CAMILA

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É, eu não entendo muito sobre essas questões oculares, oftalmologicas ou seja lá qual a palavra certa para isso. Só sei que não estou cabendo dento de mim.

– E então? O que o médico falou? - Aaliyah estava impaciente e cheia de expectativas.

– Bom, ele fez um mapeamento da minha retina e me deu encaminhamento para psicólogo.

Aali desviou os olhos do irmão e me encarou confusa em busca de uma explicação mais detalhada.

– Bom, ele disse que tanto um bom resultado quanto um ruim podem afetar muito o psicológico dele e, quem sabe, até mesmo o da família.

– O que seria um resultado ruim?

– A impossibilidade de a cirurgia ser feita ou a não recuperação da visão. Aparentemente, tudo é possível nessa cirurgia. - Shawn respondeu por mim, nitidamente, tentando acalmar a irmã.

Aali se manteve em silêncio e olhou no fundo dos meus olhos em busca de uma resposta para a pergunta oculta que ela tinha medo de fazer. Ela se decepcionou. Eu não tinha a resposta para sanar, seja lá qual era, sua dúvida.

– Vai dar tudo certo, Aali! Não se preocupe, sim?! - Shawn estendeu os braços em direção à irmã que se agarrou a ele com os olhos cheios de lágrimas.

Não sei o porquê mas Aaliyah estava com muito medo. Fiquei intrigada, alguma coisa não estava certa nessa história. Ela sempre quis isso e, agora, parece não estar certa do que sempre quis.

– Estão todos aí? - desviei das minhas dúvidas para voltar ao clima gostoso que estava antes.

– Todos menos Sofi e Oli. - ela colocou um bico nos lábios.

– Bom, vamos lá então... - Shawn deu dois passos à frente e parou estando a mão para mim.

– Não consegue mais andar na sua antiga casa, meu bem? - assumi um tom brincalhão em minha voz enquanto o guiava até os fundos da casa.

– Pra quê andar sem bengala se eu tenho uma? - ele balança as sobrancelhas. Bati em seu ombro.

– Eu não sou uma bengala.

– Melhor bengala que cão guia... ele me chamava assim. - Aali rolou os olhos e passou por nós indo se juntar aos mais velhos no quintal.

Shawn quase nunca usa a bengala. Ele a odeia por mais que tente não demonstrar isso para a pobre coitada. Shawn quase não a usa já que quase sempre está junto a alguém que pode fazê-lo desviar dos obstáculos. Ele só a usa fora de casa e quando está sozinho. Se não estivéssemos indo atrás de um tratamento, talvez eu arrumasse um cão guia para ele...

– Querido, como foi? - minha sogra não se conteve em emitir sua voz e olhar com expectativa para nós.

– Tenho chances, mamãe. Sinto que vai dar tudo certo.

Pelo canto dos olhos vi meu sogro suspirar e sorrir em alívio. Ele se dirigiu até nós deixando a churrasqueira totalmente por conta do meu pai e abraçou meu marido que sorriu pelo contato repentino mas já esperado por todos.

– Sei que vai dar tudo certo, meu garoto. Você merece o melhor de tudo que há nesse mundo.

– Reunião familiar e ninguém nos esperou? - a voz de Sofi soou atrás de nós e eu, imediatamente, me virei em sua direção em busca do meu pacotinho cor-de-rosa.

Os braços dela estão livres e eu me peguei, levemente, decepcionada. Não que eu não sinta falta da minha irmã. Eu sinto e a amo mais que tudo mas, eu não sei, sinto uma necessidade enorme de apenas olhar para a pequena Oli. Acho que é essa coisa de "tia de primeira viagem".

– Ela estava com a fralda suja - fez uma careta. – Me recusei a limpar... dei ao pai essa tarefa maravilhosa. - seu riso ecoou e todos a acompanhamos. – Sei que já não sou mais tão fofa assim, mas eu ainda posso ter um abraço não é, Kaki?

Meu coração se aqueceu ao ouvir o velho apelido seguido de braços abertos para um belo abraço apertado de irmãs.

‐ Eu te amo, Soso. Nunca se esqueça disso! - sussurrei em seu ouvido e ela me apertou mais contra si.

Contar a mesma história mais de duas vezes não me cansou. Isso porque eu estava com muita vontade de contar a quem quer que demonstre um pingo de interesse sobre a história. Mas não vou. O que muitos sabem, muitos estragam!

Voltar para casa como se estivesse pisando em nuvens não foi uma surpresa. Eu estava pisando em nuvens quando fomos para o churrasco na casa dos meus sogros.

Sua voz está alegre. Não que você não seja alegre... só está mais alegre do que, geralmente, é. - ele coçou nunca levemente nervoso por ter se embananado nas palavras como se fossemos um recém casal de namorados. Sorri e levei minha mão a sua bochecha.

– Eu estou feliz por ver seu sonho se tornando realidade. Suas realizações também são as minhas!

– E as suas são as minhas. Obrigado por sempre estar ao meu lado.

– Você não deveria me agradecer. Sinto que sem você eu não saberia mais como é respirar, então... bem, acho que quem precisa de agradecer sou eu. Não saberia viver sem você. - ele, por uns três segundos, não esboça reação alguma e, então, quando eu estava prestes a me virar de costas para ele em busca de algo para fazer na casa; ele me beijou.

Um beijo simples e de fato apaixonado.

Sempre achei estranha essa coisa de dizer que dá pra sentir a mensagem do beijo beijo de adeus, beijo de saudade, beijo de desespero, beijo de alívio e tantos outros que já escutei Taylor dizer que sentiu e beijou.

Eu conheço dois tipos de beijo. Bem, conhecia. Acho que, na verdade, a questão de sentir a diferença do beijo é que nunca é uma pessoa só que quer passar essa mensagem. Se trata de uma sintonia mútua que, muitas vezes, na verdade quase sempre, não é exposta em palavras.

Shawn sempre me beijou com amor ou desejo mas, agora, seu beijo parecia ansiar por segurança.

– Não se preocupe. Eu estarei aqui pra sempre. Se der certo, estarei aqui, se não der certo, estarei aqui também porque o que importa não é o que somos ou temos. O que importa é o que sentimos. - coloquei minha mão em seu peito. – E eu te amo. Simplesmente, amo. Absolutamente tudo o que eu tenho por você é amor.

Ele aproximou nossas testas e fez um carinho em minha bochecha.

– Eu só tenho medo de ter sido tarde demais e, no fim, não conseguir ver o meu álbum, nossos filhos ou minha irmã. Eu só... só quero muito que isso dê certo.

Paixão às Cegas.Onde histórias criam vida. Descubra agora