SHAWN

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O coro de parabéns pra você soou em meus ouvidos dentro da imensa sala de casa.

É estranho pensar que há alguns anos atrás eu colocava Aali para dormir com musicas infantis fofas e calmas e, hoje, ela está completando dezoito anos de vida. O tempo passa tão rápido que eu quase não sou capaz de perceber os anos que se eu já vivi.

Esse ano a família toda resolveu se reunir para o natal. Acho que isso tem algo relacionado com os dezoito anos de Aali mas nada está confirmado ainda. Só sei que mamãe está muito feliz em receber toda a família em casa.

– E aí, Shawn. Como vai a vida acadêmica? - meu primo Emett sempre foi o mais querido da minha família. Tudo se intensificou um pouco mais quando ele entrou para a faculdade de direito.

– Melhor que eu imaginei, primo. E o escritório? - eu demorei um pouco para dar início na faculdade. Não achei nada que eu realmente tenha gostado, então papai me ajudou a abrir minha agência fotografica e, hoje, eu comando uma equipe de três fotógrafos. Fazer administração foi só um comodismo a mais.

– Estamos bem também. Cara, fiquei muito feliz com a notícia do casamento. - sorri. Pedir Camila em casamento não foi uma decisão nada difícil de tomar, mas demorei pra colocar minha decisão em prática. Não por medo. Eu só queria ter tudo pronto antes.

–Você não faz ideia do quanto EU fiquei feliz. - rimos, eu e Emett sempre fomos bons competidores mas sempre fotos muito amigos também. No fundo, todos sabem que nosso ciúmes por atenção é apenas uma maneira de implicância infantil.

– E onde ela está? Ainda não tive o prazer de conhecer a mais nova integrante da família. - Emett foi o único que não pode vir para o natal, houve algum problema jurídico que o impediu ou algo assim.

– Ela precisou atender uma cliente mas já deve estar chegando para o almoço.

– Pensei que tudo estaria fechado essa semana.

– E está, mas Karla gosta muito dessa paciente e não conseguiu recusar ajuda... eu disse que ela precisava descansar um pouco também mas quem sou eu, não é mesmo? - Emett riu.

– Não acredito que você já está sendo mandando a esse nível. Não consegue fazer nem ao menos com que ela pare de trabalhar por um dia... esperava mais de você, priminho. - revirei os olhos e soltou um riso anasalado.

– Sempre achei isso estranho. - franzi o cenho como uma clara resposta de não entendimento. – Você ser deficiente visual e seus olhos se comportarem como os de alguém com visão perfeita me assusta. - precisei rir. Vejamos que ele não é tão inteligente em todas as áreas do conhecimento.

– Eu posso não ver hoje, mas um dia eu já vi e sei o que revirar os olhos significa. Além do mais, meus olhos acompanharem os sons é apenas um reflexo. Nada demais.

Senti um beijo em minha bochecha seguido de um abraço apertado.

– Demorei?

– Só um pouquinho, meus primos já cantaram parabéns pra Aali umas quatro vezes. Eles disseram que como são dezoito anos são precisos dezoito parabéns. - ela gargalhou.

– Que indelicadeza a minha. - moveu um de seus braços que estavam em meu entorno ao que eu imagino ser a direção em que meu primo está. – Sou Camila.

– Sou Emett. Por um momento pensei que você fosse a noiva do meu primo. - Pelo silêncio que se instalou tive a certeza de que Camila o encarava com confusão. – Falei besteira, primo? - não contive a gargalhada.

– Eu disse a ele que você se chama Karla. - me dirigi a ela. – Eu sabia que você não iria se apresentar como Karla e sabia que ele seria inconveniente para perguntar se era mesmo você. - ela me deu um leve tapa

– Parabéns, primo, por um momento pensei que o caminho estivesse livre pra mim.

– Bom, pelo menos você pode olhar. - ri junto com ele antes de sair com Camila para uma parte menos barulhenta do quintal.

– Não gostei da piada... - sua voz era calma, no entanto, verdadeira e imposta.

– Não quis dizer que ele pode cobiçar vo - ela me calou antes que eu terminasse meu argumento de defesa.

– Não! Eu sei que não. Eu entendi exatamente o que você quis dizer. Não gosto quando você fala assim de você mesmo. Acho cruel e deprimente.

– Meu bem. Eu prometo tentar me conter mas... essa foi a forma que eu achei para conseguir lidar com meu problema e - fui interrompido mais uma vez.

– Viu?! Quer dizer, sentiu?! É por falas como essa que eu digo que você deveria procurar um especialista, meu amor. Se não um oftalmo para tentar reverter a situação um psicólogo para - dessa vez eu a atropelei.

– Não tente me analisar, Camila. Eu estou bem, não estou deprimido e muito menos me sinto inferior por não poder enxergar. Na verdade, acho que vejo o mundo por outros olhos. Não vou mentir pra você, eu adoraria poder te ver e constatar que eu vou me casar com a mulher mais bonita que esse mundo já viu mas... concorda comigo que é arriscado?

– Você nem se quer cogitou a possibilidade de pesquisar, amor. Não quero te chatear, de verdade. Só quero te ver feliz. - colocado meus dedos em seus lábios eu a beijei. Beijei com carinho e calma tentando levar a ela a calma que ela parecia não ter no momento.

– Eu sou feliz só por ter você aqui. Por ter meus pais, pela minha irmã estar completando mais um ano de vida. Sou feliz por saber que vou me casar com você, sou feliz por poder comandar três fotógrafos incríveis. Sou feliz porque eu posso sonhar, Mila. Porque eu tenho o equipamento perfeito para tirar fotos sozinho. - não menti em momento algum, eu sou um dos, se não o mais, homens mais felizes desse mundo. –Não vou te dizer que sou feliz por ser cego mas, talvez, eu seja cego porque sou feliz.

– Eu só queria que, queria que você pudesse me ver. Que você pudesse ver nossa família se formando. - senti minha camisa molhar quando eu a trouxe para mais perto do meu peito. – Me desculpa por ser egoísta. Eu só... eu só queria poder mudar tudo isso e contar nossa história de superação em um livro incrível e comovente. - Camila sempre foi apaixonada pela leitura.

– E qual seria o nome do nosso livro?

– Não sei, alguma ideia? - pensei por alguns momentos e então sorri quando a ideia perfeita surgiu em minha mente.

– Que tal: Paixões às cegas?

– Mais a gente, impossível. - ela fungou e beijou meu peito enquanto eu fazia cafuné em seu cabelo.

Paixão às Cegas.Onde histórias criam vida. Descubra agora