Samuel não estava na área destinada aos fumantes, o encontrou escorado numa parede no estacionamento do prédio, um cigarro preso entre os lábios enquanto observava a chuva.
À medida que se aproximou do marido, sua mente tentava encontrar uma forma de dizer a ele que teriam que voltar mais tarde. Seu corpo ficou tenso, seu coração acelerado, quando finalmente parou na frente do homem, ele tirou o cigarro da boca e mostrou um sorriso simples e cansado, porém sincero, apenas um esticar de lábios.
Toni até abriu a boca, mas na primeira tentativa nenhuma palavra saiu, então voltou a fechar e Samuel ergueu uma das sobrancelhas.
O mais velho havia aprendido a simular as emoções, sabia interpretar reações de acordo com as circunstâncias e situações em que estivesse envolvido, era um excelente observador e tinha uma dedução lógica incrível. Claro que isso foi uma necessidade, devido a sua limitada capacidade de expressar as próprias emoções corretamente. Fosse qual fosse o motivo o fato era que ele havia treinado por anos com terapeuta, por tanto mentir e manipular não era uma opção, pois verdade seja dita, essa nunca foi uma característica sua.
Sua única ideia promissora, foi dizer a verdade e apostou todas as fichas nela, talvez com um pouco de sorte conseguisse convencer o homem. Quando contou o arranjo que fez com o médico, a expressão leve no rosto do músico,foi desaparecendo e por fim ele abaixou a cabeça e permaneceu quieto por um momento absorvendo suas palavras.
— Nós fizemos um acordo, que você não está respeitando.
Essa foi a primeira coisa que ele disse e Toni sentiu um nó se formando na sua garganta.
— Qual é Samy, por favor, só essa vez.
Samuel passou a mão na testa por um momento, os dedos tremendo ligeiramente.
— Foi o que você disse semana retrasada, e meia hora atrás e está dizendo agora, de novo! Sempre é "só essa vez"! — reclamou, realmente aborrecido.
— Esse médico é bom de verdade! Tá legal?! Não vai ser como antes! — insistiu, o tom suplicante na voz.
— Como você sabe?! Você não conhece ele! Você só esbarrou com ele por acaso! — acusou.
— Porra, mô! É o dono de um centro de referência em ortopedia e reumatologia! Ele deve ser bom para caralho!
Samuel abaixou a mão levando-a direto para o bolso da calça. Balançou a cabeça num sinal negativo, mas era como se estivesse falando consigo mesmo.
Toni não estava pronto para desistir ainda, não depois de ter conseguido a consulta mais promissora da vida do marido. Avançou dois passos, cobrindo o espaço que os separava e pousou em ambas as mãos nos ombros do músico.
— Samy, olha pra mim, cara, por favor, só olha pra mim. — pediu, tentando soar o mais doce possível enquanto o homem parecia arredio e permanecia de cabeça baixa.
Poucas vezes viu Samuel tão resistente, exceto na primeira e única vez que quase o perdeu, anos atrás. Samuel entrou no quarto no exato momento em que estava rolando na cama com o ex. Obviamente foi apenas uma brincadeira a toa comum entre amigos, porém não foi assim que seu marido interpretou. Naquela época estavam juntos há poucos dias, foi assustador ver Samuel saindo pela porta e ficar sem notícias por horas.
Quando finalmente o encontrou, ele estava tão arredio, assim como agora, ele não olhava nos seus olhos, os lábios finos estavam trêmulos e ele visivelmente tentava erguer muralhas ao seu redor com desespero e afinco.
O mais velho tentou se afastar, se esquivou do seu toque e deu um passo para trás. No entanto, o mais novo não podia se render, puxou o marido para os seus braços e o envolveu, num abraço não apenas para acalmá-lo, mas porque ele mesmo também precisava de amparo.
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Segredo de Família
RomansaOito anos se passaram, Samuel, Toni e Luz acabaram formando uma família como qualquer outra. A menina que antes idolatrava o irmão mais velho se revolta, no auge da adolescência, quando Samuel se recusa a falar sobre, Mauro, o pai biológico da irmã...