capítulo 2 - Lembre de mim

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Carla

Enquanto dirigia até o hospital mais próximo, minha cabeça quase explodia de dor, da noite para o dia, percebo que estou grávida de um homem que nem sequer sabe como nos conhecemos e parece querer manter distância. Como explicarei para Catarina que o pai está doente? Terei que realizar as gravações do canal, sozinha? Tomás confiará em mim para ajudá-lo a recobrar a memória? Pensando bem, não é de todo ruim, posso excluir alguns acontecimentos turbulentos, certo?

Minutos depois, já estava sendo atendido, o Dr. Álvaro, neurologista, o submeteu a uma bateria de exames e depois de conferir os resultados nos reuniu com uma psicóloga. Más notícias virão.

— Com base nos exames e em tudo que foi relatado, o senhor Tomás Campos foi diagnosticado com amnésia retrógrada, visto que não consegue se recordar de nenhum evento passado ou presente com clareza. Causado possivelmente por estresse excessivo, sofrido recentemente.

Então neste caso, a culpa é minha....

— Mas, a memória dele voltará ao normal, algum dia? – Minha voz quase não saiu, eu estava tremendo.

— Sim, mas pode demorar entre 3 ou 6 meses, o que eu recomendo é que seu marido tire férias, faça atividades relaxantes e evite qualquer preocupação.

Ok, então eu acho que a solução é o divórcio.

— Existe alguma possibilidade de eu continuar assim pra sempre? – O tom de voz era aflito e baixo, seus ombros se encolheram.

O conheço bem o bastante para saber que está com medo.

— Não, se seguir minhas recomendações e além disso, sessões de terapia com a Poliana, você irá se recuperar mais rápido do que imagina. – O doutor tentou tranquiliza-lo, mas não adiantou muito bem, já que o vi revirar os olhos impaciente.

— Também prescrevi alguns remédios para dor de cabeça, qualquer problema, não hesitem em me contatar. Isso é tudo por enquanto, cuide-se, Sr.Tomás. – O doutor sorriu amigável.

Tomás não sorriu de volta, levantou e saiu da sala. Agradeci Alberto e fiz menção de segui-lo, mas Leila impediu-me alegando que seria melhor que ela conversasse com o filho. Concordei.

Fico esperando na recepção, quando um segurança vem até mim e me informou que a entrada do hospital e parte do estacionamento está cercado de jornalistas e fotógrafos. Era só o que faltava!

— O que foi? Por essa cara, querida? Sente-se bem? – Leila se aproxima e demonstrando preocupação.

— Estou bem, a imprensa descobriu que estamos aqui e a clínica está cercada.

— Quem famoso está aqui para chamar atenção dos jornalistas?

— Nós. Mesmo que não se lembre, você ainda é um cantor e compositor conhecido nacionalmente e em parte dos Estados Unidos. Cada passo nosso é importante para mídia.

— Nunca duvidei de que meu futuro estava na música. – Um sussurro e sorriso lhe escapou.

Ah se ele soubesse o quanto isso nos custou. É certo que se, nos últimos tempos não estivéssemos tão focados e esgotados de tanto trabalho. Provavelmente Tomás não estaria doente e com sorte, eu também não estaria grávida e nem Michelle.

Os seguranças nos escoltaram até o estacionamento nos mantendo o mais longe possível dos paparazzi. No curto caminho, percebi que fazia o máximo para ficar longe de mim e evitando até me olhar.

É estranho vê-lo assim inibido em minha presença. Não me surpreendo, se acabar decidindo ficar na casa da mãe por uns dias.

Abri a porta do carro. Sentei no banco do motorista, coloquei o cinto e destravei a do passageiro. Apenas balançou a cabeça negativamente.

— Não estou pronto pra voltar ao seu apto hoje, desculpa!

— Eu também acho que é melhor que ele passe a noite na minha casa, Querida! Está muito confuso e cansado.

— Tudo bem, quando sentir preparado é só me ligar ou aparecer. Você tem a chave. – Minha voz falhou.

— Prometo cuidar bem dele, fique tranquila. Diz pra Cat que a vovó está morrendo de saudade. – Leila garante.

Assinto no automático, fecho a porta e os vidros. Ligo o carro pisando no acelerador com certa força. Mudo o caminho que eu faria para ir ao on beat para a rota de volta para casa. Não estou em condições de trabalhar diante da situação atual.

Já dentro do elevador penso em como contar a Catarina que o pai está doente. Ela é muito apegada a ele e muito novinha para entender a gravidade do que está acontecendo.

Assim que eu entrei, Cat correu para meu colo. Estava uma gracinha vestindo seu vestido roxo com estampa de unicórnio favorito, os pés pequenos e gorduchos descalços. O rosto sujo com a minha maquiagem sorrindo deixando amostra seus quatro dentinhos da frente.

Beijei sua bochecha enquanto ela apertava meu pescoço.

— Desculpe, quando eu vi ela já tinha entrado no quarto e pego tudo na penteadeira. – Justificou Ana Clara.

— Tudo bem.

Durante a tarde, eu e a babá fizemos de tudo para distrair Cat: Fomos ao parquinho, teatro de fantoches, assamos biscoitos de cenoura e cacau, vimos desenhos e a hora da soneca acabou sendo tranquila porque ficou cansada com tantas atividades.

Lá pelas sete da noite, depois do jantar, estava penteando os cabelos dela e preparando para dormir quando perguntou:

— Cad o papa?

— O papai está com a vovó Leila, meu amor. – O que era verdade.

— Não gota mais Catarina? – Seus olhinhos se encheram de lágrimas. Eu quis chorar também.

— Ele te ama muito, princesa! É que o papai ficou doentinho e a vovó ficou cuidando dele, mas logo logo ele tá de volta, tá bem?

— Cat e mamã não pode cuidá papa? – Os lábios curvados denunciavam que ela ia chorar a qualquer minuto.

— Podemos sim e vamos, quando ele puder voltar pra casa. – Tentei sorrir para que ela soubesse que tudo ficará bem.

Aquela foi uma noite difícil para nós duas, contei todas as historinhas da sua estante de livros, coloquei todos os ursos dentro do berço, cantei, mas Catarina chorava desesperada querendo o colo de Tomás.

Pensei até em ligar para o celular dele para que a pequena, ao menos escutasse sua voz, entretanto, desisti no meio da chamada, aquela atitude poderia assustá-lo e afugentar qualquer possibilidade de aproximação entre nós. O que só pioraria a situação.

A solução foi leva-la para o meu quarto e esperar que fosse vencida pelo cansaço.

Eu também não dormi nada bem aquela noite e vi o dia clarear na janela.

As três noites seguintes foram iguais.

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