20° Baile

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O que estávamos fazendo?

Eu ainda não sabia a resposta! E, nessa última semana, mal tinha pensado nela. Possivelmente, ainda estivesse naquela bolha e, talvez, essa bolha já tivesse virado uma redoma que acompanhou Dante e eu por todo casarão e não se dissipou nem no escritório.

Os beijos enlouquecedores só não tinham ido mais longe por conta que, quando eu percebia que tinha esquecido totalmente o porquê de estar ali, eu recuava. E ao recuar invés dele se irritar, ele simplesmente me puxava mais junto dele e assim ficávamos. Eu poderia não ter ultrapassado aquela exata linha do sexo, mas lá no fundo eu sabia que cultivar momentos de conversar banais e de silêncio tranquilo, podiam ser bem mais perigosos do que ultrapassá-la. Principalmente por eles me afastarem da realidade solitária que a minha vida verdadeiramente era…

O que você pensa que está fazendo?

Ouço a repreensão lá no fundo da minha cabeça, da voz que me acompanhou por toda a minha infância e grande parte da adolescência. Dona Laura, minha avó, sempre que eu estava no meio de uma bagunça ou prestes a realizá-la, ela vinha autoritária para fazer eu parar.

Só que agora eu não sabia como parar…

Suspirando, puxo os últimos fios do coque sofisticado para frente do rosto, para que parecesse elegante e bonito. Tudo o que eu precisava parecer para aquele baile que começava no andar de baixo.

O vestido negro e longo que se moldava em meu corpo tinha sido uma escolha unânime de Cecília e Glória, que ontem haviam me intimado a acompanhá-las nas últimas compras para aquele baile. Não poderia negar que o estilo ombro a ombro de mangas cumpridas e a fenda na lateral do vestido não tinham ficado arrasadoras.

Era uma bela fachada.

—Apenas uma fachada…

Meu sussurro é inaudível aos meus ouvidos, mas me acompanha como um mantra quando meus saltos estalam de encontro ao chão do corredor do quarto que eu dormia.

Sigo pelo corredor vazio e, antes mesmo de chegar na encruzilhada que havia entre as escadas e os corredores, consigo avistar pelo menos três pessoas em um semicírculo. Quando consigo identificar com exatidão quem são as pessoas me esforço em não transparecer nada, mesmo que um deles fosse Horácio. Estava sendo boa naquilo, já que tinha o visto mais do que minha sanidade gostaria. O carrasco tinha voltado com Dário há três dias e, aparentemente, não podia ficar muito tempo sem falar com o mesmo; o que fez ser comum o ver nos últimos dias.

Ainda desconfiava que ele sabia algo sobre  mim toda vez que me olhava diretamente, mas como ainda mantinha minha cabeça, talvez fosse apenas o meu instinto cauteloso.

É o que tento me convencer quando me aproximo do trio que agora se interrompe em suas palavras por me avistarem. Mesmo tendo dois pares há mais em mim, meus olhos ficam apenas em Dante. Em sua postura altiva vestida com terno escuro sob medida com o toque de uma gravata dourada para destacar uma das riquezas da família: o ouro.

—Está deslumbrante, Lissa. —ouço o elogio da última pessoa que eu esperava: Dário.

Olho para ele que, como Dante, veste um terno escuro com uma gravata dourada forte, sem saber o que tirar daquele elogio. Meus olhos relançam Horácio rapidamente e um temor de que ele tenha contado suas possíveis suspeitas para Dário me fazem agradecer de um jeito hesitante. No entanto, olhando para a versão mais velha de Dante, apenas diferenciado pelos cabelos mais ralos e a magreza mais acentuada, nada parecia transparecer de sua expressão neutra.

Não tenho tempo de discutir internamente sobre isso quando as duas restantes da família vem em uníssono do corredor contrário ao qual eu vim. Ambas com vestidos dourados, que remetiam a ouro derretido, se aproximam com tamanha elegância que apenas as observo. Glória com um vestido longo e Cecília com um mais curto. Lindas, como aquele baile pedia…

Além da VingançaOnde histórias criam vida. Descubra agora