Trinta e dois

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— Na lei isto é estupro por ato libidinoso mediante constrangimento e agressão. Mas ele não foi condenado por isso, no final.

— Porque não! Que caralho que faltou pra esse filho da puta… — se calou ao perceber que falou muito alto e algumas pessoais olhavam, mas ainda deu um murro na mesa, tentando se conter.

— Provas — resumiu com desgosto, tomando mais um gole de café.

— Mas que… porra! Mano! Ele foi preso em flagrante ou não?! — exaltou-se, furioso.

— Foi flagrante. Ele pegou doze anos por tortura.

— Só isso?!

Otávio acenou afirmativamente.

— O que eu entendi é que faltou o depoimento do Samuel, acusando o Mauro. Ele não estava em condições de falar, ele estava muito atordoado e a Tia Violeta foi decisiva nessa briga, porque assim que o nome dela começou a surgir, ela desapareceu, isso foi uns três dias depois do flagrante. O Samuel era menor de idade e era necessário autorização do responsável para o exame de conjunção carnal e ela não tinha certeza que ele não tinha sido abusado. Eu acredito que ela optou por sumir das vistas porque não queria produzir provas contra  marido dela. Mais tarde ela voltou, mas a minha mãe já tinha sido comunicada do caso e entrou na briga pela guarda do Samuel é não deixou mais ela se aproximar dele.

Otávio fez uma pausa e bebeu mais um gole do café.

— Até onde sei eles nem chegaram a tirar a roupa ou qualquer coisa assim, foi uma tentativa de estupro, então obviamente o exame deu negativo. Na minha opinião, com roupa ou sem roupa, não faz diferença, o estrago já estava feito, para qualquer vítima, mas o meu primo... ele já não tava bem, talvez ele nunca tenha estado bem. Você precisa entender uma coisa, o estupro acontece aqui em primeiro lugar. — falou, encostando a ponta do dedo na própria testa — Em algum momento entre a primeira agressão e a perna quebrada, ele entendeu o que o padrasto dele ia fazer. Ele era um garoto de dezessete anos, soma isso com aquela situação que ele vivia,  apenas entender a intenção do Mauro, foi o bastante para ele se sentir agredido sexualmente, mesmo sem o contato físico... íntimo... acontecer de verdade.

Era evidente que Otávio estava evitando palavras mais fortes e chulas ao falar do caso.

"Ele não fez nada de verdade, foi o jeito que ele me puxou pelo pé e abriu as minhas pernas, eu não consigo esqueci isso"

Toni tinha lágrimas nos olhos e o seu coração apertado como nunca antes. As palavras sussurradas por Samuel estavam girando num looping infinito na sua mente.

Otávio fez uma pausa e bebeu mais um gole da bebida amarga, lhe dando tempo para pensar um pouco.

— Olha Antônio, eu sei que você teve umas experiências ruins aí e que nunca deixou isso te abater, você é um cara forte e eu não tô falando só fisicamente, tô falando da mente — começou claramente se referindo ao acampamento da escola, anos atrás — Mas para o meu primo sempre vai ser como se tivessem roubado algo dele, mesmo que ele nem perceba, porque aquela merda foi a primeira experiência sexual do Samuel. Tenta entender o que eu quero dizer, normalmente os garotos pensam em sexo toda hora, ele com certeza pensava também com dezessete anos, mas tô falando de uma coisa concreta.  Ele entendeu que ia ser estuprado, ele visualizou na cabeça dele… a coisa toda e essa foi a primeira vez que ele viu o sexo como algo real. Não foi nuns amassos com uma garota da escola, não foi com uma namorada da faculdade.

"Eu não gosto de lembrar daquele dia e esses treinos..."

Ele estava chorando quando disse isso, se lembrava perfeitamente. De repente estava se sentindo mal por ter pressionado Samuel todo aquele tempo para treinar. Ao mesmo tempo, uma vontade animalesca e selvagem brilhava no seu interior, queria ter chance de ter o padrasto do marido nas suas mãos. Era um desejo violento e primitivo, desejo de machucar, de bater e quebrar, ficava sem ar só de imaginar.

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