O sol ir se pondo no horizonte sem fim estava deixando o céu em um tom belíssimo de laranja e rosa. Aquela beleza única eu já observava há algum tempo com um delicioso copo de café em minhas mãos.
Aqueles eram os meus minutos de paz…
E eu estava me deleitando deles ao máximo!
Principalmente depois das últimas 60 horas que tinham se mostrado exaustivamente longas e com decisões que, até aquele momento, eu ainda tentava me convencer de que foram as mais assertivas…
A primeira tinha se baseado nas palavras de Horácio. Eu não sabia se ele mentia ou não sobre encontrarmos uma surpresa se fôssemos a algum hospital. Então fiz a coisa que julguei ser a menos arriscada.
Uma que envolveu a cobrança de um favor de um ex-namorado que há muito tempo eu não via. Anos atrás tinha o ajudado, por estar tão encantada por ele, a se livrar de agiotas que ele tinha se envolvido ( não poderia negar que Valentim tinha cuidado deles). Aquilo impulsionou ele a ser o enfermeiro que foi obrigado a me ajudar quando apareci com um Dante baleado no seu caminho.
Talvez eu tenha chantageado um pouco ele, que cedeu e fez o trabalho de tirar a bala e limpar a ferida. O trabalho tinha sido feito atrás do hospital público em que ele trabalhava. E, por mais que ele tivesse pedido que eu entrasse lá, neguei prontamente. A última coisa que eu queria era alguém falando para a polícia que tinha uma pessoa baleada no hospital. Chamar atenção era a última coisa que eu queria naquele momento.
Por isso, eu tinha pedido às escondidas para ele aplicar um sedativo em Dante. O homem, mesmo abatido pelo sangue que tinha perdido, queria bater de frente com seja lá o que estava acontecendo dentro de sua família.
Após sedado cogitei o deixar no hospital onde sua família estava, mas tive receio de que antes que alguém chegasse até ele, outros o pegassem e me pagassem. Com isso, fiz a única coisa que julguei ser a mais segura. A coisa que me salvaria e que o salvaria para lutar um outro dia.
—Onde estamos?
A pergunta que ouço não me faz virar, mas me para a centímetros de levar o copo à boca. Continuo com os olhos na janela aberta da cozinha, que ainda mostrava a beleza singular do céu, para poder enfrentar as perguntas que Dante definitivamente tinha.
Estávamos na casa em que minha mãe havia crescido. A casa que eu tinha vivido até meus 6 anos quando meu avô ainda era vivo. Depois que ele faleceu minha avó havia aceitado a casa na cidade que Vladimir tinha providenciado para minha mãe morar, se ela não tivesse morrido. Mal lembrava dessa casa, mas minha avó não tinha aberto mão dela e nem eu. No entanto, não é isso que respondo ao voltar levar o copo à boca.
—Em um lugar longe da cidade.
—Quem é você? De verdade…
—Você quer beber alguma coisa? —retorqui ainda de costas. —Não tenho nada mais forte do que café para essa conversa.
Me movimento pela cozinha média, mesmo que ele não me responda, à procura de um copo. Mesmo que eu sinta seus olhos presos em cada movimento, tomo meu tempo em despejar o café nele. Assim que esse tempo termina, o coloco em cima da mesa redonda que havia no meio da cozinha antes de levantar os olhos para ele.
Parado na entrada da cozinha ele mantém a postura impassível. A recuperação total do sedativo está na atenção que ele me dá agora. Ele até poderia estar 100% livre do sedativo, mas não do machucado do tiro que tinha levado. Vejo o curativo pela camisa de flanela aberta, que um dia tinha sido do meu rechonchudo avô, estar manchado com sangue… Mesmo com aquilo ele se mexe para longe da entrada até pegar o copo e se encostar na bancada parecendo pronto para ter aquela conversa, tanto que volta repetir:
—Quem realmente é você?
—No momento eu sou a mulher que desistiu de uma vingança há muito tempo planejada.
—Não sei se devo agradecer por isso…
—Não espero um agradecimento. —nego sinceramente. —Eu fiz uma escolha.
—Posso saber o nome da pessoa que eu matei?
—Você não o matou, você mandou o matar. Possivelmente tenha sido Horácio que puxou o gatilho há um ano. E, o mais engraçado, por algo que ele não fez e nem teve nada a ver…
—Espera… — ele até dá um passo para frente depositando o café atrás de si e eu até vislumbro o reconhecimento da história que eu contava em sua expressão, mas continuo disposta a deixar tudo às claras.
—Você tirou o meu irmão de mim. A minha única família. Para você ele era Valentim Vasconcellos, mas para mim ele era apenas Valentim. O meu meio-irmão por parte de pai…
—Não… —ele balança ainda desacreditado, mesmo que as cartas estivessem todas na mesa. —Vladimir teve apenas um filho….
— E uma filha fora do casamento.
—Como é que eu nunca ouvi falar de você?
—Ele fez questão de me esconder de todos. Convenhamos que ter uma filha fora do casamento não cai muito bem para a linha de negócios de vocês. Traição, independente da forma, ainda é visto como traição…
Deixo as palavras morrerem na minha boca quando vejo ele parecer não focar em nada enquanto a verdade se assenta em sua cabeça.
—Agora tudo faz sentido —ele solta quando parece chegar a uma conclusão. Conclusão essa que quando ele levanta os olhos para mim vejo ser a pior possível para o meu lado. Tanto que não me espanto com as suas seguintes acusações. —É por isso que fez todo esse jogo, porque Vladimir mandou você! Você é a porra de um deles…!
Mesmo não me espantando, não fico calada por muito tempo e me ponho a rebater as suas acusações raivosas no mesmo nível.
—Eu não sou e, nunca fui, uma deles para começo de conversa! E segundo, Vladimir não mandou eu fazer nada! Eu escolhi fazer! Eu…
—Você iria me matar, Valquíria? E depois, o quê? Ele mandou você matar Cecília também… —ele interrompe por cima sem se importar com as minhas palavras.
—Eu nunca encostaria um dedo em Cecília! —exclamo consternada a sua acusação.
—Não minta! Você estava com aquele verme, não é? Claro que estava! Tudo aquilo era um teatro, Valquíria?! Uma brincadeirinha sádica para você?! Queria machucar Cecília para mostrar para o seu pai como é fácil nos atingir…
—É claro que não! —rebato ainda mais alto parando tão perto da mesa quanto ele tinha parado. Era bom naquele momento que ela nos separava, porque a vontade de ambos parecia ser de pular literalmente na garganta um do outro! —Eu me importo com ela!
—Não ouse falar que se importa com ela! Não depois…
—É claro que eu me importo com ela! —rebato e, antes que ele possa dizer mais uma de suas acusações, me imponho. —Quer saber, eu não me importo se você acredita em mim ou não! Apenas saiba que meu nome é realmente Lissa Campos e não Valquíria! E não, eu não fiz isso porque Vladimir mandou! Eu escolhi me vingar da morte da única pessoa que me amou incondicionalmente. Eu decidi ir contra até mesmo o que Vladimir queria, por que quer saber, ele não faria nada por hora! Mas eu não! Eu não poderia voltar a minha vida normal! Não depois de ouvir assassinarem meu irmão pela porra de um celular…
Nesse momento minha mente espelha por um instante a lembrança daquele exato segundo em que ouvi o tiro que ceifou a vida do meu irmão e minha voz falha. Meus olhos se enchem de lágrimas e olho para cima por um momento para evitar que caiam. No entanto, não me importo se ele tinha mais acusações, apenas continuo falando:
—O engraçado é que mesmo assim, no final das contas, eu não ia fazer o que eu roguei aos quatro ventos. Eu realmente iria pegar a droga daquele celular e ir embora. Eu realmente iria, mas olha só como o destino tem um péssimo senso de humor…
Não olho para ele quando deixo as últimas palavras saírem da minha boca. Por isso, não vejo sua expressão com o meu pequeno discurso, apenas tomo respirações para tentar me estabilizar.
—Se tudo o que você diz é verdade, por que não fez antes? Chances não faltaram…
—Talvez, você estivesse certo em dizer que eu não sou uma assassina. —ironizo. —Não fui criada nessa vida e não tenho um sangue tão frio quanto o de vocês…
—Quando exatamente decidiu ir embora?
—Isso importa? —rebato voltando olhar para ele.
—Apenas responda….
—Por que isso importa?
—Você sabe porquê….
Ao ele soltar aquilo as suas palavras de antes me voltam “… porque está apaixonada por mim, como eu também estou por você.”
Até abro a boca para lhe responder, mas um som que logo percebi vir do celular que estava no bolso da calça jeans que eu vestia, me interrompe.
Agradecendo mentalmente pela interrupção apenas pego o celular e o levo até a orelha tendo a chance de escapar dos olhos de lobo de Dante.
—Pensei que não fosse mais atender nenhuma de minhas chamadas!
—Thales… —digo virando de costas para Dante.
—O que aconteceu? Aonde você está? Você está bem?
—Calma, eu tô bem…
—Estão dizendo que um grupo atacou a matriz das empresas Gonzalez…. Você o matou?
—E-eu…
—Você não conseguiu, não foi? —ele presume quando não completo e, se eu esperava julgamento em seu tom, não ouço. Por isso, admito com a voz miúda:
—Não, eu não consegui…
Ao aquilo sair da minha boca ouço o ressoar de um suspiro, que aos meus ouvidos pareceu aliviado. No entanto, me preparo para ouvir algum tipo de acusação por não fazer aquilo ou um pedido de explicação. Que não vem, apenas palavras que eu não sabia que precisava ouvir até Thales as dizer:
—Essa foi uma boa decisão, Valquíria. Tenho certeza que Valentim iria querer assim…
—Obrigada. —solto o agradecimento junto com o ar preso, que sai levando consigo o aperto que eu até então vinha segurando desde que tomei aquela decisão. Saber que alguém que conhecia tão bem Valentim me apoiava, era o que eu realmente precisava ouvir…
—Eu queria estar aí, mas ainda estou preso em algumas coisas aqui. Mas o que aconteceu então? Estão dizendo que foi ateado fogo no estacionamento e que Dante está morto.
—Ele não está…
—Não me diga que você está com ele?!
—Se eu disser que sim…
—Porra! Eu ainda estou preso e não consigo te ajudar muito daqui! Mas sei que Vladimir está te procurando por causa do que estão dizendo! Onde você está? Não me diga que é na antiga casa da sua avó, porque se for a uma grande possibilidade de Vladimir….
—Você acha que Vladimir está vindo para cá?!
Minha pergunta estupefata é dita mais alta e eu viro para Dante no processo. Mas antes que qualquer um pudesse dizer qualquer coisa, como se fosse uma deixa, ouvimos em uníssono um barulho parecendo vir da frente da casa.
Passo correndo por Dante indo imediatamente até a janela da sala. Ao puxar um pouco da cortina branca para espiar o que se passava para além do portão, logo consigo identificar o que me faz engolir em seco.
Vladimir não estava vindo para cá.
Ele já estava aqui!🖤✨🖤✨🖤✨🖤✨🖤✨
😱
Muitos beijos!!!
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Além da Vingança
Romance"Em um jogo de matar ou morrer pode o amor sobreviver...?" Vingança. Para muitos, um prato que se come frio. Para tantos outros, algo que não vale a pena investir. Para Lissa, que perdeu a pessoa mais importante da sua vida pela cobrança de ou...