capítulo 35

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Noite das garotas

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Havia ficado uma semana sem tocar ou pensar em arte. hoje, no meio da aula, me lembrei do que prometi a mim mesma, sobre tentar, administrar meu tempo e não esquecer do que eu gosto.

Foi pensando nisso tudo que, ao chegar de mais um dia de aula - ainda bem que era sexta-feira -, caminhei até a penteadeira e tirei da gaveta minhas folhas em branco e lápis de desenho. peguei todas juntas e as tirei dali. algo caiu no chão, afastei a cadeira para apanhar o que havia saído do emaranhado de folhas algumas rabiscadas, outras desenhadas e muitas em branco. minha surpresa foi ver uma nota de cem reais e não um pedaço recortado de folha de ofício.

Abaixei meu corpo e peguei a nota azul, negando com a cabeça.

— Que safado!

Sem conseguir segurar, comecei a rir de sua determinação em me pagar pelo desenho. eu, sinceramente, não achava que valia aquilo tudo.

Me levantei e corri até a mochila da escola, em cima da minha cama, jogada de qualquer jeito ali. peguei no bolso exterior meu celular e disquei seu número.

Enquanto esperava ele atender a ligação, enrolei a ponta da minha saia com nervosismo, doida para que ele atendesse. infelizmente ele não atendeu, mas horas depois retornou a ligação, perguntando se estava tudo bem.

Soltei uma risada sarcástica e respondi:

— Tudo ótimo!

— Senti um tom de ironia. o que eu fiz? — indagou rapidamente.

— Que isso, eim?! Tem culpa no cartório?

— Me dá uma dica que eu respondo se sim ou se não — soltou uma risada rouca.

— Hmmm

Liguei para o safado que disse que não se lembrava de nada, então não era dele, e sim minha. resolvi deixar de lado e seguir com a vida, além disso foi ótimo gastar meu dinheiro com açaí.

Eu voltei a desenhar, a pintar, a fazer arte. Depois de uma conversa com Cecília, minha psicóloga, aprendi que não devo deixar o que gosto de lado pelos estudos ou qualquer outra coisa. Ela disse que isso é ir ao extremo demais e que, quando fazemos isso, quando nós negligenciamos, perdemos um pouco de nós, e que depois é difícil encontrar todos esses fios perdidos novamente. A solução é o equilíbrio.

Ela me aconselhou a fazer em casa mesmo, e deixar às aulas pra depois, já que eu estava com medo de não dar conta, após comentar com ela sobre querer voltar às aulas de artes. Cecília disse que acredita que eu daria conta sim, mas que era melhor ir na minha velocidade e percepção, ainda mais depois que comentei sobre estar atolada até a cabeça com matérias para estudar.

— Você tem que administrar seu tempo para depois não se frustrar por exigir tanto de você mesma, por não conseguir fazer algo ao qual se propôs. Se você tem esse tempo, acho que deveria fazer, se não tem, seria melhor esperar um pouquinho de tempo — mostrou com o indicador e o polegar, minimamente afastados.

Então eu decidi que depois das provas, iria voltar às aulas, aqui ou em outra cidade se eu me mudar.

Eu nem gosto de pensar nisso, ainda mais agora que tudo está dando certo. Não sei se os sonhos meus e do Augusto são compatíveis para coexistir no mesmo espaço. Eu oro toda noite para que seja.

Tentando não pensar sobre isso, sigo meu caminho até a biblioteca pública onde encontrarei minhas amigas para estudarmos juntas.

Luana é ótima em física, ela disse que quer fazer faculdade de Engenharia Aeroespacial, já Maria quer Letras.

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