Capítulo 54: Você não deveria ter voltado.

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Katie

Apertei a ponta da pena contra o papel, vendo o desenho do vestido se formar ali aos poucos, a medida que as ideias iam se passando na minha cabeça. As vezes eu sentia falta do meu trabalho em Londres, desenhando roupas e escolhendo tecidos. Mas também sabia que minha vida nunca mais seria a mesma se eu voltasse pra lá. Não havia motivos pra voltar pra lá.

Andrei entrou no quarto, esbarrando na mesinha ao lado da porta. Seus olhos se arregalaram e ele agarrou o vaso de flores antes que ele desabasse e se quebrasse no chão. Soltei uma risada da expressão dele, enquanto ele colocava o vaso de volta no lugar.

—Onde você estava? —Indaguei, voltando minha atenção para o desenho. —Você sumiu ontem a noite e hoje praticamente o dia todo.

—Ah... —Ele passou a mão pelos cabelos, soltando uma risadinha que me fez erguer uma das sobrancelhas. —Não queria atrapalhar você e o seu irmão, então preferi deixá-los jantar sozinhos. E hoje, eu... hm, estava dando uma volta.

—Dando uma volta? —Repeti, dando uma boa olhada nas roupas meio amarrotadas dele e nos cabelos em várias posições diferentes, como se ele tivesse passado por um vendaval. —Essa volta tem nome e sobrenome?

—Claro que não. —Ele riu, se escorando naquela mesinha, que fez menção de tombar de novo, o que o fez se assustar. —Eu não conheço nada daqui. Estava mesmo dando uma volta. Sabe que eu vim só pro casamento e depois fui pro seu reino. Não tive tempo de conhecer nada daqui.

—E quem levou você pra conhecer o reino? —Indaguei, mordendo o lábio quando Andrei soltou uma respiração pesada e revirou os olhos.

—Tudo bem, eu estava com um guarda. —Revelou, como se contasse um segredo, checando se a porta estava bem fechada.

—Um guarda? —Exclamei, um pouco surpresa. Sabia que ele provavelmente estava com alguém, mas não estava esperando que fosse um guarda. Eles normalmente não falavam, a não ser que fossem chamados, e estavam sempre sérios.

—É, um guarda. —Andrei deu de ombros. —Eu já havia visto dele no dia do casamento. Ele me ajudou a encontrar meu quarto quando eu me perdi, depois de toda confusão com o sumiço da Sophia. Aí ontem a noite eu o encontrei de novo e como ele já havia me ajudado uma vez, pedi pra ele me ajudar a chegar a biblioteca.

—E? —Gesticulei com a mão para ele prosseguir.

—Você sabe, rolou umas trocas de olhares e a gente se beijou. —Andrei veio até a cama e se sentou perto de mim. —Então hoje a gente se encontrou na biblioteca de novo.

—A rainha ia adorar saber disso. —Falei, fazendo Andrei soltar uma risada.

—Você já conversou com James? —Eu o olhei sem entender. —Sobre Noah e seus sentimentos por ele.

—Não tem nada pra conversar. —Sibilei, bufando quando Andrei soltou uma risada. —Noah não está aqui.

—Mas ele vai voltar. —Andrei ficou de pé, deixando um beijo na minha bochecha. —Vou dizer ao James que você quer falar com ele, tudo bem? —Ele esperou pela minha confirmação, e eu acabei assentindo sem pensar direito. —Você nunca foi covarde, Katie. Tenho certeza que não é agora que vai ser.

Ele tinha razão. Ele e Sophia tinham razão. Sobre eu, sobre Noah e sobre meus sentimentos. E eu estava tão cansada de fingir que não estava acontecendo nada, quando na verdade estava.

[...]

Arrumei meus desenhos sobre a penteadeira. Falaria com Joseph no dia seguinte para poder tirá-los do papel. Estava esperando James aparecer, enquanto pensava no que falar pra ele. Sabia que minha maior hesitação vinha por parte da minha família, apesar de não precisar. Tinha certeza que eles iriam me apoiar, independente das minhas escolhas.

—Você desenha muito bem. —Levei um susto, me virando e encontrando uma mulher parada no meio do quarto, me observando com um sorriso curto. —Gosto do estilo dos seus vestidos, apesar de que se fosse pra mim, eu farias algumas pequenas mudanças.

—Quem é você? —Indaguei, olhando na direção da porta que permanecia fechada. Eu não a vi entrar ali. Teria visto se ela tivesse passado pela porta.

—Ah, eu sou muitas coisas. —Ela riu, caminhando até a poltrona no canto do quarto, com o vestido dourado farfalhando no chão quando se sentou lá. A pele negra parecendo muito viva sobre a luz das estrelas e da lua que entrava pela varanda aberta, assim como os cabelos loiros demais. —Sou a mão por trás da sua ida para a dimensão do sol. Sou a mão por trás da má fama das bruxas. Aquela que viajou até aqui para encantar uma certa princesinha e fazê-la armar para que uma certa bruxa fosse assassinada. —Ela estalou a língua, soltando uma risada amarga, enquanto meu corpo estava imóvel, congelado ao ouvir aquilo. —Uma emprestável, que não conseguiu fazer absolutamente nada do que eu pedi, além de ficar esperneando como uma criança birrenta porque um príncipe idiota não a queria.

—Você é a...

—Sybilla de Estela, a rainha das estrelas. —Ela estalou os dedos, fazendo uma coroa surgir no topo dos seus cabelos claros. —Sabe, você não deveria ter voltado. Sua vida naquela cidade barulhenta e esquisita era boa o suficiente. Você era feliz. Deveria ter permanecido lá.

—Por quê? —Indaguei, sem saber ao certo o que estava perguntando, enquanto meu sangue parecia ferver. —Por que me tirou da minha família? Por que fez tudo parecer que era culpa das bruxas?

—São tantos porquês! —Ela bufou, balançando a cabeça negativamente. —A vida tende a ser um pouco tediosa quando você precisa ficar observando a vida dos outros e realizando desejos idiotas e sem sentido, sabia?

—E por isso você resolveu acabar com a minha vida? —Exclamei, sem conseguir acreditar no que estava ouvindo.

—Não, eu tive meus motivos pra fazer o que fiz. Bruxas são seres podres que estavam sujando a magia pura das estrelas. —Ela se colocou de pé, apontando na minha direção. —Você era um meio para um fim. Seu sumiço fez as bruxas seres odiadas. Fez com que elas fossem excluídas e inferiorizaras. Não foi exatamente como eu planejava, porque aquele seu irmãozinho jurava que a culpa era de Del Mar. Mas eu ainda consegui o que queria. —Ela riu, enquanto minha cabeça girava com aquele tanto de informações. —Até que eles resolveram ir atrás de você e a encontraram. Até que aquele príncipe idiota resolver se apaixonar por uma bruxa.

—Você é louca. —James entrou no quarto, empurrando a porta com tanta força que ela bateu contra a parede. —Você é completamente louca. Não merece essa coroa que está sobre a sua cabeça. Não merece o poder que tem.

—Ah, não seja tão sentimental. Não foi nada com vocês. Sempre foi as bruxas. —Ela deu de ombros, enquanto James se aproximava até ficar na minha frente, segurando minha mão. —Eu pretendia pegar aquela outra princesinha rebelde, mas como sempre ninguém consegue fazer o serviço direito e eu precisei vir até aqui pessoalmente. Mas agora eu vou ter que levar você de novo. —Ela apontou pra mim e depois sorriu pra James. —E você também.



Continua...

O Reino das Estrelas / Vol. 2Onde histórias criam vida. Descubra agora