Sacrificado

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A Buscadora examinava meu rosto enquanto Gabe e eu lutávamos. 

Não, Cas, não! 

--Não seja tolo, Gabe. Você entre todas as pessoas deveria ver o potencial dessa escolha. Não é o que você quer? 

Mas mesmo enquanto eu tentava olhar para o final feliz, não podia fugir do horror da escolha. Este era o segredo que eu deveria morrer para proteger. A informação que estivera desesperado para manter em segurança, não importava que torturas horrorosas
eu sofresse. 

Esse não era o tipo de tortura que eu tinha esperado: uma crise de consciência, confundida e complicada pelo amor por minha família humana. Muito dolorosa, contudo.
Eu não poderia reivindicar ser um expatriado se fizesse aquilo. Não, eu seria puramente um traidor. 

Não por ela, Cas! Não por ela!, urrava Gabe. 

--Eu deveria esperar? Esperar até que eles pegassem outra alma? Uma alma inocente que eu não tivesse razões para odiar? Eu vou ter de tomar a decisão, em algum momento

Não agora! Espere! Pense sobre isso! 

Meu estômago se contraiu outra vez, e eu tive de curvar meu corpo para a frente e respirar fundo. Mal consegui não sufocar. 

— Cas? — chamou Bob, preocupado. 

--Eu poderia fazê-lo, Gabe. Eu poderia justificar deixá-la morrer, se ela fosse uma dessas almas inocentes. Aí eu poderia deixar que eles a matassem. Eu poderia confiar que iria tomar
uma decisão objetiva. 

Mas ela é horrível, Cas! Nós a odiamos. 

Exatamente. E eu não posso confiar em mim mesmo. Olhe como eu quase não vi a resposta... 

— Cas, você está bem?  

A Buscadora olhou além de mim, na direção da voz de Bob.  

— Tudo bem, Bob — arquejei. Minha voz saía num sopro, cansado. Fiquei surpreso de como estava soando mal. 

Os olhos escuros da Buscadora saltaram de um a outro entre nós, inseguros. Então ela se afastou de mim, encolhendo-se na parede. Eu reconheci a posição — lembrando
exatamente como tinha me sentido ao adotá-la.
A mão afável de alguém pousou no meu ombro e me fez virar. 

— O que está acontecendo com você, querido? —perguntou Bob. 

— Eu preciso de um minuto — disse, respirando com dificuldade. Olhei
diretamente em seus olhos azuis desbotados e disse-lhe uma coisa que definitivamente não era mentira: — Eu tenho mais uma pergunta. Mas realmente preciso de um minuto
para mim. Você pode... esperar por mim? 

— Certamente, podemos esperar um pouquinho mais. Descanse um pouco. 

Eu concordei com a cabeça e me afastei o mais rápido que pude da prisão.
Inicialmente minhas pernas estavam rijas de terror, mas encontrei meu passo à medida que andava. Quando passei por Victor e Benny, estava quase correndo. 

— O que aconteceu? — ouvi Victor sussurrar para Benny, a voz desnorteada. 

Eu não tinha certeza de onde me esconder enquanto pensava. Meus pés, como um transporte sem condutor, me levavam pelos corredores para o meu quarto. Eu só podia
esperar que estivesse vazio.
Estava escuro, mal havia uma luz qualquer das estrelas escoando pelo teto rachado.
Eu não vi Amara até tropeçar nela no escuro.
Eu quase não reconheci seu rosto inchado de chorar. Ela estava no chão, bem no meio da passagem, encolhida como uma bolinha apertada. Seus olhos estavam arregalados, sem compreender exatamente quem eu era. 

A Hospedeira/DestielOnde histórias criam vida. Descubra agora