Roman narrando.
A água da banheira estava quente e a espuma tomava conta da superfície, me impedindo de ver mais do que bolhas de sabão. Estiquei o braço, alcançando a minha taça de vinho e a tomando, por fim, acendi o cigarro, respirando fundo conforme o ambiente se enchia da névoa branca que tanto conheço e amo. Encarei a janela do hotel, logo ao meu lado, dando toda a vista do rio São Lourenço e o céu repleto de estrelas. Estar em Montreal me animava, ao mesmo tempo que me assustava. Medo do que vim aqui para fazer.
Já faziam três anos desde nosso beijo nas Maldivas, três anos que não sentia seus lábios ou o gosto da sua língua, o delicioso cheiro de lavanda que vinha dos seus cabelos cor de fogo. O tempo foi impiedoso, nos encontramos apenas nos natais dos anos seguintes aquele encontro, mas ela se mantinha sempre distante e não pudemos nem falar a sós. Deixei de tentar também, uma hora a gente cansa de tanto apanhar... Mas no meu caso, ainda não me cansei totalmente. Aqui estou. No Canadá. No dia da sua formatura... Para uma última tentativa, uma última chance de a reconquistar.
Tom me acompanhou nessa - palavras dele - missão suicida. Ele havia garantido que eu levaria uma porta na cara, que Isabella não ia querer nem me ver. E por mais que doesse tudo o que ele falava eu sentia que era possivelmente o que iria acontecer... Já fazem cinco anos desde que descobrimos o que somos. Irmãos. E foi isso que nos destruiu, não foi eu, não foi as milhares de vezes que a fiz chorar... Foi apenas isso: um erro de outras pessoas, não nosso. Não era justo pagarmos por isso... Não é justo desistir do nosso amor por isso.
"Cara, ela já te esqueceu! Supera isso! A Isabela era uma criança, uma menina! Tinha dezesseis anos..."
As palavras dele me doíam tanto que chega faltava o ar, não conseguia acreditar nelas. Eu não fui só um amor da adolescência dela, não fui apenas o clichê "primeiro amor". Eu sou o amor da vida dela. Pra vida dela. E vou lutar por isso até ela dizer na minha cara que nunca mais quer me ver, e que, não sente o mesmo de seis anos atrás.
Duas batidas na porta do banheiro me tiraram a atenção da janela e dos meus pensamentos.
- Cara, melhor andar logo pra gente não se atrasar.
Ele tinha razão. Sei que a formatura terminaria tarde mas ainda assim não posso perder de ver ela se formar, eu havia tido um pequeno - grande - trabalho pra conseguir as entradas pra cerimônia. Mas não custou mais que um HB20. Me aprovei depressa, com terno preto o cabelo penteado para trás como sempre usei. Me encarei no espelho, me sentia um idiota, meu estômago estava revirando e as mãos suavam frio. Estava nervoso por isso, por a surpreender assim... Medo de como ela reagiria. E certamente estaria com seu namorado, outro problema pra lidar, mas tinha esperanças que quando me visse, correria pros meus braços e esqueceria tudo. Acho que sou um idiota por ser tão otimista.
Isabella narrando.
O discurso foi tão longo quanto imaginei, e fiquei sentada junto da minha turma ouvindo, eu chorei com algumas coisas que foi dita pelo meu professor favorito. Ele quem me chamou para a entrega do diploma e não contive o choro, sendo amparada pelo abraço carinhoso do senhor Charlie.
- Eu sempre quis medicina - comecei, forçando a voz para ela sair contra o microfone - Desde criança esse foi meu sonho... Tinha desejo por ajudar, por salvar vidas. Mas eu dei início no curso na pior fase da minha vida, então, ironicamente, foi a medicina que salvou a minha vida. Me devolveu a esperança, a vontade de viver... Numa época em que eu perdi o meu chão, o meu ar e o meu mundo - respirei fundo, controlando a lágrima e olhando para o imenso lustre ali pendurado, uma mão eu segurava o diploma e a outra levei no cabelo - Foi o amor a medicina que me salvou, e pretendo passar esse amor e cuidado para todos os meus pacientes.
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Quase Um Pecado - CONCLUÍDA
RomansaA paixão não escolhe por etnia ou religião, cor ou sexualidade, quando ela vem, em grande peso, ela sempre vence as barreiras criadas pelo ser humano através dos anos.