Capítulo 4

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Pov. Aurora

— A sua mãe fez o quê? — perguntou Letícia novamente, indignada.

Contei a elas que, depois do que aconteceu na sexta, meus pais estavam mais atentos aos meus passos do que antes. Dona Clarice se ofereceu a ir me buscar no cursinho essa semana, e eu obviamente dei uma desculpa pra que isso não acontecesse de jeito nenhum! O meu pai estava me observando dentro de casa mesmo, como se estivesse aguardando a bomba explodir.

— Eles estão desconfiando, e com razão! —disse Babi. — Você está há dois anos mentindo, eu não sei como você não foi pega antes...

— Mentindo — resmunguei, como se fosse óbvio. — O que estou querendo dizer é que falta pouco pra acabar as aulas e eu vou falar tudo pra eles.

— Como você acha que eles vão reagir? — perguntou Leh, bebericando seu café.

— A minha vó pensa no pior, já a minha irmã acha que eles vão me expulsar de casa, e eu prefiro não imaginar! — Conclui. Por estar fora do meu horário de trabalho, as meninas e eu estávamos na mesa de sempre conversando sobre o assunto a mais de uma hora.

Senti o meu celular vibrar no bolso e o peguei rápido para ver se era algo importante. Visualizei um e-mail de Cinthia falando sobre um concurso. Bloqueio o celular novamente e voltei para a conversa. Percebi que as duas estavam mais discutindo do que conversando, pra variar, parecem cão e gato.

— O que aconteceu?

— A sua queridíssima amiga está saindo com o Gabriel! — respondeu Letícia, cruzando seus braços em seguida.

— De novo, Babi?!

— Gente, nós só vamos sair pra comer, qual o problema?

— Bárbara... O cara é um babaca!

— Essa é a visão de vocês, não a minha.

— Essa é a visão de todo mundo! — respondeu Letícia, com ar de deboche.

— Olha, eu não fico questionando quando vocês duas fazem péssimas escolhas, então me deixem em paz.

— Ela acabou de confirmar que foi uma péssima escolha ter aceitado o convite!

Nós gargalhamos com resposta, mas os sorrisos sumiram quando vimos quem tinha entrado na cafeteria. Gabriel e Felipe foram direto pra o balcão, nem se quer olharam para ver se o lugar estava cheio.

— Falando nele... — murmurou Leh, quase num sussurro. — Não morre mais.

— Acho que o Felipe está procurando um certo alguém! — disse Babi, analisando os dois no balcão. — Talvez, falando bem baixinho, eles não vão poder nos ouvir.

— Ah claro, por que somos invisíveis!

Soltei uma risada mais alto do que o planejado, chamando a atenção dos dois. Que ótimo. Eles caminharam calmamente em nossa direção, fazendo com que as meninas me fuzilassem com os olhos. Apenas murmurei um "desculpa" pra elas.

— Sabíamos que estariam aqui! — disse Gabriel sorridente, olhando diretamente para Babi.

— Sabiam nada! — exclamou Letícia.

— Vocês sempre vem aqui depois da faculdade!

— Ele está nos seguindo, isso é realmente preocupante! — O sarcasmo de Letícia já nos livrou de muitas conversas desnecessárias, essa era mais uma delas.

Cruzei meus braços e as pernas, esperando os dois discutirem, mas isso não aconteceu. Eles puxaram duas cadeiras e sentaram com a gente para esperar o pedidos deles. Letícia continuava me fuzilando com o olhar.

— Então, o Gabs vai sair com a Babi no sábado e eu acho que nós poderíamos ir juntos!

Olhei de relance para as duas e percebi que os quatro estavam aguardando a minha resposta. Sorri sem graça e neguei com a cabeça. Eu queria muitas coisas na minha vida e uma delas, com certeza, não era reviver a história com o meu ex.

— Posso saber por que não? — resmungou. Letícia o olhou incrédula e Babi chegou a engasgar com o café.

— E tem que ter um porquê?

— Tudo bem, então vamos convidar a próxima da lista.

Letícia abriu a boca para falar, mas desistiu de última hora. Seus olhos foram direcionados para a rua, enquanto seus dedos batiam num ritmo bem lento na mesa. Ela realmente estava se segurando para não falar boas verdades na cara dele.

O meu relacionamento com Felipe começou no final do Ensino Médio e durou cerca de um ano. Parecia pouco aos olhos dos outros, mas aquilo durou uma eternidade pra mim. Ele me traiu diversas vezes após entrar na faculdade, e ainda assim me cobrava tempo para estarmos juntos. Enquanto ele beijava outras bocas, a tonta aqui trabalhava e estudava no cursinho, ficando o dia inteiro fora de casa. Eu realmente não tinha tempo livre, mas era sempre muito complicado a outra parte da relação entender isso se não havia um diálogo entre nós.

Sofri muito naquela época, como se eu fosse a errada da situação. Demorei para entender que eu não tinha feito nada de errado para ter chegado onde chegou, mas isso não tirava toda a decepção e nervoso que passei. Era por isso que Letícia e eu não gostávamos do Gabriel; ele era uma versão duas vezes pior que Felipe e nós não queríamos que ela se machucasse como eu me machuquei. Aliás, eles só se conheceram mais profundamente depois que comecei a namorar com Felipe, então, de certa forma, eu me sentia um pouco culpada por ela ter se apegado demais — mesmo sabendo que isso não era culpa minha.

Amigas cuidam uma das outras, espero que ela entenda isso um dia.

Os dois saíram da cafeteria logo depois da fala de Felipe, que só faltou bater os pés até a porta. Letícia revirou os olhos e bufou em seguida, tentando controlar os nervos.

— Eu estava errada! — disse ela, pegando suas coisas e levantando da cadeira. Fizemos o mesmo.

— Sobre o quê?

— Competindo entre os dois, o Felipe ganha o título de mais babaca.

— Isso quer dizer que vocês vão parar de implicar com o Gabs?

Eu e Leh nos entreolhamos e voltamos a encara-la.

— Não!

— Ah, gente...

— A gente não fala por mal, Babi! — falei a consolando. — É que você merece alguém muito melhor.

— Nós três merecemos! — Enfatizou Letícia. — Talvez o relacionamento de vocês chegue a outro nível e acabe na mesma situação que a Aurora.

— Obrigada pela parte que me toca!

Subi no ônibus que ia até o metrô, mas estava sem pressa, já que hoje a aula começava às quatro da tarde.

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