CRAZY TAXI (BY MISTAKE) ✘ tae.ten

19 - Se um dia for ao meu quarto

Não aguento mais ficar nesse carro. Acho que vou enlouquecer. Já fiz três desenhos e num deles eu acabei borrando tudo só de raiva. Meu corpo está dolorido, eu não aguento mais dormir em banco de veículo. Estou sonhando com uma cama. Estou sonhando com tanta coisa… Mas, ao invés de estar tentando conquistá-las, estou comendo uma marmitinha fria que Ten comprou como almoço de hoje. Uma marmita. Não mereço isso...

Eu achei até que ele iria aliviar para o meu lado, uma vez que ficamos bem próximos (literalmente) ontem à noite no estacionamento do supermercado. Mas não houve evolução desde então, apenas que ele diz que eu mastigo muito alto e que eu deveria comer lá fora se eu for fazer esse barulho todo. E então discutimos, pra variar. Daí começo a imaginar como seria empurrá-lo do carro em movimento. Sabe, não sei, seria uma sensação de paz…

— Hm, Taeyong — chama minha atenção, ainda sem tirar os olhos da estrada. — Enquanto você dormia eu tive uma ideia.

— Conte — eu fecho a vasilha da marmita ao terminar e deixo ela no saquinho de lixos e coisas usadas que Ten guarda. Ele é nojento, vou ser honesto.

— Por que você não compra um carregador novo para você?

— Porque eu já tenho o meu.

— Caramba… — ele revira os olhos e troca de marcha. — Você pode comprar outro.... Aí vai poder carregar o celular.

— Ah, entendi — abaixo a cabeça meio envergonhado. É, fui meio lerdo agora. — É uma boa ideia. Vamos comprar hoje?

— Quem vai comprar é você.

— Mas quem é que tá me levando?

— Quer saber? Você que deveria estar dirigindo, sabia? — vira o rosto rapidamente para mim. — Eu nem almocei ainda e você já está com o bucho cheio.

— Você que é o motorista, a culpa não é minha!

— E daí? Essa palestra aí que você vai fazer não é sobre isso? Sobre VOCÊ ser seu próprio carro? Super consigo te imaginar no auditório gritando: "Cresça! Pare de chorar! A vida não é para gente fraca! Supere seus desafios! Você consegue! Se precisa sair e não tem carro, seja seu próprio carro! Se precisa surfar e não tem onda, crie a onda você mesmo. Se quer se bronzear mas está noite, transforme a lua num sol. Se você quer, faça! Você não é mais menino, você é um homem! O mundo… ele não vai pegar leve com você!”

Retiro tudo o que eu disse sobre Ten ser legal e tudo mais. Eu odeio ele. Eu odeio. Odeio. Odeio. Sinceramente, eu odeio Ten. Eu estou com vontade esganá-lo. Só que agora, neste momento, olhando seu sorriso travesso, olhando as árvores passarem rápidas, tudo que consigo é rir. Eu fico rindo como se… sei lá, como se não fosse irritante da parte dele dizer essas coisas de uma maneira tão dramática. Ele até mudou o tom de voz ao falar! Sinceramente, eu odeio tanto Ten que não consigo parar de rir.

Ele ri também, desfaz a pose de outrora, fica com os olhos entreabertos devido ao riso. Mesmo assim, isso não o atrapalha ao dirigir. Dou uns murrinhos no seu banco e ele remexe os ombros.

— Você acha que minha palestra vai ser algo do tipo? — eu questiono, ainda com um sorriso nos lábios.

— E não é sobre isso?

— Claro que não! — inclino-me para trás e começo a ajustar o banco para que eu deite um pouco. Vou ficar folgado agora. — Vou falar sobre esculturas, claro. Principalmente esculturas de parede, só que para uma turma de Design de Interiores.

— Oh, me fale sobre isso…

— Meu trabalho?

— Hm. Quantas esculturas você já fez?

— Difícil saber. Eu já refiz várias e também desisti de várias ou destruí.

— Por que destruiu?

— Não estavam de acordo com a minha expectativa.

— Então tudo que não atende suas expectativas, você destrói?

— Às vezes, mas só as esculturas quando estou ainda no processo… — umedeço os lábios e, agora com o banco reclinado, eu fico olhando Ten enquanto ele dirige. — Mas gosto muito de fazer.

— O que você mais gosta de esculpir?

— Bustos — fico brincando com meus dedos. Não tiro os olhos de Ten. Fico olhando sua nuca e o corte de cabelo. É bonito, charmoso. — Posso pôr os pés em cima do porta-luvas?

— Não — ele me responde. E então, retoma ao assunto: — Qual a melhor que você fez? Pelo menos a que você considera a melhor?

Eu fico olhando para o seu pescoço por um tempo, pensando na corrente que ele tem e qual deve ser o pingente. Mas logo meus pensamentos perpassam por entre minhas obras e solto um sorriso alegre por nossa conversa. O Ten está querendo saber sobre mim…

— Eu fiz um espécie de Atlântida para os meus peixinhos no aquário que tenho na sala — conto, envaidecido.

— Oh, que legal — ele olha rapidamente para mim e sorri. — E fofo também.

— Uhum — concordo com a cabeça. — Se um dia você estiver de passagem na Coreia, sabe… pode ir lá. Eu te mostro.

Por favor, Ten, entenda as entrelinhas. Por favor, entenda as entrelinhas.

— Pode deixar — sorri, mas dessa vez não olha para mim. — E qual a mais engraçada?

— A mais engraçada?

— Sim.

— Uma vez eu fiz uma réplica da escultura de Gangnam Style.

— Sério? — solta essa gargalhada gostosa e eu fico sorrindo encantadoramente.

— Só que uma miniatura. Está na minha estante de livros, lá no meu quarto — falo. — Se um dia você for lá em casa… eu posso te mostrar.

— Ah, ok — ele olha pra mim, mas desvio o olhar no mesmo instante. Olho para a janela. As árvores são lindas.

— Ela é dourada… — ainda comento.

— Você acha ela parecida?

— É uma boa réplica — crente de que ele já não está me olhando, viro o rosto para voltar a observá-lo. No entanto, me deparo com seu olhar ainda em mim. Meio sem graça, ele tira e deposita a atenção no retrovisor para disfarçar. — E você? Qual foi a corrida mais rápida que fez?

— Três minutos.

— E a maior?

— Você — vejo como a língua desliza vagarosamente pelo lábio inferior.

— Oh, me sinto até especial… — ponho a mão no peito por puro drama. — Até esqueço que não está me tratando bem.

— Desde quando isso? Estou te tratando como um príncipe!

— Se isso é tratar como príncipe, nem quero saber como é tratar feito lixo.

— Como você é chato, hein Taeyong?!

Eu rio da sua carinha brava e fico quieto na minha. Vou dar um descanso a ele. Vai que surta e enfia o carro em alguma ribanceira? Não quero morrer tão jovem assim, não. O mundo precisa de mim.