Quarenta e três

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— Eu sinto muito que você tenha passado por isso. A dispensa discriminatória é horrível. Eu acho que você pode e DEVE se inteirar sobre seus direitos, mas eu não estou aqui para debater as implicações legais dessa situação, isso você trata com o advogado, eu estou aqui para falar sobre você. Eu quero saber como você está.

Apesar do jeito calmo como ela falava, Toni ainda se perguntava o que estava fazendo ali. Falar sobre seu recente desemprego parecia tão sem propósito.

— Normal… tipo não é a primeira vez que isso acontece e provavelmente não vai ser a última — falou com desânimo.

— Você já foi demitido por causa da sua sexualidade antes?

Toni sorriu impaciente, seus pés estavam inquietos, sentado na cadeira abriu mais as pernas, numa pose mais largada, afundando as mãos nos bolsos da calça de malha.

— Não foi o que eu quis dizer — retrucou, a mente ainda nebulosa é pressionada.

O pouco caso que fazia da situação não estava passando tão despercebido quando imaginou que seria.

— E o que você quis dizer?

— Mano do céu! A gente não pode falar dessa merda toda na semana que vem? — protestou, esfregou o rosto cheio de frustração.

— Foi você que veio até aqui, não quer conversar sobre o que aconteceu?

— Eu não vim até aqui, o César me trouxe, é diferente! — defendeu-se, sem entender porque exatamente parecia tão importante dizer isso.

— Sim, depois que você ligou para ele num momento de crise e isso também é algo que devemos conversar.

— O quê? Por quê? — estranhou, um pouco mais exaltado do que normalmente estaria, os nervos ainda a flor da pele.

— Ele é seu ex-marido.

— Não, somos amigos — corrigiu.

— Sabe, eu nunca tinha associado o nome à pessoa, desde que falamos sobre seu ex-marido e como ele afeta seu relacionamento atual, eu sentia que eu não estava tendo uma visão ampla o bastante da situação, mas agora que eu sei quem de fato é o famoso César,  acho que comecei a compreender a raiz de muitos conflitos do seu casamento que você me relatou.

— E daí? Era pra eu entender alguma coisa?

— Esse não é um tema para tratarmos aqui, agora, neste instante, isso precisa ser trabalhado com mais tranquilidade e você não está tranquilo agora. Vamos focar nos fatos, no que aconteceu hoje e no motivo pelo qual você está tentando não externar a dor que essa situação causou em você.

Toni riu, mas era um riso nervoso, estressado.

— Mas que porra… não tem o que dizer não,é o que é, eu fui demitido porqie sou gay — desabafou, quase reclamando.

Acabou fechando os olhos e respirando fundo, mesmo diante do olhar atento da terapeuta e ela aguardou em silêncio por alguns minutos, ponderando as opções.

— Tudo bem, você não está à vontade para falar sobre ainda, se você preferir podemos falar sobre o seu marido. Você teve um momento ruim, certo? Porquê você não ligou para ele? Não pediu ajuda à ele ao invés de chamar um amigo.

Sobre o que haviam acabado de discutir, não havia nenhum tipo de tom irônico ou sarcástico na voz dela ao se referir ao enfermeiro com o seu amigo, em apenas aceitou de bom grado.

— Samy nunca me viu assim… tão fora de controle e o César já, ele já me tirou de muita roubada.

—  Você acha que o Samuel ficaria com medo de você?

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