ELA SAIU DO elevador calmamente, passou por meu lado tocando em meu ombro provocando uma sensação de dor instantânea e uma voz sussurrou em minha cabeça: isso é só uma mínima demonstração do que eu posso fazer, querida. Fique longe de mim ou eu acabo com você.
Por mais que eu não fosse uma pessoa chegada em nenhuma religião e nem acreditasse muito nessas baboseiras que as igrejas tentavam nos sondar, comecei a rezar todas as orações que eu conhecia, e mais as que eu inventava na cabeça. Tudo isso pra conseguir juntar coragem para ir atrás da mulher que agora se encontrava pelo menos a quatro carros de distância.
— Pare aí mesmo! – berrei.
Ela riu, sem olhar para trás.
Minha raiva explodiu no peito, e eu gritei de novo.
— Se você não parar vou ser obrigada a atirar, senhora!
A palavra "senhora" pareceu lhe afetar, já que ela se virou para mim completamente, com os olhos injetados de raiva, e começou a andar em minha direção, soltando – literalmente – fogo pelas ventas.
Enquanto ela caminhava, pude ver que suas peças de roupa começavam a se despedaçar à minha frente, e virar pó. Ela tinha uma pele escamosa por baixo de toda aquela roupa, de uma cor nada natural, e vermelha, até. Ela parecia estar pegando fogo. Seus olhos agora não eram mais amigavelmente verdes, mas ardiam de certa forma, e podiam ser considerados um tanto quanto assustadores. E quando ela sorriu, bem, vamos simplesmente dizer que seu sorriso não alcançou seus olhos, e os dentes que deveriam ser perfeitos como eu me lembrava, davam agora espaço para presas afiadas e pontudas.
Definitivamente um demônio forte.
Dei alguns passos para trás, e sem pensar atirei.
O demônio parou no meio do caminho e tateou o corpo tremulamente me lançando um sorriso ameaçador logo após os tiros atravessarem seu corpo e irem parar diretamente na pilastra atrás dela, como se ela não estivesse nem ali.
Minha mente parecia ter desligado por alguns segundos, e o medo era a única coisa que eu conseguia sentir. Por que aquelas coisas só aconteciam comigo? Eu tinha o dom para atrair problemas daquele tipo.
A criatura chegou mais perto ainda de mim, e passou sua garra em minha bochecha, deixando uma sensação de frio e infelicidade que eu nunca havia sentido antes. Minha visão ficou turva, e pude ouvir o demônio sussurrar quase carinhosamente em meu ouvido:
— Helena, não vamos tornar as coisas mais difíceis do que já estão. Venha comigo. Deixe-me alimentar de sua pobre alma. Você parece ser tão apetitosa...
E um segundo depois eu corria por minha vida pelo estacionamento, a arma sendo quase esmagada por mim. Peguei o frasco pequeno com água benta que estava em meu bolso de trás, e implorei para que ela fizesse pelo menos aquele monstro desacelerar os passos.
Parei no meio do caminho, e joguei o frasco em sua direção. O líquido se espalhou por seu rosto, se concentrando na área dos olhos, e o monstro caiu no chão berrando palavrões que nem eu sabia que existiam.
Continuei a correr esperando que o demônio tivesse desistido de mim, e me escondi uns bons metros longe dele, atrás de uma pilastra e escorada em um carro de luxo que identifiquei como sendo o de Fitch.
Fitch vai me matar.
Enquanto estava escondida, vi a sombra de um homem parado na entrada do estacionamento.
Deus do céu, tudo tinha que acontecer justamente no dia que eu viesse trabalhar? Primeiro um demônio atormentador, e depois um humano estava vendo tudo o que havia acontecido? Alguém será despedida hoje.
Fiz menção para ele ir embora, e quase levantei para mandá-lo para longe. Mas ele não parecia inclinado a me obedecer de maneira alguma.
Ele veio mais para a luz, mas não entrou no prédio. O homem olhou para cima e depois para mim novamente, e tentou entrar, mas então parou no meio do caminho.
— Deixe-me entrar! – ele berrou.
Pisquei algumas vezes e quase ri.
— Está louco? Vá embora daqui enquanto pode!
Ele começou a ficar agitado e andava de um lado para o outro, como se estivesse procurando uma maneira de entrar no prédio para tentar me ajudar.
— Me deixe entr...
Sua frase foi interrompida pelo som vidros se quebrando e metal sendo retorcido. Cobri os ouvidos e me joguei no chão com medo que os estilhaços viessem em minha direção.
— Você pode ter me cegado, mas seu cheiro ainda está presente, sua garotinha boba! – o demônio riu descaradamente. Era possível ouvir seus passos pesados no concreto do estacionamento, num ritmo meio macabro.
Olhei para de onde o som vinha, e pude observar que a criatura estava levantando todos os carros para me achar a todo o custo. Ela estava içando um por um com suas mãos largas, e jogando uns contra os outros de uma maneira assustadora.
— Me deixe entrar agora! – ele exclamou. Parecia que ia explodir, mas eu não o deixaria entrar de nenhuma maneira.
— Não! – retruquei.
O demônio riu.
— Arrumou uma ajudinha, querida? – a criatura perguntou, sua voz soando ainda mais perto.
Não respondi, e tapei a boca com as mãos para me impedir de gritar desesperadamente. A arma parecia ser feita de sabão agora. Ouvi os passos despreocupados virem em minha direção e minhas pernas pareceram travar.
Em minha mente eu repetia vários dos palavrões que eu havia aprendido com o demônio e mais alguns que eu conhecia, torcendo para que eu não fosse morta. Ainda nem era Ação de Graças!
Senti uma respiração em meu pescoço e espiei pelo canto do olho, quase chorando.
— Você tem um cheiro tão bom. – a criatura sorriu.
Em outras circunstâncias, como em uma cantada de bar, esta frase até me faria beber uma rodada de bebidas que algum cara gatinho ofereceu. Mas na praticamente-morte experiência, eu não estava tão exultante para ir beber alguma coisa com essa... coisa.
Empurrei a criatura para longe com o cotovelo, e não me arrependi quando ouvi a cartilagem de seu nariz se deslocar, ignorando a agonia que se transformou em um arrepio irritante e desceu até a base de minha coluna.
Corri em direção ao carinha, e pude sentir o chão vibrando com o peso do demônio atrás de mim.
— Por tudo o que é mais sagrado me ajude! – comecei a gritar.
— Diga as palavras. – o homem disse, quase friamente.
— Eu te deixo entrar... – mal terminei a frase quando tropecei em meus próprios pés, e vi com horror a besta subir em cima de mim, e levantar as garras para dilacerar meu peito.
Mas por sorte vi uma sombra enorme empurrar o monstro para longe, fazendo com que ela gemesse de dor.
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A Caçadora
RomanceHelena Jameson é de fato uma adolescente fora dos padrões. Não tem amigos, não se enturma, e nunca deixa que as pessoas se aproximem demais por causa de seu segredo sombrio. Ela é, na verdade, uma caçadora de criaturas místicas. E estar apaixonada p...