O dia amanheceu límpido, o céu azul, sem sinal de nuvens próximas. O sol da manhã aquecia a grama molhada pelo orvalho e trazia uma atmosfera especial as paredes cor de ocre da fazenda Balvanera.
José Ángel Arriaga acordou primeiro e, mesmo sem abrir os olhos, sentiu o perfume de camomila e jasmim que emanava dos cabelos dourados de Victoria - aquele perfume delicioso que parecia que já fazia parte dele, que lhe entrava pelos poros e o hipnotizava. Victoria estava deitada de costas para ele na cama e Arriaga a abraçava pela cintura, juntinho de si. Ela dormia tranquilamente um sono merecido, depois de uma montanha russa de emoções da noite passada. Arriaga a beijou delicadamente no ombro para não acorda-la, levantou com cuidado e se vestiu, descendo para o andar inferior da fazenda.
Arriaga caminhava pelos corredores de pedra respirando o ar puro da manhã. O perfume das flores que vinha dos jardins bem cuidados e o cheiro do campo inundavam seus pulmões. Que dádiva divina era acordar com essa tranquilidade no coração. Arriaga fez uma prece silenciosa em agradecimento ao que estava sentindo, ao amor que transbordava dentro de si, a estar finalmente em paz. Teve que se segurar para não correr de volta para o quarto, enfiar-se entre as cobertas e se agarrar em Victoria, murmurando entre os lábios dela promessas de amor. Mas lhe ocorria agora uma ideia muito melhor. Ele sorriu para si mesmo e respirou profundamente. Como era bom amar Victoria Balvanera.
Quando Arriaga entrou na ampla cozinha, Jovita estava tirando alguns pães do forno e Fortuno tomava uma xícara de café, sentado à mesa. Arriaga quase deu meia-volta pensando que sua fantasia de preparar um café na cama romântico iria por água abaixo. Se sentiu um pouco idiota por pensar que a cozinha estaria vazia àquela hora.
"Bom dia, José Ángel!" disse Fortuno, interrompendo os pensamentos de Arriaga "Já de pé tão cedo?"
"Bom dia, Fortuno. Bom dia, Jovita." respondeu Arriaga, desconcertado, mas em seguida recuperou o sorriso e o bom-humor "O ar do campo me faz tão bem que acabo voltando aos velhos hábitos."
"E menina Victoria? Já acordou?" perguntou Jovita.
Arriaga sentiu suas bochechas corarem de vergonha. Ele não sabia se Jovita perguntava por pura inocência ou porque desconfiava de algo. De toda maneira, a confusão com Nelson Brizz na noite anterior era uma prova contundente de que entre a Senhora Victoria e seu guarda-costas havia algo mais do que uma relação de trabalho. Arriaga recordava-se muito bem de que havia uma pequena plateia assistindo-o desfigurar Nelson a socos.
Jovita, no entanto, percebendo o embaraço de Arriaga, decidiu mudar de assunto.
"E está se sentindo melhor, meu jovem?" ela perguntou, voltando aos seus afazeres.
"Eu...? Porque?"
"Ora, por causa da briga" interrompeu Fortuno "Sua cara não está muito boa, filho."
Arriaga levou a mão ao rosto num súbito. Tinha esquecido completamente de seus machucados da noite anterior.
"Ah, isso... Isso não foi nada."
"Na minha vida já vi uma boa quantidade de brigas com todo o tipo de gente... E digo pra você que a de ontem a noite..." Fortuno disse, deixando as frases ecoarem pela cozinha como se quisesse dar ênfase às suas palavras "Bem, não foi bonito de ver."
"Fortuno, não incomode o menino com essas coisas." repreendeu Jovita.
"Só estou dizendo que por muito pouco o nosso José Ángel aqui não deu cabo do senhor Nelson." explicou Fortuno, dando de ombros.
Arriaga estava pensando que devia ter seguido os seus instintos e voltado para cama com Victoria quando teve a chance.
"Pois acho que ele bem que mereceu. Vir falar aquelas grosserias para a menina Victoria, onde já se viu?" ela disse, com as mãos cintura "Você fez muito bem, meu filho. Já estava mais do que na hora de alguém dar uma lição nesse Nelson Brizz."

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Laberintos Cerrados
FanficFilho de um antropólogo e de uma índia nativa de Catemaco, Vera Cruz, José Ángel Arriaga sempre esteve familiarizado com os rituais xamânicos de sua terra natal. Em meio à sua culpa e remorso, ele decide voltar para sua cidade em busca de uma respo...