CAMILA

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Eu sabia! Me senti imensamente feliz. Saber que eu estava certa o tempo todo fez com que eu sentisse que não falhei na minha primeira lição como mãe. É uma garotinha!

- Viu só?! Eu disse que seria. - Aali provocou o namorado.

- Eu aceito essa derrota. O próximo eu acerto! - ele riu. - O nome... Já está decidido?

Encarei Shawn, ele disse que queria fazer surpresa para Aali então, ele decidiria quando contar.

- Bom... - comprimiu os lábios. - Nós já decidimos sim. Vamos chama-lá de Alya.

Aaliyah soltou um grito curto e agudo.

- Eu não acredito que vocês escolherem o nome que eu sugeri. - seu sorriso era imenso, por um momento pensei que fosse rasgar suas bochechas.

- Bom, eu detesto isso mas... eu preciso ir, meu bem. - Gus anunciou. - Amanhã venho te buscar para a sessão. - beijou a bochecha dela e, com um breve aceno, se despediu de mim e de Shawn, saindo pela porta da sala.

Gus é um ótimo namorado. Perfeito para minha cunhada. Sinto que se ela pedisse a lua para ele, ele a conseguiria e daria dentro de um potinho bonito para ela.

Em momento nenhum ele aparenta estar desconfortável com a atual situação de Aali e a ajuda em tudo o que ela precisa. É ele quem a leva para as quimioterapias, ele não aceitou que ela fosse para o hospital com qualquer outra pessoa, nem mesmo com Karen.

Assim que a porta foi fechada Shawn se levantou indo em direção ao banheiro.

- Mila. - a voz de Aali saiu baixa. Mais baixa do que ela queria saísse. - Mila, eu queria saber se você raspa minha cabeça? - seus olhos deram uma marejada e ela se recusou a piscar e deixar a bendita lágrima cair.

- Claro. Fique aí, vou lá encima pegar a maquininha do Shawn. - ela concordou em um aceno com a cabeça e eu fui em direção ao quarto buscar a máquina.

Aaliyah é durona. Não a vi ou ouvi chorar nenhuma vez. É estranho porque todos nós sabemos que ela está sofrendo mas é como se ela não soubesse... vive sorrindo, contando piada e dando risada como sempre o fez. Se nessa vida existe alguém forte, esse alguém é Aaliyah.

Desci as escadas com a máquina de cortar cabelo em mãos. Puxei uma cadeira para longe do sofá e minha cunhada se sentou nela.

- Tem certeza que quer fazer isso? - ela virou o pescoço e me encarou com um olhar sério que, em menos de um minuto, se transformou em um olhar divertido e foi acompanhado de um sorriso brincalhão.

- Qual é, Mila?! Tá duvidado que eu vou ficar uma gata? Sinto muito, meu bem, mas eu fico maravilhosa até mesmo sem sobrancelhas. - gargalhou jogando a cabeça pra trás e eu a acompanhei.

- Ei! - reclamei arregalado os olhos logo em seguida. A menina me encarou com dúvida. - Acho que ela está querendo se mostrar pra você, titia. - passei a mão sobre minha barriga e os olhos de Aali caíram sobre ela.

- O meu Deus. Sério? - em menos de segundos suas duas mãos estavam encima do meu estômago.

- Não é aí. - ri direcionando sua mão um pouco mais para baixo.

- Meu Deus, isso é muito doido! É lindo. - uma lágrima rolou por sua bochecha e morreu em seu sorriso aberto.

- Você sentiu? É a primeira vez que alguém sente. Antes eramos apenas eu e ela. - seus olhos brilharam e um sorriso travesso cresceu em seus lábios.

- O Shawn vai ficar muito bravo com você, pinguinho de fé. - ela direcionou os lábios bem para onde suas mãos haviam parado. - Mal posso esperar pra fazer pirraça junto com você! Os melhores presentes serão os meus, pode ter certeza. - beijou ali e me encarou.

- Tem certeza que quer isso? - apontei para a máquina em minhas mãos.

- Se é pra fica careca, quero ficar careca do jeito certo. - riu. - O câncer não vai arrancar meu cabelo... você vai! - se sentou o mais reta que pode e inspirou profundamente.

Passei a máquina por sua cabeça a primeira vez e logo seu couro cabeludo começou a ficar mais aparente.

Olhei para o espelho que ficava ao lado local onde a cadeira de Aaliyah estava. Olhei em busca de uma lágrima, um olhar triste ou cabisbaixo e, nela, eu não encontrei absolutamente nada disso, no entanto, vi em minha bochecha o rastro da lágrima que insistiu em descer quando raspei a primeira mecha.

Em menos de dez minutos, já não havia mais nenhum fio de cabelo em sua cabeça e ela estava em frente ao espelho.

- Uau. - seu rosto não expressava emoção. Ela levou a mão quase que em câmera lenta até o alto da cabeça e alisou o local. - Não tem como eu ficar feia, né?! - não foi exatamente uma pergunta. - Olha bem pra mim, Mila. Eu estou linda! - ela virou bruscamente em minha direção. - Não. Não chore... minha intenção não era essa. Eu só queria... eu só não queria perder o meu cabelo de modo inevitável. Preferi tirar eu mesma a perdê-lo para a quimioterapia, então... por favor não chore!

- Quem está chorando? ‐ me dei conta de que Shawn estava no fim da escada apenas quando ouvi sua voz.

- Não é nada demais, não se preocupe. São apenas... hormônios e emoções.

- Se tem emoções, tem alguma coisa, meu bem. Aali, por que ela está chorando? - revirei os olhos com sua insistência.

- Não sei muito bem, acho que tem a ver com o fato de eu ter acabado de raspado a cabeça. - ele ofegou enquanto sua expressão se transformava em surpresa e pavor. - Ou pode ser pelo fato de que Alya acabou de chutar forte o suficiente pra eu sentir. - ela sorriu travessa. - Eu fui a primeira a sentir a pequena. - cantarolau alto.

- A não. Não acredito que eu perdi isso. Amor, como pode não me chamar? Eu viria na hora.

- Bom... você estava no banho, acho que não seria muito apropriado... Além do mais, oportunidade é o que não vai faltar.

- O engraçado, é que eu saio para tomar banho e, em menos de meia hora, tudo isso acontece. Tenho até medo do que pode acontecer caso eu vá tirar um cochilo. - Aali e eu rimos de seu exagero. Ele soou aborrecido, mas o sorriso em seu rosto deixava bem claro que ele se sentia feliz.

- Vai se acostumando, irmãozinho. Ela vai puxar meu saco para sempre.

Paixão às Cegas.Onde histórias criam vida. Descubra agora