Setenta e um

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Samuel estava sentado na cama, os cabelos totalmente arrepiados iam em todas as direções, os olhos fechados não escondiam as olheiras e o rosto pálido e apático deixava o cansaço evidente. Aquela foi uma longa noite, na qual o homem mal dormiu e não exatamente pelo motivo que gostaria. Aquela febre misteriosa voltou de madrugada e com ela a dor lombar veio também, mais forte do que antes e o homem não teve qualquer chance de descansar de verdade..

Foi até lá, pegou o controle da central de ar e desligou o aparelho, devolveu o controle para a mesa de cabeceira e tocou a testa dele. Ainda estava tão quente.

— Tomou alguma coisa? —  perguntou.

O músico acenou negativamente, sem abrir os olhos ou fazer qualquer outros movimentos. 

— Toma um banho, vai te ajudar a se sentir melhor —  aconselhou.

Ele continuou imóvel e inexpressivo, por um momento até pensou que ele estava lhe ignorando de propósito, mas não queria se render a esses pensamentos.  A verdade é que ainda estava abalado depois de magoar o marido de forma brutal, mesmo que tenham feito sexo no chão da cozinha como se fosse o último dia de suas vidas, não havia sido perdoado pela quebra de confiança e nem sabia se um dia seria. Provavelmente Samuel nem estava pensando na última briga, ele estava dolorido e fragilizado, havia Elvis e o teste de DNA, mas era a incerteza que estava doendo por dentro e lhe deixando super sensível a cada pequeno gesto do homem.

— Pode pegar minha bengala, por favor — pediu, a voz rouca e sonolenta, ainda de olhos fechados.

Havia isso também, as dores no joelho em dias frios. A moça do tempo havia anunciado a previsão de sábado como um dia nublado com probabilidade de pancadas de chuva no período da tarde. Isso era bem comum, na região, um dia mais úmido depois de semanas de sol ardente. No entanto, assim que abriu os olhos pela manhã, pode ouvir claramente o som ruidoso do temporal que caía lá fora.

Gostava de dias chuvosos, normalmente ficavam deitados no sofá, comendo besteiras e assistindo programas sensacionalistas da tv aberta e se estivessem bem de verdade, até podiam acabar fazendo amor ali mesmo e no fim da tarde cozinhavam alguma coisa juntos. Era perfeito e desejava do fundo do seu coração que pudessem fazer todas essas coisas.

— Tá doendo muito? — perguntou, entregando a bengala que pegou no canto do quarto.

O homem apenas acenou afirmativamente e respirou fundo, estendeu a outra mão, pedindo mais apoio e obviamente atendeu. Samuel levantou lentamente, o peso corporal equilibrado apenas na perna esquerda, pois o outro pé apenas se apoiava no chão. Primeiro ele suspirou uma ou duas vezes, houve aquela careta de desconforto, depois se encostou no seu corpo, deitando a cabeça no seu ombro e apoiando parte do peso assim e naturalmente o acolheu, sentindo a temperatura elevada e a respiração lenta.

— Bom dia — murmurou depois de um longo momento, rouco e beijou sua bochecha num gesto sutil e sonolento.

Os passos dele foram mais lentos do que habitual, mesmo para os dias frios em que a artrose realmente o maltratava e isso fez crescer no seu peito um sentimento urgente e preocupado. Tentou lembrar os livros do falecido pai, talvez pudesse ter alguma ideia do que afligia o corpo do marido, mas já fazia tantos anos que a maioria daquelas informações havia se perdido na memória. Pensando nessas coisas começou a arrumar a cama, ou edredom branco com listras azuis e começou a dobrar, colocou em cima da poltrona, empilhou os travesseiros e ficou o lençol no colchão, já estava terminando quando voltou a ouvir a voz do marido.

— Toni! 

— Que foi?! — gritou de volta.

— Você pode ligar para o laboratório e solicitar que a coleta seja feita em domicílio?

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⏰ Última atualização: 5 days ago ⏰

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