Capítulo Um

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— Você não vai — respondeu calmamente, sem nem tirar os olhos do caderno onde anotava alguma coisa.

— Mas isso não é justo! — esbravejou, já possuída pela raiva, o rosto chegava a ficar vermelho.

— Não estou interessado em saber o seu julgamento sobre minhas decisões, eu disse que você não vai. Aquela zona da cidade é perigosa, não é lugar para uma menina de quatorze anos frequentar tão tarde da noite.

— VOCÊ ESTÁ SENDO O MAIOR BABACA PRECONCEITUOSO!

Samuel suspirou, cansado daquelas brigas, estava se tornando cada vez mais frequente, se recostou na cadeira almofadada e finalmente encarou a irmã, sem esconder como estava aborrecido.

— Faça o favor de baixar seu tom de voz para falar comigo, porque eu não estou gritando com você, estamos apenas conversando — respondia sempre do alto da sua tranquilidade, sem jamais se mostrar hostil com a moça.

De repente Luz mudou de postura, veio dando a volta na escrivaninha e seu atirou nos seus pés, no nível máximo de drama, fazendo biquinho e tudo, segurando nos joelhos do irmão mais velho.

— Por favor, por favorzinho com açúcar, mel e leite condensado maninho lindo do meu coração! Eu não posso simplesmente não comparecer, faz ideia de quem vai estar nesta festa? Só a escola toda! Fora os meninos super hiper mega gatos, vai ter cada tesão de garoto nessa festa que você não faz ideia! Eu tenho que ir se não eu morro! Eu juro Samy! Por favor! Eu prometo que lavo a louça da janta todo dia, ai você e o paizão vão ter mais tempo para fo...

— Luz! — repreendeu seriamente pela primeira vez imediatamente a menina se calou e até cobriu a boca com a mão, percebendo o que tinha falado.

Samuel fechou os olhos e inspirou ar para os pulmões, até entortou a cabeça para o lado, como se alongando o pescoço e soprou ar para fora, seu tom era ligeiramente mais severo agora, do tipo que deixava evidente que não estava negociando.

— Em primeiro lugar, me respeita. Em segundo lugar, fazer tarefas da casa não é mais do que sua obrigação. Em terceiro lugar, mas não menos importante, você não vai a uma festa na zona da cidade, nem que coloque todo açúcar do mundo no meio da conversa — encerrou a conversa.

Luz abriu a boca ligeiramente ofendida, então se levantou de supetão.

— Eu juro que se não me deixar ir eu fico sem falar com você pelo resto da minha vida! — ameaçou, sibilando baixo, enrugando os lábios e estreitando os olhos.

Samuel encarou o rosto severo da adolescente, era impossível não perceber a gritante semelhança que a irmã tinha com a falecida mãe, especialmente quando fazia aquela careta furiosa.

— Só vai ter dois trabalhos minha princesa. Um de parar de falar comigo e o outro de voltar a falar depois. A decisão é toda sua, seja como for, você não vai nessa festa — reforçou, voltando a sua atenção para o caderno outra vez.

Luz gritou, simplesmente gritou furiosa, foi empurrando todos os papéis cuidadosamente arrumados na escrivaninha direto para o chão, espalhando-os de forma histérica. Samuel apenas ergueu as sobrancelhas, vendo todo seu trabalho de dias espalhado no estúdio.

— EU TE ODEIO! ODEIO COM TODAS AS MINHAS FORÇA! — esbravejou.

— É a terceira vez que você diz isso esse mês, eu ouvi perfeitamente das duas primeiras, tenha certeza disso — argumentou, levantado da cadeira.

— Arg! IDIOTA!

Samuel se limitou a dar a volta na mesa e se ajoelhou no chão, começou a recolher seus papéis, Luz bufou uma última vez, mas quando foi se virar para a porta, ela se abriu. Toni chegava, com a bolsa preta enorme num dos ombros, era quase uma pequena mala.

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