Necessario

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Eu fiquei paralisado, e então olhei por cima do ombro para ver se havia alguém atrás de
mim. 

— Mike era o marido dele — sussurrou Jack quase silenciosamente. — Ele não
escapou. 

— Mike — disse-me Joshua, indiferente à minha reação. — Você acredita que
tenho um câncer? Quais as possibilidades, hein? Nunca fiquei doente um dia na minha
vida... — Sua voz enfraqueceu até eu não poder ouvi-la, mas seus lábios continuaram a
mexer. Ele estava frágil demais para levantar a mão; seus dedos se arrastaram até a
beirada do catre, na minha direção. 

Dean me deu uma empurrãozinho adiante. 

— O que devo fazer? — perguntei baixinho. O suor porejando em minha testa não
tinha nenhuma relação com o calor úmido. 

— ... vovô viveu até os 101 anos — ofegou Joshua, novamente audível. —
Ninguém jamais teve câncer na minha família, nem sequer os primos. A sua tia Maggie
teve câncer, não teve? 

Ele olhou para mim com confiança, esperando uma resposta. Dean me cutucou nas
costas. 

— Bem... — balbuciei. 

— Talvez tenha sido a tia de Bill — admitiu Joshua. 

Eu lancei um olhar de pânico para Dean, que deu de ombros. 

— Socorro — disse, movendo a boca para ele. 

Ele indicou que eu pegasse os dedos tateantes de Joshua.
A pele de Joshua estava branca como giz e transparente. Dava para ver a débil
pulsação do sangue nas veias azuis nas costas de sua mão. Eu a levantei com muito
cuidado, preocupada com os ossos finos que Jack tinha dito estarem tão quebradiços.
Pareceu leve demais, como se fosse oca. 

— Ah, Mike, foi duro sem você. Aqui é um lugar legal; você vai gostar daqui,
mesmo quando eu morrer. Muitas pessoas com quem conversar... eu sei que você
precisa ter a sua conversinha. — O volume da voz dele caiu até eu não conseguir mais
entender o que dizia, mas seus lábios ainda formavam as palavras que ele queria
compartilhar com a esposa. Sua boca continuou se mexendo, mesmo quando seus olhos
se fecharam e a cabeça rolou de lado.
Dean encontrou um pano úmido, e com ele começou a limpar o rosto lustroso de Joshua. 

— Eu não sou bom em... em iludir — sussurrei, olhando os lábios murmurantes de
Walter para ter certeza de que ele não estava me ouvindo. — Não quero perturbá-lo.

— Você não precisa dizer nada — assegurou-me Dean. — Ele não está lúcido o
bastante para ligar. 

— Eu pareço com ele? 

— Nada... eu vi a fotografia dele. Ele tinha a cor dos cabelos pretos. 

— Aqui, deixe-me fazer isso. 

Dean me deu o pano, e limpei o suor no pescoço de Joshua. Mãos ocupadas sempre
fizeram que eu me sentisse mais à vontade. Joshua continuou a murmurar. Eu pensei
tê-lo ouvido dizer:
"Obrigado, Mike, como isso é bom."
Eu não notei que os roncos de Doc tinham parado. Sua voz familiar de repente
estava atrás de mim, dócil demais para assustar. 

— Como ele está? 

— Delirante — sussurrou Dean. — É por causa do conhaque ou da dor? 

— Mais a dor, acho. Eu trocaria meu braço direito por um pouco de morfina. 

— Talvez Sam produza outro milagre — sugeriu Dean. 

— Talvez — Doc deu um suspiro.  

Eu passava o pano absorta no rosto pálido de Joshua, ouvindo mais atentamente
agora, mas eles não falaram de Sam novamente. 

Não está aqui, sussurrou Gabriel.  

A Hospedeira/DestielOnde histórias criam vida. Descubra agora