Eu já tinha tentado salvar Michael de muitas formas... já tinha tentado entrar na vida dele sendo contratada para atuar em um dos vídeos, como funcionária de sua casa, e mais como um monte de outros "papéis" de inúmeros sonhos que eu já não podia listar, como realidades alternativas que aconteciam quando eu dormia... não me admirava que não havia tratamento que desse conta das minhas olheiras e nem fim de semana ou feriado que amenizasse meu cansaço: eu passava noite após noite vivendo uma outra vida, num outro tempo, num outro lugar. Nos meus sonhos, as barreiras de tempo e espaço não existiam e eu podia acessar Michael.
Mas eu nunca chegava ao final da história.
Ainda que durante o dia eu idealizasse o que iria fazer, com quem iria falar, quais caminhos iria tomar para impedir que uma coisa ou outra acontecesse - sim, havia este nível de refinamento - impedimentos apareciam, imprevistos... o sonho se esvaía, a noite acabava e na noite seguinte tudo parecia embaçado, confuso, desconexo, como se eu realmente "perdesse a conexão".
E no dia seguinte já vinha uma outra história, uma nova possibilidade.
Esse era o carrossel que eu vivia e do qual não estava conseguindo pular.
Mas naquela noite... minha história seguia um rumo tão diferente. Dois gatilhos foram suficientes para uma história inteira se formar em minha mente: o primeiro foi uma foto enviada por uma colega com a mensagem "nossa, ele era bonito nessa época",e que mostrava Michael na Bad Tour em um ângulo visto como quem o olha da primeira fila, ali, de quem está grudado na grade. Eu nem respondi a mensagem...O segundo, foi o vídeo de She's out of my life cantado na Bad tour - porque depois de ver a foto, também já tinha jogado para o alto a abstinência de consumir Michael naquele dia - e ver o modo como ele abraçava a fã sortuda escolhida a subir ao palco.
"O que você diria para ele, se pudesse subir? Se tivesse só aqueles segundos?", foi o pensamento que me veio.
_ O que eu diria? - me perguntei, sozinha em meu quarto, respondendo a pergunta feita pela minha cabeça defeituosa.
"Eu te amo"?
Não! Definitivamente não. Todo mundo dizia isso e eu tenho certeza que, no fundo, ele devia entender como um amor de fã, mas não acreditar num amor real. Não se ama profundamente alguém que você não conhece, não sabe os defeitos, as chatisses... e ele era humano! Certamente tinha suas questões. Dizem que ele era extremamente perfeccionista. Devia ser detalhista pra caramba!
"Cuidado! Fique atento em quem você confia"?
Lógico que não! No mínimo ele ia mandar o segurança me tirar do palco mais rápido e ainda ficar de olho pra ver se eu não estava armada ou algo assim... ia me achar uma psicopata.
_ Acho que eu oraria por ele... algo assim... diria "Deus te abençoe..."- pensei, e em seguida fechei meus olhos.
E entrei no meu universo paralelo, onde mais uma história seria iniciada..._ Hey! Moça! Moça! Acorda! Acho que vão abrir!
Acordei, com uma voz desconhecida e um leve cutucão no ombro. Eu tinha o corpo dolorido e desconfortável... eu estava sentada...
Numa calçada?
Me levantei devagar. Era uma avenida larga. Um lugar bonito. Era de dia, mas não sei... quase a tarde. Era uma fila. Eu era a primeira.
_ Passaram aqui e disseram que já vão abrir o portão. Como você está sozinha, achei melhor te avisar. O moço trouxe você meio dormindo e pediu para te acordar. Era seu pai? - perguntou-me uma garota com um cabelo num estilo punk e grandes brincos de argolas. Ela falava de um jeito engraçado...
Eu tinha a sensação que aquilo não era de verdade... eu não sabia de fato se era real ou não... mas quando estava neste universo, eu não questionava. Tudo me levava a embarcar na história. As coisas meio que se encaixavam sozinhas.
_ Sim. Era. Obrigada. - respondi, tentando não estabelecer conexões.
Bati a mão nos bolsos. Eu estava com uma calça jeans, um allstar, e uma camiseta em que se lia "Bad Tour".
"Ah... que legal. Queria mesmo uma dessa", pensei, sem empolgação, até que bati a mão no bolso direito e retirei um papel. Além da minha identidade, eu tinha um ingresso._ Moça, que dia é hoje? - perguntei para a garota punk atrás de mim que me olhou como se eu fosse maluca.
Eu era maluca. Ela não sabia.
_ 23 de julho. - disse ela, se afastando um pouco.
Eu não quis perguntar o ano. Não podia fazer isso. Tinha que ser 1988.
Também não perguntei onde eu estava: quando olhei para frente com atenção o enorme portão do estádio de Wembley olhava para mim.
Era isso?
Eu tinha o ingresso da Bad tour e era a primeira da fila?
Eu nem tive tempo de absorver aquilo... eu não tinha bolsa, não tinha casaco, dinheiro, nada.
Só o ingresso e minha identidade nos bolsos.
_ Atenção pessoal! Entrem com cuidado! Sem tumulto! Respeitem a ordem de chegada! - disse um homem, tentando organizar a entrada.
"Meu Deus... eu não devo ter 38 anos aqui, eu acho...", pensei eu, sem ter tempo de olhar o RG e torcendo para as minhas pernas responderem tão rápido quanto a velocidade do meu coração.
Assim que a primeira fresta do portão se abriu, eu parti em disparada tão rápido, que só tive tempo de me lembrar vagamente de como era o estádio que eu via nos vídeos.
E eu via muitos os vídeos da Bad Tour, repetidamente.
Logo localizei a torre central que apoiava a iluminação e vi a faixa com o nome do Michael, então o portão em que eu estava era lateral. Isso me ajudou a ser rápida a fazer a curva e achar o palco.
Parece algo bobo, mas quando se está meio desesperado, a gente só quer correr pra frente, e ficar centralizada era importante para a missão.
Sim, era desse modo que eu encarava essas incursões por este outro mundo.Não dá para descrever a alegria da sensação de bater a barriga na grade de proteção.
Chorei... chorei que nem criança, só por ter chegado ali. Eu estava exatamente onde precisava estar: na frente e no meio.
E eu sabia, tinha a certeza que eu subiria no palco naquela noite. Ou melhor, naquele show.
Um show que tinha acontecido há mais de 30 anos, mas que, no meu universo, estava acontecendo agora.
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Michael Jackson - Living the Dream
FanfictionCONCLUÍDO Viver ou sonhar? Manter os pés no chão, na realidade que conhece ou arriscar o que não é palpável, mas pode vir a ser? Lucy não consegue mais manter sua mente na própria vida: seus pensamentos estão presos a uma outra época, numa outra dé...