Capítulo 23

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De volta à cidade, eu fui pra casa descansar e organizar as ideias. Eu estava cansado, sensibilizado, sem saco pra discussões. Richard não precisava saber que Jonathan tinha dormido ao meu lado, e que no friozinho da madrugada ele tinha colado em mim. E ele não precisava saber que eu iria acompanhar as reações de Jonathan nos próximos dias.

Jonathan tinha outros amigos, embora menos íntimos, e o pai dele era presente, apesar de silencioso. Ainda assim, eu ligava para ele e acompanhava sua evolução. Eu já estava quase convencido que estava tudo bem quando eu soube que ele tinha tirado atestado médico de uma semana e não estava indo ao hospital.

Ao invés de ligar e ouvi-lo mentir para mim, eu fiz pipoca doce, coloquei numa tigela grande e fui até onde ele morava. Era por volta das sete da noite de sábado. Chamei no interfone e ele me atendeu muito agitado.

— Dan! Que bom que... você veio. Eu queria mesmo falar com você.

— Ótimo! Então abre.

— Por que você veio? Eu não quero te atrapalhar com seu namorado.

— O que está havendo?

— Não sei, eu... Eu marquei de sair com uma pessoa, mas não consigo achar a chave do carro. Eu... tô um pouco nervoso.

— Abre e a gente conversa.

Ele abriu.

Entrei e o apartamento dele estava uma bagunça. Tinha cheiro de bebida, garrafas espalhadas e o quarto, parecia que tinha passado um furacão lá. Mas ele estava arrumado pra sair. Me atendeu sem graça, pálido e com os olhos vermelhos.

— Oi, Dan...

— Costumam vir duas chaves com o carro, Jonathan. É só você pegar a reserva.

— Acho que você não entendeu, Dan. Eu não perdi o caralho da chave. Eu 'tava bêbado e um "duende" veio aqui e carregou ela. As duas.

O abracei por um tempo sem dizer nada.

— Tá nervoso?

— Não é nervoso. Eu tô... puto! Tanta gente me ligando. Como eu vou falar que não posso sair porque tô sem a porra da chave do meu carro?

— Você tá bonito com essa roupa. Mas tira, pra não sujar. Veste uma roupa velha. Tá com fome?

— Não.

— Eu ia ver um filme em casa. Fiz pipoca e trouxe pra gente. Tem Netflix, não tem?

— Você sempre fofo e sensato, né, Obedran?

— E você sempre na beira do precipício. Seu pai levou as chaves do carro pra você não se matar com ele, não foi?

— Deve ter sido por isso. Eu fico até com vergonha de ser quase da sua idade e ficar de castigo como uma criança.

— E o processo com as coisas da sua mãe?

— Tudo normal. Ela não deixou nenhum documento dando nada pra ninguém, então eu sou o único herdeiro. O inferno são aquelas tias todas que moram lá dizendo que meu pai matou ela. Dan, ela fez isso sozinha!

— Sim, e isso está te afetando. — Apontei a tigela enorme que eu tinha posto sobre o balcão. — A pipoca tá aqui. Escolhe alguma coisa pra gente assistir.

— Eu queria sair. Esse lugar... — Ele saiu juntando copos e roupas espalhadas. — Tem duas semanas que eu não faço nada. Por que a gente não vai num barzinho?

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