Capítulo 23: Protetora das estrelas.

691 149 119
                                    

Fui jogada na sala do trono, praticamente aos pés da rainha, sentada no mesmo, com um vestido creme como nuvens de ceda e uma coroa enorme e tão brilhante quanto seus olhos de diamante. Não havia nada naquele olhar além de fúria e revolta. Ela me mataria se pudesse, eu tinha certeza.

Scarlett estava perto do trono, mais na lateral da sala, com Colton ao seu lado, parecendo ansioso por fazer qualquer coisa que vá machucá-la o suficiente. Isso me fez apertar as mãos em punho, mesmo quando meus pulsos em carne viva queimaram com o ato. Olhei de novo para a rainha, vendo seus lábios se enrugarem em negação e descrença enquanto ouvia a história que as estrelas que haviam me capturavam contavam.

—Como? —Indagou, quase latindo das palavras. —Como fez isso, bruxa?

Eu não sei. Simplesmente fiz. —Sibilei, ficando de joelhos, tentando me colocar de pé.

—Acha que pode mentir pra mim tão descaradamente? —Ela ficou de pé e em um segundo estava na minha frente, agarrando meu queixo com força e me fazendo encara-lá. —Foi por isso que veio aqui, não é? Era um plano de você e da sua espécie nojenta desde o início. Entrar aqui e roubar a nossa magia! A magia das estrelas! Ela pertence a nós e não a vocês!

—Ela me pertence agora também, pelo visto. —Falei, dando de ombros, observando o quanto aquelas palavras a deixaram fervendo de ódio.

Como fez isso? —Exclamou, fincando as unhas no meu queixo a ponto de doer. Agarrei os braços dela para afastá-la. Mas fui puxada para trás pelos guardas na mesma hora, caindo de costas no chão duro. —Onde está aquele peregrino?

—Ele fugiu, vossa majestade. —Uma das estrelas murmurou, engolindo em seco. —Fomos atrás dele, mas ele ainda sim conseguiu chegar à ponte e atravessar.

Não consegui não me encolher de alívio e sorrir ao ouvir aquilo. Saber que Alec estava livre daquele reino fazia tudo isso valer a pena. E mesmo que ele não tivesse conseguido, ainda tentaria ajudá-lo de alguma forma. Ainda mais agora que posso controlar a magia das estrelas tanto quanto elas.

—Ele a ajudou nisso, não foi? Me diga como fez isso?! Me diga agora como roubou nossa magia!? —A rainha veio pra cima de mim, mas eu me arrastei para longe, com o coração martelando no peito e aquela magia recém descoberta zunindo nos meus ossos, ansiosa para sair. Mas eu não fazia ideia do que fazer com ela. Não fazia ideia de como havia usado ela na floresta.

—Eu não entrei aqui para roubar a sua magia! Eu sabia sobre o seu reino e as estrelas, mas nunca pensei que entraria aqui de alguma forma! —Fiquei de pé, cansada de ouvir as acusações dela. —Eu fui jogada aqui. Toda a história que eu contei era verdade. Mas eu pensei que esse reino era bom. Que as estrelas eram boas e gentis. Mas vocês aprisionaram um ser por séculos e o obrigaram a usar aqueles braceletes como forma de tortura! —Exclamei, olhando pra rainha com toda aquela raiva que se acumulou em mim nas horas que se passaram. —Eu não queria quebrar suas regras. Mas eu jamais poderia ir embora e deixar meus amigos aqui assim. Vivendo essa vida horrível que você os obrigou a passar. Scarlett vive sozinha e triste naquela casa. Alec além de viver a beira daquele pântano terrível, não podia sequer usar a própria magia. Me admira que você não tenha lhe tirado as asas também. É bem a sua cara como rainha que presa pelo bem de todos.

—Cuidado com o tom de voz! —A magia brilhou nas mãos dela, como se ela estivesse prestes a lançar contra mim. —Eu ainda sou a rainha destas terras e você está no meu reino!

—Isso não muda o quão horrível você é por dentro. —Afirmei, sem deixar de abrir um sorriso. Um sorriso que eu sabia que deixaria Katie muito orgulhosa se pudesse me ver naquele momento. Um sorriso que faria Harry ter certeza de quem ele escolheu para ser sua esposa e rainha. —Não sei como fiz aquilo e como sinto sua magia. Mas eu a tenho de alguma forma e ela me pertence agora!

—Ah, que lindo. —Ela soltou uma risada, levando a mão a barriga quando se curvou um pouco para trás ao rir. —Quer mesmo falar sobre amizade? Quer mesmo falar sobre justiça e o que é bom ou ruim? —Olhei pra ela, sem deixar aquela fúria dentro de mim se apagar. Não podia e não iria abaixar a cabeça pra ela. —Você chegou aqui, desesperada para voltar para o seu príncipe encantado naquele reino de humanos medíocres. Você queria tanto saber quem foi a pessoa que desejou que você fosse tirada de lá. Mas você sequer se questionou quem foi a estrela que realizou esse desejo.

O sorriso dela aumentou quando eu hesitei, engolindo um nó que se formou na minha garganta. Não consegui nem mesmo piscar quando ela se inclinou para perto de mim.

—Eu sou a rainha. Eu sei de todos os pedidos que são feitos e realizados pelas estrelas. Mas não posso ver quem desejou eles, além da própria estrela que o realizou. —Ela passou a língua sobre os lábios, antes de apontar para Scarlett. —Por que não pergunta a sua grande amiga quem foi a pessoa que desejou que a senhorita viesse pra cá? Pergunte a ela, srta. Wood.

Me virei, sentindo meu coração parar de bater quando olhei para Scarlett e vi as lágrimas que borravam sua pele negra. E a culpa estava presente naqueles olhos, além da dor. Culpa e tristeza.

—Você me trouxe pra cá? —Falei, quase sem voz, sentindo meus próprios olhos se encherem de lágrimas e algo frio e afiado perfurar meu coração.

—Sophia...

—Foi ou não foi você? —Questionei, observando ela fechar os olhos e as lágrimas escorrerem pelo seu rosto.

—Ela desejou que você desaparecesse. Ela desejou que você fosse pra um lugar onde não poderia voltar. —Ela abriu os olhos e me encarou, e eu pude jurar que vi seu coração se partindo. —Ela não especificou onde, então eu a trouxe pra cá, porque... porque eu estava sozinha e queria uma amiga. Ela desejou que você sumisse e eu desejei uma amiga.

—Que amizade linda! —A rainha exclamou, com uma risada de puro nojo e reprovação.

—Eu lamento. Eu lamento muito. —Scarlett deu um passo na minha direção e eu um para trás, fazendo-a arregalar os olhos e chorar mais ainda. —Sophia, me perdoe. Por favor, me perdoe. Eu não te contei porque sabia que você me odiaria. Eu sabia que iria perder a única amiga que tive a sorte de conseguir. Por favor... por favor me perdoe. Eu não queria machucá-la. Sophia...

—Chega! —A rainha olhou pra ela. —Já chega com esse choro desgarrado. Você, Scarlett, é uma vergonha para as estrelas! Uma vergonha!
Além de ter trazido ela pra cá, ainda ia ajudá-la a fugir junto com aquele...

—Não fale assim com ela! —Dei um passo na direção da rainha, vendo as estrelas prontas para pularem em cima de mim caso eu fizesse algo contra ela. —Por que você não contou desde o início que foi ela? Você fingiu que não sabia.

—Eu estava tentando proteger minha espécie. —Ela balançou a cabeça negativamente. —Mas percebi que Scarlett já se perdeu o suficiente e não a mais nada para se salvar nela.

—Eu não queria...

—Eu não me importo! —A rainha se virou pra ela, os olhos de diamantes parecendo brasas prontas pra incendiar. —Você conhece as regras, nossas leis e tradições. Você quebrou todas elas, mesmo quando lhe demos várias e várias chances. Mas agora já chega.

—Vossa majestade... —Scarlett tentou de novo, mas a rainha ergueu a mão e a parou.

—Eu testei você, removendo a sua magia e a impossibilitando de os ajudar. Mas você o fez mesmo assim. Não vou mais fechar os olhos para os seus erros, Scarlett. Nunca mais. —A magia brilhou nas mãos da rainha. Feixes de luz, como línguas de fogo, mas completamente brancas e brilhantes. —Eu, rainha Sybilla de Estela, protetora das estrelas, removo de você toda sua magia e seus dons, assim como suas asas, e a proíbo de pisar em Estela e realizar qualquer desejo.

A magia explicou, brilhante como as estrelas que pintam o céu a noite, fazendo o sala do trono ficar carregada daquela magia que agora estava nos meus ossos e sangue. Mas ela sumiu com a mesma velocidade que surgiu. E quanto olhei na direção de Scarlett, ela havia sumido.



Continua...

O Reino das Estrelas / Vol. 2Onde histórias criam vida. Descubra agora