Capítulo Trinta e Nove

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Marlon Shipka:

Três dias se passaram, mas minha mente permaneceu presa em dois pensamentos: Lídia e Otto. Lídia, apesar de tudo o que havia enfrentado, encontrou rapidamente uma amizade em Alice, como se a conexão entre as duas fosse algo natural, instintivo. Era um alívio vê-las rindo juntas pelos corredores, mesmo que o peso do que estava por vir pairasse sobre nós. Otto, por sua vez, havia conquistado o coração de Lídia de uma maneira inesperada. A cada dia, ele a tratava mais como uma filha, com um carinho e uma proteção que iam além da formalidade de um imperador. Para alguém tão jovem e marcada pela dor, Lídia parecia finalmente começar a encontrar algum tipo de segurança ao lado dele.

Mas por trás de todos esses pequenos momentos de ternura, o que Lunerio havia me contado continuava a me atormentar. Sua busca por sinais da magia de Theorban ou qualquer distúrbio nas energias que circulavam pelo mundo não rendeu resultados. Isso só aumentava minha inquietação. Se nem mesmo um deus esquecido, com toda a sua sensibilidade para as forças ocultas, conseguia rastrear o inimigo, o que mais poderíamos fazer?

Caminhei pelo corredor do palácio, passando pelos grandes vitrais que refletiam a luz do entardecer. A beleza da paisagem parecia quase insultante diante da tensão interna que me consumia. Não era apenas a segurança do império que estava em jogo, mas também a vida de Lídia, agora tão entrelaçada à nossa. Pensar que Theorban poderia estar planejando algo maior, com intenções sombrias e alianças perigosas, me deixava em constante alerta.

O silêncio no palácio era interrompido apenas pelos risos ocasionais de Alice e Lídia, e, por mais reconfortante que fosse ouvi-las, não conseguia me desligar da preocupação crescente. Lunerio, embora não houvesse encontrado nada, havia deixado claro que a ameaça ainda estava presente — e cada dia sem respostas parecia nos aproximar mais de um desfecho trágico.

Ao entrar na biblioteca, encontrei Otto sentado em uma das poltronas próximas à lareira, com um livro aberto no colo. Ele levantou o olhar assim que percebeu minha presença, um sorriso leve nos lábios, mas os olhos carregando o mesmo peso que eu sentia.

— Não há novidades — falei antes que ele perguntasse. — Lunerio continua sem conseguir rastrear nada. É como se Theorban estivesse escondido sob uma camada de escuridão impenetrável.

Otto fechou o livro e suspirou, esfregando a têmpora como se quisesse afastar uma dor incômoda.

— Isso é preocupante. Theorban não deveria ter essa capacidade por conta própria. Alguém ou algo está o ajudando, e não saber quem ou o que é nos deixa em desvantagem. Além disso, Lídia continua tendo pesadelos. Ela ainda teme que ele a encontre — comentou, sua voz carregada de frustração.

Assenti, sentindo a mesma impotência. Os pesadelos de Lídia eram um reflexo do que ela havia sofrido nas mãos de Theorban. Mesmo cercada de pessoas que desejavam protegê-la, ainda havia uma parte dela que estava presa ao medo, ao trauma.

— Precisamos de um plano — continuei, cruzando os braços enquanto tentava organizar meus pensamentos. — Se Theorban está se escondendo de deuses, isso significa que ele tem um ponto de concentração mágico que está protegendo sua localização. Talvez se identificarmos onde ele está agindo, podemos desmantelar essa barreira.

Otto assentiu, mas o olhar distante indicava que ele estava ponderando outras possibilidades.

— Marlon, e se Lídia for a chave para isso? — perguntou ele, após alguns segundos de silêncio. — E se Theorban precisar dela para completar o que quer que esteja planejando? Ele não a capturou antes à toa.

A ideia fazia sentido, mas a perspectiva de usar Lídia, mesmo de forma indireta, era perturbadora.

— Não podemos arriscar a segurança dela — retruquei, com firmeza. — Ela já passou por tanto... Não posso permitir que ela se torne um alvo fácil para ele.

O bruxo imperadorOnde histórias criam vida. Descubra agora