefere dispensar essas formalidades, mas isso já faz alguns anos então a informação me fugiu a memória por um momento.

Toni afastou o smartphone da orelha e encarou o aparelho por um segundo. Parecia que estava falando com outra versão do marido.

— Hã?

— Em que posso ser útil, Toni? — simplificou, sorrindo outra vez e isso o fez pensar, ou Isaac era muito alegre ou estava de bom-humor.

— Não é nada de mais não, só que me lembrei que Samy pediu pra te ligar se alguém da academia tentasse entrar em contato comigo, então… tipo, tô ligando.

— Como ocorreu essa tentativa de contato? — incentivou, totalmente profissional.

Toni franziu a testa e levou um momento para processar a pergunta.

— Cauã tá me mandando mensagem há dias, me ligou várias vezes e semana passada foi uma das meninas da recepção. — contou, imprensado o smartphone entre a orelha e o ombro para ter as mãos livres e poder medir o arroz antes de colocar na panela.

— Ele reagiu mais rápido do que pensei. Você respondeu algumas dessas mensagens ou atendeu a ligação.

— Ah tipo, eu falei com a Fernanda, a garota da recepção, somos amigos e eu não tinha porque não atender ela, mas só que… não era ela de verdade, não, tipo era ela, eu falei com ela rapidão, mas foi estranho e dava pra ouvir a voz do Cauã no fundo e… sei lá cara, foi esquisito.

— O quê ela disse exatamente?

— Nada de mais não, só perguntou como eu estava, tipo, não era segredo que eu não tava legal na academia há um tempo, inclusive alguns colegas mais chegados já vieram aqui em casa e tal. Mas o que pegou pra mim é que ela tava estranha, tava nervosa e depois eu ouvi a voz dele mandando ela me convencer a ir até lá, eu só desliguei.

— Está assediando outros funcionários então…

Aquilo foi nitidamente um pensamento dito em voz baixa, quase sussurrada e só provava que Isaac não o conhecia. Depois de conviver anos com Samuel, estava treinado em captar os murmúrios mais baixos, porque Samuel falava baixo, mas não só por isso, seu marido soltava aqueles resmungos e frases reflexivas e eram as palavras mais honestas que ele soltava.

— Você apagou seu registro de chamadas?

— Não, ué, porque apagaria?

— Algumas pessoas tem esse hábito, mas já que você não apagou, pode me enviar? As mensagens também e o contato da Fernanda.