Dor. Um dia me disseram que sentir dor é bom e naquele dia eu não entendi como poderia algo tão incômodo ser bom e, quer saber? Eu ainda não entendo.
Minha cabeça está a ponto de explodir e eu ainda não achei nada que me agradasse. Bom, talvez eu tenha encontrado o presente de natal perfeito para Shawn mas ainda não encontrei o médico perfeito para obriga-lo a ir.
Descobrir que ele tem chances de recuperar a visão me fez ver o mundo com um colorido mais intenso nas últimas semanas.
Pensei em contar isso a Aali, mas achei melhor que ficasse apenas entre eu e meu cérebro que, no momento, está apanhando tanto que chego a poder ouvi-lo pedir socorro.
– Mila, vem jantar! - acho que essa é a quarta vez que mamãe me chama para comer.
Não é que eu não esteja com fome. Eu estou. Mas sinto que, se eu sair daqui vou perder a melhor oportunidade médica do século.
Ouvi uma batida na porta e murmurei um "pode entrar" para quem quer que estivesse do outro lado da porta.
Imaginei que fosse minha mãe, mas não havia gritos ou resmungos para que fosse ela. Também não podia ser meu pai, ele nunca bate à porta para entrar. Sofi deve estar presa à mesa de jantar então, fiquei momentaneamente me questionando sobre quem poderia ser até que ouvi sua voz grave e doce ao mesmo tempo soar em meus ouvidos.
– Onde você está? - sorri e, finalmente, desviei meus olhos da tela do meu notebook.
– Na escrivaninha, meu bem. O que faz aqui a essa hora?
– Sua mãe, vulgo minha sogra, estava levemente desesperada pelo fato de você não ter comido nada durante quase todo o dia e minha mãe, no caso sua sogra, me pediu para que eu viesse descobrir o que está acontecendo.
Suspirei. Acho que preciso dar uma pausa no meu projeto de procura.
– Eu estava em busca do presente perfeito de natal. - enlacei meus braços em seu pescoço e suas mãos foram diretamente para minha cintura.
– E eu posso receber um spoiler?
– Acho que não... - a verdade é que ele não iria gostar da minha brilhante ideia de presente. Não queria deixar ele triste agora.
– Sua mãe está preocupada. Acho que você está me escondendo alguma coisa, mas... como eu confio muito na namorada que eu tenho, não vou te pressionar. Acho que na hora certa você vai me dizer.
O abracei com mais força e ele retribuiu, ficamos assim por não sei quando tempo, até que vi a cabecinha de Sofia aparecer na porta. Sorri para ela.
– Mamãe pediu pra eu perguntar se... - a vi colocar o dedo indicador na bochecha em sinal de pensamento. Sofi tinha a mania de querer passar os recados com as mesmas palavras que dizíamos a ela. Era fofo mas ela raramente conseguia. – A sim! Se, agora que Shawn está aqui você nos da a honra de jantar.
– Ela vai sim, Sofi. Vá descendo que nós já estaremos na mesa para jantar. - ela assentiu e saiu do quarto descendo as escadas.
– Bom, imagino que esteja com fome... aliás, não vai me dizer mesmo o que tenho pesquisa nesse computador? Você está preocupada com a faculdade?
– Não, não estou preocupada com a faculdade, acho que só me perdi em sites de compras...
– Tudo bem, estava pensando... acha que Sofi iria gostar de um cachorrinho? Porque eu não faço ideia do que agradaria minha pequenina cunhada. - riu de maneira divertida e eu o acompanhei.
– Sofi iria amar, minha mar não tenho certeza, mas quem liga?
– Você tem razão!
Ao longe ouvi minha mãe gritar nossos nomes avisando que não nos esperaria mais e, rapidamente, descemos.
É estranha a maneira como eu sou totalmente admirada por minha mãe, ela sempre usou da psicologia reversa pra me fazer cumprir o que ela queria e, mesmo que eu saiba desse truque, caio como um patinho todas as vezes.
Chegar na sala de jantar e ver dona Sinu mexendo uma panela de estrogonofe não foi surpresa alguma pra mim mas, mesmo assim, me senti levemente revoltada e besta por cair, mais uma vez, na história do "o jantar está na mesa, não vamos te esperar".
•°•°•°•°•°•
Já estava tarde e, mesmo assim, eu e Shawn permaneciamos nos jardins do fundo da minha casa.
– Eu sei que você não quer mexer nisso mas... - senti seu corpo ficar tenso. Ele já imaginava qual era o assunto da vez.
– Meu amor, eu - o cortei.
– Deixa eu tentar te convencer primeiro? - ouvi o seu suspiro e ele acenou positivamente com a cabeça.
– Você ja me disse inúmeras vezes que tinha muita vontade de me ver, de ver Aali e muitas outras coisas no mundo... eu só queria ter certeza de que há a chance do seu sonho se realizar! Poxa, me deixa tentar?! - ele suspirou.
– Não é que eu não queira voltar a ver. Eu só não quero te decepcionar caso não dê certo. Eu não quero me decepcionar, nem a Aali ou aos meus pais. Eu sei que todo mundo sonha com o dia que eu vou, milagrosamente, acordar, abrir meus olhos e ver tudo o que há de mais belo e mais horrível nesse mundo mas... - sua voz se tornou quase um sussurro. – Eu tenho medo, Mila. Eu tenho medo da decepção.
Silêncio
– Além do mais. É quase natal, Aali teve uma melhora drástica e está prestes a completar nove anos de idade. Não quero que, agora que tudo parece estar ficando bem, eu venha e traga mais um problema, mais uma preocupação.
Me virei de frente para ele e, como de costume, beijei seus olhos.
– Tudo bem, eu encerro minhas pesquisas por aqui. Prometo, seu presente não será uma consulta médica ao oftalmologista. - rimos e ele me abraçou.
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Paixão às Cegas.
Fanfiction- Eu nunca quis tanto ver alguém como quero ver você. Se ao menos tivesse te conhecido antes de tudo isso... - Não se preocupe, nós vamos dar um jeito nisso tudo! Dou a minha palavra.