Capítulo 11

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Pov. Bel

Depois de terminar a minha lição de História, voltei a arrumar minhas coisas para colocá-las nas caixas. Os meus pais não estavam em casa e vovó veio me ajudar nessa tarde, então eu poderia fazer algo livremente; algo que eu normalmente tinha que fazer as escondidas. Peguei a chave do quarto de Aurora — que meus pais esconderam dentro de um dos vasos da sala — e corro pra abrir a porta. O quarto estava intacto, do jeito que ela deixou naquele dia que saiu de casa.

Ainda conseguia sentir o perfume dela.

Sentei na cama e observei as folhas da árvore em frente a casa dos nossos vizinhos balançarem. O frio estava começando a ficar insuportável em São Paulo e isso só me relembrava o quanto Aurora gostava desse clima. Por mais que fôssemos diferentes uma da outra, eu sentia uma ligação forte com ela; era algo que eu não conseguiria ter com outra pessoa.

— Você precisa parar de fazer isso antes que tome bronca — disse minha avó, entrando no quarto. — Sente falta dela, não é?

— Sinto! — respondi, deixando uma lágrima solitária escorrer pela minha bochecha. — Ela sempre cuidou de mim e meus pais nem valorizaram isso quando expulsaram ela de casa.

— Eles não a expulsaram, pediram para fazer uma escolha.

— Uma escolha que ela era obrigada a sair de casa, de que adianta? — Resmunguei. Minha avó sentou ao meu lado na cama e admirou a árvore também. — Desculpa, vó, mas é que eu não acho justo tudo o que aconteceu. Aurora sempre mereceu mais e sempre tomou pancada da vida... Ao menos o apoio dos pais ela deveria ter, não acha?

— O problema dos seus pais é que eles são orgulhosos demais.

— Eu sinceramente não sei como vai ser quando Aurora voltar.

Olho as caixas no corredor e tento criar coragem para começar a empacotar as coisas da minha irmã.

— Eles disseram o porquê de quererem guardar tudo? — perguntou.

— Não, apenas disseram que vamos viajar em breve e que eu deveria guardas as coisas dela — suspirei, indo pegar uma das caixas de papelão. — Você não sabe de nada mesmo?

— Queria saber para contar, mas eles não me disseram nada.

Escutei o meu celular tocar em meu bolso. Respirei fundo tentando espantar a voz de choro quando vi quem era.

— Olha só, você está viva! — Atendi Aurora.

— Você está cada dia mais piadista.

— Eu dou o meu melhor!

— E como estão as coisas aí? — Observo a bagunça que estava o seu quarto e olho desesperadamente para vovó. Ela fez mímica para que eu ficasse quieta. — Bel?

— Oi, desculpa! Deixei o celular cair. As coisas estão ótimas, muito bem animadas.

— Animadas?

— Isso não cola, não é? — Ri, tentando disfarçar meu nervosismo. — As coisas estão na mesma. Muitas brigas entre eles, vovó tentando ajudar...

— E a escola?

— Passei em inglês!

— Olha, uma boa notícia!

— Se você estivesse aqui, estaríamos organizando uma maratona de filmes pra comemorar.

— E quem disse que você não pode fazer isso com eles?

— Não é a mesma coisa... — Ela ficou em silêncio depois da minha fala. — Isso é uma tradição nossa.

— Ok, você venceu! Eu acho que mais tarde consigo assistir algo com você. Tudo bem?

— Perfeito! — falei com o sorriso na orelha. — E como estão as coisas aí?

— Já fiz amizades e o roteiro está quase encaminhado para o final, para a alegria do meu chefe.

— Fez amizade com o elenco? Porque isso é importante.

— Importante por quê?

— Pra você ser chamada para as festas e me convidar.

— O que é isso, Izabel? Interesse?

— Eu tô brincando! — Eu não estava não.— Mas é sério, você realmente fez amizades?

— Sim, por que está tão curiosa?

— Por que é bem capaz de você ficar no seu canto e não falar com ninguém, ou seja, ficar sozinha.

— Isso se chama timidez.

— Ah claro.

— Eles foram bem legais comigo e com Cinthia. Charlie viu que eu estava mal esses dias e me levou pra comer Donuts.

— Hum, então foi um encontro?

— Não, aquilo foi mais uma terapia.

— Aliás, falando em homens, o seu ex veio procurar você esses dias.

— Diz que você está brincando, por favor...

— Bem que eu gostaria. Ele me chamou de mentirosa, você acredita?

— Não acreditou em você quando falou sobre o Canadá?

— Não, e fez um escândalo na porta de casa para a diversão dos nossos vizinhos... — Resmunguei. Talvez fôssemos a fofoca do mês para as senhorinhas do segundo quarteirão. — Tenta falar com ele.

— Eu? Jamais! Aparentemente ele quer voltar comigo.

— E você quer?

— Bel, eu estou no Canadá! — Ela perdeu a paciência e bebeu água de sua garrafinha. — Ok, vamos mudar de assunto!

👻

Decidimos ver filmes totalmente aleatórios, e isso só acontecia quando não decidíamos um gênero só pra assistir, então gastávamos mais tempo discutindo do que vendo os filmes.
Liguei por Skype com ela e aproveitamos pra comentar várias partes dos filmes... Com a chamada de vídeo não parecia que ela estava fora por um mês.

— Agora eu preciso ir! — falei chateada.

— Podemos fazer isso mais vezes, então continue tirando boas notas!

— Você fala como se fosse fácil.

— Você sabe como tornar fácil!

— Odeio os seus trocadilhos.

— Eu também te amo! — sorriu.

Desliguei a chamada e fechei o notebook. O quarto automaticamente ficou escuro e um sentimento de vazio profundo me invadiu. Não era a mesma coisa porque ela deveria estar aqui. Larguei o aparelho em cima da minha cama e fui em direção ao corredor, encontrando o quarto de Aurora com as caixas empilhadas e sem os móveis.

Um vazio profundo.

Fiquei um tempo parada observando o cômodo lembrando dos post-it colados por toda parte e de seus livros sempre organizados na enorme estante marrom. E agora não tinha mais nada. Absolutamente nada.

Escutei ruídos no andar debaixo e me prontifiquei para trancar a porta do quarto; com certeza eram os meus pais. Suspirei olhando mais uma vez para a porta e voltei para o meu quarto escuro. Não estava preparada para deixar tudo para trás, eu não era forte como ela.

Mas, aparentemente, eu precisava ser.

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