Capítulo 29

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Seus olhos 

***

    A previsão do tempo diz que no Rio de Janeiro faz Sol. Um enorme contraste com a chuvosa Vila Velha. 

    As gotas de água estão batendo contra o vidro da janela nesse dia cinzento, repleto de nuvens pesadas e densas.

    É véspera da chegada das minhas amigas e dele. O ele é que me apavora. Apavora e deixa-me extasiada ao mesmo tempo. 

    Sinto tremeliques toda vez que imagino nosso reencontro, tremo da cabeça aos pés e minha respiração fica tensa. 

    Me sinto como a Anne Frank com seu Peter. A empolgação e certeza de que é somente ele e ninguém mais.  

    Ouvir “I Will Follow Him” da Peggy March também não ajuda. É eu o amo e ouvir essa parte da música milhares de vezes me deixa até um pouco enjoada. 

    Me identifico agora com uma das citações do Kurt Cobain sobre amar demais as pessoas a ponto de se sentir mal. Parece que o amor, às vezes, não é tão saudável assim.

Respirei fundo, olhando as gotas de chuva batendo no vidro mais uma vez. Elas produzem um som abafado e gostoso. Estou deitada no chão de madeira do quarto com as pernas escoradas na porta da varanda e é lindo ver o céu dessa perspectiva. 

Tudo tão claro e cinza ao mesmo tempo. 

“You Don’t Own Me” começa a tocar e eu canto baixinho. Completamente depressiva.

Meus pais queriam ir visitar uma cidade próxima da nossa mais cedo, quando ainda havia Sol, mas fiquei desanimada e estraguei os planos de todos. Insisti para que fossem, então começou a chover e eles decidiram ficar.

    Fecho os olhos e penso que quero encontrar Cecília logo para falar sobre Augusto Vettel e meus pais.  

    Ouço um barulho perto da porta do quarto. São miados, levanto-me e sigo até lá, abrindo-a para meu gato que assim que a vê aberta, passa por ela. Enrola minhas pernas. Pego o no colo e o levo para cama comigo. 

    Sinto o seu pelo macio e quente contra meus braços e rosto. Tão bom! 

    Sento na cama e Millorens deita em frente a mim e fica a me olhar. Quando ele está assim, o contemplativo fica tão fofinho e penso que ele verdadeiramente me ama. 


    No dia seguinte, quando o Sol apareceu, meu humor estava melhor, sem toda carga depressiva que sempre me acompanha. Estranhamente, não estava tensa, talvez um pouco feliz. Diria que meu estado era sublime, algo calmo e tranquilo. 

    Não sei se ele me enviará alguma mensagem combinando um encontro hoje ou amanhã, ou qualquer outro dia. Tento não pensar nisso, mas está difícil. 

    Já olhei as mensagens no computador, só as meninas que me enviaram, dizendo que chegariam à tarde. Elas querem marcar para nos vermos em uma lanchonete perto da casa delas, assim a gente dorme na casa da Maria para revezar. A lanchonete é perto da escola, onde o ônibus deixará os alunos, então, provavelmente, Augusto estará por perto e talvez nos encontremos. Respiro fundo, mentalizando que caso aconteça, será bom. 

Fiquei receosa de responder ao convite e Augusto enviar logo após uma mensagem marcando nossa conversa, mas decidi aceitar, qualquer coisa digo às meninas que não vou poder ir, mas dessa vez explicando a situação para não deixar ninguém pensando que sou horrível. 

2002Onde histórias criam vida. Descubra agora